foto: A&M ART and Photos
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Das tuas tristes mãos, as pérfidas melodias de ti
para me contentares como se eu fosse contentável, como o são, os
outros, os esqueletos, compostos de massa xistosa com algumas fendas
devido ao cansaço, suor, e como escrevinha o povo, e lágrimas, ou,
como o pão que o diabo amassou, e se não existir o diabo, e se
existir, ele, sabe-se lá, for um péssimo amassador de farinha,
água, fermento e sal... e algum esforço físico,
ficamos sem pão
Confesso que nunca vi, ouvi, ou... de perto, convivi
com a ilustre personagem que apelidaram de diabo, e que como quase
tudo, é o culpado das coisas más, porque das boas, essas,
encarrega-se deus, como antigamente, quando acontecia alguma coisa
má, em muitas das nossas aldeias, vilas e cidades, claro... a culpa
era sempre dos ciganos,
comprávamos heroína, e logo alguém nos dizia –
Se fores apanhado dizes que compraste a um cigano! - talvez porque
exista uma fisionomia entre eles, ou porque realmente alguns por
infelicidade tornaram-se culpados sem o saberem, culpados, como eu,
vagueando entre cidades como uma carruagem de metal enferrujado, e de
porto em porto, sobre os carris travestidos de tristeza, ando, andam,
caminham-se-me porta adentro, cortinados vazios, simplicidades
obscuras que acordavam nas poucas esquinas com venda de pequenos bens
não essenciais, um rolo de papel alumínio, uma nota de vinte
escudos, de preferência de quinhentos escudos, e quinta-feira,
sempre à quinta-feira, o carro enfeitado com luzinhas quadricolores,
e de seguida, sem o saberem, acordavam as madrugadas de dor de
costas, de diarreia, de enjoos, e afins como a insónia, o corpo
transformava-se em cilindro, rodava sobre um eixo imaginário, e
quando vinha a mim a madrugada, perguntava-me – Quantas Francisco,
quantas voltas hoje em torno de ti mesmo? - e nunca percebia até
descobrir nas tuas tristes mãos, finíssimas, e de dedos também
eles finíssimos e compridos, que
Tinhas dentro de ti, sem eu o saber, uma escada
secreta, com cobertores e espelhos, ambos, em madeira de primeira
categoria, gosto, muito, - Sabes? - do Mogno ou do Carvalho Francês,
(Antena 3 – Alijó – 101.5 MHz)
Quando chovia, sentia-te desaparecer dentro das
sombras que viviam connosco na casa de Favarrel, e só mais tarde,
quase quando começaram as demolições da dita, que eu descobri que
existia uma escada, até então secreta, tua, só tua, que subias, e
a meio caminho, sentavas-te, como uma prisioneira à espera que lhe
encerrassem a cela fictícia, uma cela de ficção como os testos dos
escritores, que para não se chatearem com esta ou aquela pessoa,
escrevem
(texto de ficção, não revisto)
não revisto, vá lá que não vá, - Agora... de
ficção? - Não... nãoooo...
(País de ficção, qualquer coincidência com a
fantasia é pura realidade)
E tudo em ti é ficção, são-o as tuas doces mãos
e tristes palavras, quando acordam no centro da galáxia, os teus
olhos, também eles, pura ficção, são-o os teus seios, as tuas
coxas de socalco esquecido junto ao Douro, e também é de ficção o
teu púbis envergonhado nas eternas geadas de Janeiro, aqui, porque
lá, era verão, porque lá, lá tudo, também, como tu, tudo de
ficção,
(texto de ficção, não revisto)
Amo-te, meu amor,
Cinco cêntimos de melancolia
Libertava-me de ti e das
tuas sombras penumbras que o vento comia
e deixava sobre uma mesa
redonda
os cansados uivos que o
prazer recheava o prato de sopa mergulhado em tonturas e febres
desgovernadas
tristes
cansadas
era eu o teu guardião das
madrugadas fingidas pelos teus orgasmos de cera
que ardiam no altar da tua
cama virada para o mar,
Não eras de pedra
aço
não minha e nunca o serás
e deixo-o arder entre
clareiras como flores pintadas com verniz,
É-o no medo corrompido
sabendo-o esquecido pela infinita mão
de ficção
em cinco cêntimos de
melancolia
e três dias depois
evaporou-se como se
evaporam as minhas palavras para ti...
Mata-me se puderes, mas
(ficção)
Deixa-me ficar os teus lábios para eu recordar, um
dia, e nunca o esquecer...
esquecer o que são lábios, os teus, de pura
ficção,
… de mera fantasia.
(Amo-te, meu amor)
@Francisco Luís Fontinha