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sábado, 19 de fevereiro de 2022

Ausência

 

Ausento-me.

Enquanto o sono se despede de mim,

Enquanto esta fogueira me consome,

Enquanto o dia se derrete,

Enquanto a lua se deita,

Enquanto o medo me absorve.

 

Ausento-me.

Enquanto o silêncio habita neste corpo,

Enquanto estes ossos não se transformam em pó,

Ausento-me.

Enquanto o mar não entra pela janela,

Enquanto a morte não me vem buscar.

 

Ausento-me.

Enquanto ainda tenho beijos,

Enquanto ainda existem abraços,

Enquanto este relógio não pára de caminhar…

Ausento-te.

Enquanto este poema não morre.

 

Ausento-me.

Enquanto esta cidade não dorme,

Enquanto este rio não deixa de correr para o mar.

Ausento-me.

Ausento-me,

Enquanto escrevo e a tua mão não deixar de me tocar.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 19/02/2022

quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

O sonho


Todas as coisas, possíveis, impossíveis,
Acontecem quando nasce em mim a noite.
O corpo range de sono, perco-me nas palavras da saudade,
Quando regressa a madrugada,
E, todos os pássaros voam em direcção ao mar.
Um barco chilreia, voa sobre o jardim das cantarias,
Flores dispersas, como mendigos apressados,
Brincando na eira,
Olham o cereal,
Deitam-se no chão,
E, sonham com o luar.
Todas as coisas,
Infinitas, finitas, nas mãos de Deus.
Um esqueleto de silêncio vagueia nas pálpebras da insónia,
Morrem as pedras do meu pobre jardim,
Levantam-se as migalhas da fome,
Quando um carnívoro de sombra, às vezes cansado, levita na escuridão da solidão.
Tenho fome;
Tive pai, mãe, e, nada mais…
Agora, tenho a floresta,
Os papagaios em papel, de três cores,
E, num pequeno caderno quadriculado, invento o sonho,
Imaculado, distante, ausente,
Como todas as coisas,
Possíveis, impossíveis.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
29/01/2020

domingo, 29 de julho de 2018

Nesta casa


Nesta casa não conheço a tua pessoa,

Nesta casa despede-se a paixão das estrelas sem nome…

Como um relógio abandonado,

 

Nesta casa deixou de haver alegria,

E todas as janelas se transformaram em grandes,

Revoltadas,

Cinzentas,

 

Nesta casa habita a saudade,

Da tua pessoa,

 

Em cada final de tarde,

 

Nesta casa não conheço a tua pessoa,

Apenas sombras de papel suspensas nas paredes,

E um sorriso submerso na minha infância…

 

Em cada dia,

 

Em cada tristeza.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 29/07/18

quinta-feira, 13 de julho de 2017

Levante


Pequenas palavras nos versos tuas mãos,

Algumas pinceladas no teu olhar,

Um livro que poisa nos teus lábios…

A cada dia…

Ao levantar.

 

Pequenos gestos da infância,

Nos gonzos cromados da tua solidão,

Impávidos, enquanto esperamos pelo luar…

Sem pressa de caminhar.

 

O levante teus seios na ausência preia-mar,

A gaivota “Adeus” em pequeninos círculos junto ao mar…

A floreira da tua lápide recheada de flores,

E palavras de saudade,

 

A partida, meu amor,

A partida das árvores e dos pássaros,

A partida do livro em beijos e abraços…

 

Nas estátuas de sal…

 

O levante teus seios na ausência da escuridão.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 13 de Julho de 2017

domingo, 2 de julho de 2017

O amor…


O amor…

Ai o amor acorrentado ao sorriso da manhã!

 

Palavras vãs,

Tristes sombras dos alegres divãs,

Onde me deito e esqueço a tua ausência,

Ai o amor da infinita infância,

Silêncio madrugada,

Flor abandonada,

Ai o amor…!

Ai nada.

 

Alfama,

Belém enamorada,

O Tejo na minha mão desmesurada…

Ai o amor…!

 

O amor de nada.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 2 de Julho de 2017

sábado, 18 de março de 2017

O beijo do silêncio madrugada


Um beijo que o silêncio madrugada

Afaga na escuridão da ausência,

As silabas estonteantes do sono

Que adormecem nas velhas esplanadas junto aos rochedos,

Vive-se acreditando na miséria do sonho

Quando lá fora, uma árvore se despede da manhã,

Um beijo simples,

Simplificado livro na mão de uma criança,

Um beijo,

No desejo,

Sempre que a alvorada se aprisiona às metáforas da paixão,

Sinto,

Sinto este peso obscuro no meu coração,

Sinto o alimento supérfluo da memória

Quando as ardósias do amanhecer acordam junto ao rio…

E na fogueira,

Debaixo das mangueiras…

Os teus lábios me acorrentam ao cacimbo,

Sou um esqueleto tríptico,

Um ausente sem memória nas montanhas do adeus,

Um beijo que o silêncio madrugada

Afaga na escuridão da ausência,

A uniformidade das palavras

Que escrevo na tua boca,

Sempre que nasce o sol

Sempre que acordam as nuvens dos teus seios…

E um barco se afunda nas tuas coxas,

Oiço o mar,

Oiço os teus gemidos na noite de Lisboa…

Sem perceber que és construída em papel navegante…

Que embrulham os livros da aflição,

Um beijo, meu amor,

Um beijo em silêncio

Galgando os socalcos da insónia…

Vivo,

Vive-se…

Encostado a uma parede de vidro

Como leguminosas no prato do cárcere…

Alimento desperdiçado por mim.

Desamo.

Fujo.

Alcanço o inalcançado…

E morro.

 

 

Francisco Luís Fontinha

18/03/17

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Corpo sentido


O meu corpo sente

Os teus lábios carnívoros

Desenhando marés de medo

E palavras de silêncio,

O meu corpo sente

As tuas mãos de xisto

Transportando um rio no sorriso

Antes de terminar o dia,

O meu corpo sente

A noite menina

Deitada na praia…

Deitada na ria…

O meu corpo sente

A despedida

De um relógio de bolso…

Quando a cidade adormece,

O meu corpo sente

E estremece

Quando o teu cabelo aprisiona o luar…

E nada pertence à saudade…

O meu corpo sente

As sílabas do poema

Quando a madrugada se despede da cama…

E o meu corpo,

Ausente

 

Sente.

 

Francisco Luís Fontinha

segunda-feira, 1 de Agosto de 2016

quarta-feira, 8 de junho de 2016

Só como os poetas da madrugada…


Ninguém morre sem primeiro experimentar o veneno da saudade,

O cintilante cansaço dos dias

Nas veias do condenado transeunte,

A cidade…

Ausente,

Meticulosamente só como os poetas da madrugada…

Sem nada na mão

Sem palavras escritas ou cantadas…

A caneta da solidão

Cravada no peito,

A espada do silêncio

Voando sobre as aldeias insignificantes

Do poema,

Como eu

Esperando o regresso do deserto

Sobre esta cama em chamas.

 

Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 8 de Junho de 2016

quarta-feira, 1 de junho de 2016

o ausentado


a metrópole sofre

chora e engana

todos aqueles que partem

a gente acostuma-se à ausência do corpo

na neblina incendiada pela escuridão

um vulto de luz…

caminha na minha direcção

pergunta-me pelo ausentado

o coitado

que partiu…

que partiu sem deixar rasto

ou migalhas no silêncio

e eu

preocupado

respondo-lhe…

não sei do coitado

ausentado

mas sei que ele partiu

numa noite embriagada de palavras

ruídos alguns…

e a madrugada sem a ver

a metrópole sofre

chora e engana

resigna-se apenas a um simples bilhete abandonado na porta de entrada

esqueço-me

perco-me

e eu

preocupado

sangrando sílabas

porque um dia

o coitado

do ausentado

partiu… e nunca mais foi encontrado

 

Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 1 de Junho de 2016

sexta-feira, 27 de maio de 2016

Gaivota junto ao Tejo


Imagino-te arrastando os suspensórios do cansaço,

O cigarro suspenso na boca,

E nas mãos as minhas mãos,

Trémulas como a tempestade…

Apareces,

Desapareces,

E ausentas-te durante o sono,

Entras nos meus sonhos,

Escreves no meu corpo com a caneta da saudade,

O rebelde menino,

Sentado à janela a olhar o mar…

Sinto-te dentro de mim,

 

Alimentas-te do meu sofrimento,

E pertences às flores do meu jardim,

Imagino-te arrastando os suspensórios do cansaço…

Enquanto lá fora alguém chora a tua partida,

Apátrida memória que se alicerça aos meus braços,

E tens no olhar um triciclo, um velho triciclo moribundo,

Doente,

Sem nome…

 

Imagino-te, meu amor,

Deambulando pela casa embriagada de dor,

Os cinzeiros cessam o sorriso dos teus lábios,

Há no teu corpo uma barcaça desnorteada,

E que se afunda no meu Oceano…

Fico com medo de perder-te…

E perdi-te sem o saber…

Foste, foste sem dizer Adeus,

E nem coragem tiveste de escrever-me…

Abraçar-me,

Dizer-me que partias e um dia aparecias no meu peito,

Como se fosses uma gaivota junto ao Tejo.

 

Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 27 de Maio de 2016

domingo, 3 de abril de 2016

entre parêntesis


o peso do corpo

quando o corpo se ausenta da realidade

a morte vulcânica do sentido proibido da vida

os tristes pássaros empoleirados nas avenidas sem destino

a lucidez do alpendre da solidão

caminhando calçada abaixo

os ossos

o pó dos ossos

manchado nos camuflados risos da manhã

ao teu lado

oiço amo-te

ao teu lado

oiço-te desejo-te

mas a madrugada roubou-nos o desejo

tenho uma estrada abandonada

nos abismos da madrugada

o silêncio enraizado na melancolia do suor teu corpo

a alegria

sentindo a solidão dos obscenos corpos de nata

há-de viver em mim a mulher desenhada nos espiões da noite

o amanhecer morre no ínfimo acreditar da noite

tenho sono

meu amor

amanhã viverei no teu corpo

amanhã sentirei o teu corpo

fatias finas

papel amargurado

nas algibeiras dos corpos suicidados

a morte

os amigos da morte

na ambição do sonífero sonolento

hesito

morro

neste barco de sentinelas amordaçados

o tempo

sempre ausente de ti

enigmático coração de vidro

sofro

deixo-me sofrer pelos teus lábios

os beijos

o comboio em direcção ao nada

transeuntes acabrunhados

que só o vento desenlaça na porta de uma casa de alterne

o medo da morte

a embriaguez dos rostos maltratados

que os livros comem ao pequeno-almoço

são horas de partir

meu amor

a ausência do cachimbo oco que habita a minha mão

a ausência do olhar

correndo em redor do mar

a cerveja quente o uísque alicerçado às minhas costas

fumam

comem cigarros livros de papel fumado

a noite é um corrupio sonolento da alma

amei-te

quebrado nas montanhas da solidão

este magro corpo acordado do sono

este magro sono acordado no magro corpo

gosto de ti

dos teus olhos vestidos de noite

entre parêntesis

snob

sono da alegria de morrer

 

Francisco Luís Fontinha

domingo, 3 de Abril de 2016

quinta-feira, 10 de março de 2016

Apressadamente


Caminho apressadamente

Para os teus braços invisíveis

Regressa a Primavera e depois o Verão

E nós sem amanhecer

Nem vontade

De desenhar a alvorada no chão…

O teu corpo sente

O meu corpo mente

Velozmente

As palavras de escrever

Caminho apressadamente

Com vontade de te ver

Sentir em mim o sentir

No brincar das tuas mãos em liberdade

Com o poema de sorrir…

Caminho

Caminho apressadamente

Como um livro a fugir

Da fogueira do adeus

E do vento

E da chuva

E do beijo a cair

Sobre os lençóis da madrugada

A penumbra espuma

Saltitando à janela

Sem bruma

Nem desejo que segure nela…



Francisco Luís Fontinha

quinta-feira, 10 de Março de 2016

terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

A álea manhã


A álea manhã ensanguentada

Fugindo da madrugada,

Das sílabas amargas do poema inacabado

Suspenso na esquina da avenida na cidade inseminada,

O cansaço coração repatriado

Descendo a montanha salivar,

O visitante perdido

Procurando os lábios da paixão

Que só ele sabe desenhar,

O poder da morte brincando no mar

Arrastando barcos para a destruição…

Um cigarro esquecido na mesa-de-cabeceira,

O silêncio à volta da ribeira…

Correndo para o rio dos murmúrios,

Um pedaço de terra que chega

E sobra

Para cobrir o olhar da serpente,

A álea manhã ensanguentada

Fugindo da madrugada,

As fotografias da solidão

Dentro de um pequeno livro,

Procura-se o alívio

E o repouso do tempo monstruoso…

E a álea manhã

Sentada à janela,

Em gritos espasmos

Revolta-se contra o desleixo da noite,

O ciúme envergonhado

Na lápide do artista,

As palavras ternas na mão do viajante,

Fugindo da madrugada

E da gente,

Como nós defuntos

Abraçados aos rochedos da saudade…

Outro cigarro,

Outra morada anónima,

O machibombo engasgado nos alicerces da picada,

Não me apetece olhar-te,

Não me apetece alimentar-me da tua ausência,

E a álea manhã

Sempre pronta para me acorrentar

Ao peito da madrugada…

 

Francisco Luís Fontinha

terça-feira, 9 de Fevereiro de 2016

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Noite sem nome

(Francisco Luís Fontinha – 14/08/2015)
 
 
Nunca me disseste onde aprisionaste os teus olhos cinzentos,
Permaneço um farrapo dançando ao som do vento,
São tão tristes as noites, meu amor…
 
Pareço um veleiro acorrentado às fotografias de ontem,
Olho-me de espingarda ao tiracolo da minha sombra,
Tenho balas em cartão,
Beijos floridos fundeados no teu coração…
 
E sinto-me contente porque fumo, bebo… respiro o perfume da tua ausência,
 
Não existe em mim a solidão,
O medo…
E as belas âncoras dos teus seios gritando…
Saudade,
 
Escrevendo no meu corpo…
Amo-te,
 
Desenhando nos meus braços,
 
A cidade.
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 14 de Agosto de 2015