terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Frestas da solidão

foto de: A&M ART and Photos

Invenção do meu caderno negro
que a noite me pertence
que a noite me habita como uma carcaça de pão
que a noite me grita e me insulta...
como a um aldrabão
invenção
das tristes linhas paralelas que o cansaço vence
um polícia que me multa
e escreve com letra apressada o meu nome
morada
e eu... eu afogando na carcaça a minha fome
a minha mágoa na tua boca em meu divã deitada,

Invenção do meu caderno negro
da palavra
invenção do meu caderno impuro aberto nu com alma macabra
quando do esqueleto da vaidade
acorda uma cidade
um infeliz transeunte com sabor a madrugada
manhã submersa ensanguentada...
invenção
na paixão
misturada nas flores com plumas de mão...
da palavra
a palavra envenenada que o cisne entranha nas frestas da solidão.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 7 de Janeiro de 2014

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Ruas desnorteadas

foto de: A&M ART and Photos

A insignificante maré de desejo que a palavra deixa sobre o corpo envelhecido da morte
a espuma translúcida do abismo camuflado nas noites em delírio
o cigarro mal apagado
caminhando ruas pouco iluminadas
cadentes
velhas...
calçadas permitindo o sexo sobre os fantasmas das cortinas de fogo que saltitam do circo em miniatura
a insignificante maré que eu sinto na minha algibeira
fundeada em Cais do Sodré...
sem eira nem beira...
a terra não prometida
o deserto que te absorve e alimenta
e come em pedaços de açúcar misturados com azedos olhares
as árvores que sombreiam as tuas mãos de pérola emagrecida...
tão triste
e... e tão querida.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 6 de Janeiro de 2014

domingo, 5 de janeiro de 2014

E... Adeus; não voei e caí.

foto de: A&M ART and Photos

Limbos putrefactos onde habitam os esqueletos humanos, do húmus o húmus selvático que um insignificante transeunte transporta, desce a calçada, sobe as escadas do Adeus e depois, depois arrefecem as panquecas e os pastéis de bacalhau, há sempre preguiçosas luzes na calçada do senhor António Eu, há sempre pedras vestidas de sandálias e sandálias travestidas de pedras... rolam, rolam até que a noite cai sobre o alpendre da triste aldeia dos Macacos,
Vestiram-me de Anjo, colocaram-me umas parvas asas em sarja, não voei e quase caí da Mangueira abaixo, acreditando eu voar porque me tinham dito ser um
Anjo?
Sim, sim parvamente... um Anjo com asas e que nunca voou,
Caminhei e palmilhei calçadas, de sandálias parecia um parvalhão com asas enormes sobre os ombros, derreado, cansado... apeteceu-me insultar todos os presentes, chamei-lhes de filhos da mãe e a minha mãe
Triste,
E ouvia os Limbos putrefactos onde habitavam os esqueletos humanos, do húmus o húmus selvático que um insignificante transeunte transporta, desce a calçada, sobe as escadas do Adeus e depois, depois sente, sente sobre os ombros o peso da morte,
Triste, dizia-me ela,
Triste, ela sempre, digo-o eu,
Vagabundo imundo, dizia-me o senhor António Eu, e lá fui voando e tropeçando e caindo e me levantando, hoje olho-me numa fotografia, parvamente com asas, sorria
Pergunto-me, porque sorria este grande parvalhão?
Ora... se não voei, chorei, caí, me levantei, tropecei, cheguei a casa com os pés recheados de bolhas, subi a Mangueira e
Abri literalmente os braços, sentia as asas a prenderem-se aos ramos envelhecidos... e tombei sobre o térreo pavimento, junto a mim, estatelado do outro lado, o meu velho triciclo e o também meu parvalhão boneco de estimação, o
Chapelhudo?
Tardes inteiras a construir vestidos para este amigo e nunca conheci a sua família, e nunca
Quem vos mandou prometer?
Alguém prometeu se outro alguém ficasse curado, eu, o miúdo, fosse vestido de PARVALHÃO, levava asas de sarja e
Quase
Caí sobre o pavimento térreo acreditando que,
V O A V A...
Não voei, fui contrariado, também... quem os mandou prometer que eu ia sem me consultarem?
Não voei, não fiz mais vestidos para o chapelhudo, e quase
Vomitei,
Enjoei a principio quando (vejamos; a principio = no começo, e a princípio = em teoria), portanto está escrito correctamente, minha Adorável Senhora, continuando, enjoei a principio quando encontrei na descida um velho amigo meu, um famoso papagaio em papel, tinha quatro cores e um novelo de cordel, tinha-o roubado às rendas da minha querida mãe, e rendas refiro-me a crochet, não a outro tipo de rendas, que felizmente
Caí sobre o pavimento térreo acreditando que,
E enjoei, e vomitei palavras terminadas em
Alho,
Que confesso detesto, que odeio...
(Enjoei a principio quando (vejamos; a principio = no começo, e a princípio = em teoria), portanto está escrito correctamente, minha Adorável Senhora, continuando, enjoei a principio quando alguém me apelidou de “meu menino” e eu, olhei, eu... vi-o de bengala e não percebi o que ele fazia ali..., e a principio, não, não a “princípio”, a principio ainda acreditei que voava... pois se me tinham confirmado por escrito que eu era um anjo e credenciado para grandes voos...,
Grandes voos..., apenas fiquei-me por estilista do meu amigo Chapelhudo, e hoje, hoje tenho saudades dele e das suas mãos de borracha, e hoje...)
Hoje?
Ai... ai hoje, hoje... “Os Limbos putrefactos onde habitam os esqueletos humanos, do húmus o húmus selvático que um insignificante transeunte transporta, desce a calçada, sobe as escadas do Adeus e depois, depois arrefecem as panquecas e os pastéis de bacalhau”
E... Adeus; não voei e caí.
* E claro que o plural de pastel de bacalhau é pastéis de bacalhau; pastéis de bacalhau.


(não revisto – Ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 5 de Janeiro de 2014

Fotografia sem nome

foto de: A&M ART and Photos

Perspectivo-me sobre a sombra lâmina do teu sorriso de gaivota sem poiso
há uma linha transversal que nos separa e aproxima
como uma fotografia sem nome na mão do louco muro em xisto
desço às fronteiriças margens do desejo
desço até que sou engolido pelo cosseno de trinta e cinco graus dos teus lábios...
desejarás-me ainda depois das equações diferenciais dormirem dentro dos quadriculados cadernos?
Invejo-te a liberdade
e os voos nocturnos quando se esquecem de ti e tu
e eu
suspensos no estendal das sílabas poéticas que o veneno da tua boca alicerçou na tempestade
há em nós uma circunferência de luz com braços de areia
húmidas todas as palavras dos anzóis do medo das sanzalas com vozes de zinco
com olhos de fome...
e chove
chove sobre o teu corpo de nylon onde se abraçam os barcos desvairados quando o vento se entranha no amor e nos transporta para o infinito
e lá ao fundo... a sombra lâmina do teu sorriso de gaivota sem poiso.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 5 de Janeiro de 2014

No meu texto de ontem “Estoy enamorado” alguém me chamou à atenção que literáriamente não leva acento agudo no “á”. Ora literariamente é um advérbio de modo terminado em -mente, derivado do adjectivo literário com acento agudo, e também no caso de advérbios de modo terminados em -mente derivados de adjectivos com acento circunflexo, ambos os casos não levam acento nem agudo, nem circunflexo.
Ex:
Literário – Literariamente;
Só – Somente;
Espontânea – Espontaneamente;


Por alguma razão, no final dos meus textos, está bem explícito (não revisto). A verdade é que o dito comentário apenas existe porque uma dita senhora, com vários perfis falsos no Facebook, resolveu chatear-me, ou melhor, pensa que me chateia... digamos como dizia o outro; para me chatearem precisam de morder-me a.... ela já o fez e não me chateou em nada. Pior do que isso são as pessoas que lhe emprestam o perfil para ela fazer comentários em nome de outros...
FIM

Cigarro invisível

foto de: A&M ART and Photos

Puxo de um cigarro invisível e penso nos teus cabelos húmidos depois das chuvas de Inverno, recordo o lamacento labirinto de saudade que existia nos teus doces dedos envenenados pela paixão do silêncio, habitas como um pássaro no meu pobre e triste covil, habitas também tu, tal como o cigarro invisível, derretido em pedacinhos de cinza que voa sobre os desejos matinais das ardósias sem janelas, puxo e penso no cigarro invisível, estive quase a desejá-lo, estive quase a possui-lo... estive quase dentro dele como ele vive eternamente dentro de mim, inexplicavelmente... não o fumei, inexplicavelmente... não o puxei, manuseei-o na minha mão como uma munição perdida, esquecida... e
Sem nome?
Uma carcaça de fome, puxo, não puxo, invento, adormeço, me sento sobre as dores do andarilho covil da minha infância, viajo, regresso, embarco... sem medo, com medo, sem nome?
E puxo e regressam todas as palavras adormecidas, e puxo e regressam todos os desejos prometidos...
Ausente,
Sente,
E puxo, e puxo até que o dia acorde, até que a noite se deite, durma, finja viver quando a vida não se vive... come-se como rodelas de laranja...
E estonteante me sinto para acreditar em labirintos de prata, e estonteante me sinto... me sinto para sofrer paixões de xisto quando a húmida manhã se entranha no púbis da atmosfera encharcada de dióxido de carbono...
Sente,
O ausente,
E puxo de um cigarro invisível e penso nos teus cabelos húmidos depois das chuvas de Inverno, recordo o lamacento labirinto de saudade..., e não sei, e não sei se a noite é negra, encarnada... ou... ou de cor nada.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 5 de Janeiro de 2014

sábado, 4 de janeiro de 2014

Estoy enamorado

foto de: A&M ART and Photos

“Estoy enamorado” e apelidam-de de pássaro das frias noites de agonia, sinto as ranhuras no gesso que a esperança corrompe as paredes da minha habitação, um fino e velho cubículo, um casebre com quatro janelas de pano, um esqueleto em porcelana com duzentos e seis ossos embainhados nas tormentas dos beijos desperdiçados,
Estoy enamorado,
“Estoy enamorado” sem perceber que a cidade dorme, respira e sonha..., deixei de sonhar quando dei conta das árvores com braços de cinzentos cigarros de enrolar, tive medo que depois de adormecer, nunca, nunca mais acordaria para olhar o mar, dormi, não sonhei... e quando me acordaram, anos depois, voltei a olhar
“Estoy enamorado” pelo mar,
E conheci uma abelha por quem “estoy enamorado”, literáriamente é uma besta, sempre aos gritos, acorda todos os fantasmas da cidade dos peixes, sinto dentro de mim os barcos da desgraça, sinto dentro de ti os edifícios com alicerces de prata e telhados em colmo, a floresta deambula nos teus cabelos, e tu, estúpida abelha, literáriamente pareces uma lareira sempre extinta, apenas daquelas que servem apenas de adorno, um cão saltita de sofá em sofá, e do resto do mobiliário... apenas a escrivaninha com quatro gavetas encerradas a fechaduras de marfim, um velho e rabugento cinzeiro e claro... a porcaria de sempre das mesmas fotografias de sempre, família, fantasmas que hoje apenas o são, habitam dentro do nosso pequeno espaço, não respiram, não saem de casa... mas... também não bebem, dançam umas com as outras, fumas haxixe por prazer e lêem revistas com fotografias de gajos nus, eles e a minha abelha parecem a tromba de um elefante depois da congestão com percebes e algumas quitetas, lembro-me das asas dela, e sinto nojo das palavras que me escrevia, dizendo que
“Estoy enamorada”,
As barbatanas sentiam o cheiro intenso do sossego das conchas vermelhas, a lua em guindastes de orgasmo levanta-se do divã, e
“Estoy enamorada” por ti, por eles, por todos os homens com vestidos de prata, os olhos pintados com rímel e nos lábios um colorido desejo sobressaltava... ouvíamos do outro lado da ranhura do gesso
“Estoy enamorado”,
“Sí mi querido”,
E as varandas balançavam e as escadas brilhavam e as ombreiras...
Se iluminavam,
E
“Estoy enamorado”,
“Sí mi querido”,
Amávamos-nos como bijutarias da “feira da ladra”, levava livros para vender e trazia panfleto de heroína para fumar,
“Si mi querido”,
“Estoy enamorado de ti” e quando regressávamos a casa tínhamos um regimento de transeuntes à nossa espera, polícia, polícia e mais polícia, tudo porque tínhamos trocado alguns livros por outros tantos panfletos de ardósia tarde sem recreio,
“Estoy enamorado de ti”,
“Estoy enamorado” e apelidam-de de pássaro das frias noites de agonia, sinto as ranhuras no gesso que a esperança corrompe as paredes da minha habitação, um fino e velho cubículo, um casebre com quatro janelas de pano, um esqueleto em porcelana com duzentos e seis ossos embainhados nas tormentas dos beijos desperdiçados, a canalização sempre em pequenos arrotos devido aos pigmentos de ferrugem, ouvíamos cair sobre nós os pingos longos da chuva sem
Nome?
“Estoy enamorado” e apelidam-de de pássaro das frias noites de agonia, sinto as ranhuras no gesso que a esperança corrompe as paredes da minha habitação, um fino e velho cubículo, um casebre com quatro janelas de pano, um esqueleto em porcelana com duzentos e seis ossos embainhados nas tormentas dos beijos desperdiçados, o nome pertencia à rua do abismo construído sobre os rochedos da coragem, estar e não pertencer estando, e nunca estive, e nunca estarei...
Disponível,
“Estoy enamorado”,
“Sí mi querido”,
E a abelha zarpou de mim, sinto-me livre, sinto-me... sinto-me como uma enxada vociferando os novelos de lã da minha mãe...
Amanhã, amanhã... amanhã “estoy enamorado”.


(não revisto - ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 4 de Janeiro de 2014