quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Noite inventada


Trazes-me as palavras de dormir
para eu alimentar
a noite inventada,

trazes escrito no teu submerso olhar
os beijos encarnados da madrugada
quando os jardins sem destino
profundamente encalhados no poço da morte
húmidos todos os homens abraçados ao sargaço menino
sem sorte
escrito em sôfrego cigarro desvairado
coitado
do poema desalmado
na corda do vento,

sem o tempo definido
nas paredes das tardes de sorrir,

tão querido
o meu cão a latir
percebendo que nas minhas mãos de nada
a maldita madrugada
(a dos beijos encarnados)
escreve nas sílabas de sonhar
as palavras amarguradas
que alimentam a noite
a noite inventada.

(poema não revisto)

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Cai sobre mim das pálpebras azuis


O sono dos livros sem o destino prometido
na mão do menino querido
vêm da noite os silêncios de luz
que a boca trasfega na planície das palavras cansadas,
deixo de ver o olhar dos pássaros
e o sorriso das flores
não oiço mais o sofrimento dos homens de branco,
cai em mim o sono travestido de sílabas finíssimas
como fios de água
na garganta do xisto encaixado nas masmorras infinitas dos sonhos
cai em mim
as línguas do poema profanado
com a dor indistinta das manhãs sem o orvalho,
cai sobre mim
o perfume das tuas pálpebras azuis
iluminadas pelas lágrimas de um coração esmigalhado...

(poema não revisto)

terça-feira, 16 de outubro de 2012

A nossa misera madrugada dos relógios infinitos


Mergulho nos cansaços das pedras doridas
com o coração prisioneiro num cubo de aço
quando o sorriso da revolta
dos pássaros
as flores que a noite come em pedacinhos de nada
a madrugada
a nossa misera madrugada dos relógios infinitos
o tempo escoa-se nas escarpas visíveis das rochas amargas
a boca
sem o beijo indesejável da aranha
abelhas
nas colmeias da insónia,

gostava de preencher os espaços vazios do medo
com os barcos envelhecidos
que o rio engole
com a língua do mar,

as abelhas nas colmeias da insónia
quando a madrugada
quarta-feira em desalinho,

ontem eu percebia que as árvores dançavam sobre as mesas de mármore
que no cemitério das ervas daninhas
as agulhas das tardes de Outubro
brincam com os comboios de papelão...

(as abelhas nas colmeias da insónia
quando a madrugada
quarta-feira em desalinho),

e descem sobre mim as lágrimas das nuvens incolores
nas persianas que o sol tece
e a tua mão semeia na terra vendada das palavras.

(poema não revisto)

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

O eterno Etón


Milimetricamente encerrado num cubo fictício
com o tecto abraçado a integrais triplas
com desejos infinitos de água límpida da manhã

iluminam-se-me as mãos quando na minha rua sem saída
passam os teus olhos em pérola de amêndoa
e algodão doce
e o limo do cansaço
o eterno Etón dificilmente sairá da minha algibeira

milimetricamente as línguas de incenso
na janela do poema envenenado pelas sílabas assassinas
que a neblina semeou nas arcadas do sonho

penso dentro das noite escondidas nos fios de luz
que os teus lábios emanam na cegueira dos traços grossos da Lua
dentro do teu peito
absolvidos todos os palhaços de pano
com a flanela amarrotada
o azul silêncio das árvores
e a musicalidade do sorriso que deixas ficar sobre a mesa-de-cabeceira
na parede
na parede pregado o medo
que todas as palavras morram
porque
porque as palavras ressuscitam nas coxas do Mussulo.

(poema não revisto)

Cachimbo de Água em destaque


domingo, 14 de outubro de 2012

As espadas do sonho

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Experimento as espadas do sonho
quando rompem as ondas desgovernadas
das manhãs de Outono
na janela com fotografia a preto e branco
os cotovelos alicerçam-se
e das raízes da solidão
ao longe
os socalcos de xisto mergulhados no infinito cansaço

se eu tivesse um barco
voava sobre as nuvens de prata
quando o sol na minha mão
se extingue contra as rochas da noite em findos minutos de nada

percebia-se pelos olhos do boneco de palha
que as estrelas tinham deixado de brincar
e que a lua menina
saltitava nos assobios dos melros

que era noite no lençol de linho
e alimentava as locomotivas com círculos e palavras
que era sábado nos sábados embrulhado no cobertor à procura da lareira
sabendo que um qualquer livro espera por mim

e me abraça
nas salas despovoadas com mesas e cadeiras mortas
e flores
flores mergulhadas no cio da neblina

(Experimento as espadas do sonho
quando rompem as ondas desgovernadas
das manhãs de Outono)

e flores
flores mergulhadas no cio da neblina
duas horas antes de eu adormecer...

(poema não revisto)

O sótão de sombras


As lágrimas das árvores
brincam no silêncio da tarde sem nome
na penumbra viagem do vento
acariciam-se os sorrisos das pedras
nos lábios do poema
fingindo orgasmos abstractos
que uivam dentro do cubo de vidro
e o homem com o chapéu construído de sonhos
leva na algibeira a moeda finíssima
para atravessar o rio da morte
quando chovem os teus cabelos
sobre a eira de Carvalhais,

oiço o sino da igreja
a enrolar-se nos pinheiros de papel
colados no muro da insónia
as palavras
as palavras dos pássaros voadores,

dentro do céu
as escadas que me transportam para o sótão de sombras
onde o candeeiro a petróleo
dorme vagarosamente no tecto da aldeia,

e cessam as sílabas
de todas as portas e de todas as janelas
que fervilham antes de cair a noite
em desejo.

(poema não revisto)

sábado, 13 de outubro de 2012

Em abraços de aço os barcos e os paquetes


As manhãs eram de líquido cambaleando dentro da noite
no vidro do cansaço
o dardo das tuas palavras contra o meu peito
a singela e triste árvore dos sonhos
na proa de um paquete sujo e nu
obeso como as rochas aprisionadas no tecto das coxas tuas lua de cor,

amanhã vou sentar-me sobre as sombras húmidas que os ponteiros do relógio
constroem nas asas de um moinho de vento,

cai a chuva imaginada pela boca
a tua boca em gritos herméticos
a tua boca nas carícias dos lábios perpendiculares ao beijo
da aranha de vinte e cinco patas,

(amanhã vou sentar-me sobre as sombras húmidas que os ponteiros do relógio
constroem nas asas de um moinho de vento),

e o círculo do desejo
em movimento circular e uniforme...
em abraços
de aço
os barcos e os paquetes
quando o púbis das sílabas
dorme sobre o mar
e as manhãs solidificam.

(poema não revisto)

Cansados às vezes esquecidos


O mar a enrolar sorrisos
nas mortalhas dos lábios adormecidos
cansados,

às vezes
esquecidos,

e nos silêncios perdidos
caminha a noite sem destino
porque nas mãos de um menino
vive e cresce a madrugada,

cansadas
às vezes,

as equações diferenciais
suspensas no desejo das matrizes compostas
que o dia constrói
e a tarde alimenta,

o mar
e os cigarros em migalhas
antes de fumados,

o mar a enrolar sorrisos
nas mortalhas dos lábios adormecidos
cansados,

cansados
às vezes,
às vezes cansadas,

as vozes dormentes da Primavera.

(poema não revisto)

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

O poema adormecido


A lua
tua
minha apaixonada lua
nua

a lua dos silêncios que habita nas profundezas da tua dor
despede-se a noite
com beijos curvilíneos
ou não
as ardósias das esplanadas junto ao rio

o sol incandescente alimenta a tua voz cintilante
apaixonada
lua
a tua
janela acorrentada às luzes fictícias do orvalho
nua às vezes habilmente só

e tão bela

connosco o mar é enorme
enormemente infinito
o amor às palavras
com as tuas palavras
nua
a lua
tua
dentro do poema adormecido.

(poema não revisto)