domingo, 12 de maio de 2019

A rosa,



São os dedos do poeta quando constrói o poema sobre a cidade.
São os lábios do poeta quando beija a madrugada.
É o perfume da noite quando o poeta dorme nas estrelas.
A rosa,
São os espinhos do poema,
As pétalas do poeta,
Quando o poema é incendiado pelo olhar da escuridão.
 
 
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
12/05/2019


domingo, 5 de maio de 2019

A sombra dos teus lábios


A sombra dos teus lábios,

Suspensa no silêncio da noite.

Desenho a madrugada,

No teu corpo de escrever,

Escrevo palavras,

Silêncios de sofrer.

Em cio todos os pássaros,

Todas as abelhas,

No telhado da aldeia,

A sombra dos teus lábios,

Brincando na eira,

Escrevo palavras,

Parvas,

No teu corpo alvorada,

Desisto,

A melancolia,

Um dia,

Morta na calçada.

A sombra dos teus lábios,

Que a noite vê crescer,

É luar,

É mar,

É poema de sofrer…

A sombra dos teus lábios,

Os pinceis da revolta,

O jardim envergonhado,

Sem escolta,

Descendo a calçada,

O sem-abrigo desgraçado,

De livro na mão…

Deita-se no chão,

Dorme tranquilamente como uma pomba…

Engana a fome com o poema,

Bebe todas as sílabas do poema…

E morre.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

5/05/2019

sábado, 4 de maio de 2019

Amigos


De todas as paisagens que visitei com prazer,

São os teus olhos a arder,

No meu rosto de sofrer.

 

São flores,

De todas as cores,

No meu jardim imaginário,

São flores,

São rumores…

Na cabeça do lampadário.

 

De todas as paisagens que visitei com prazer,

São palavras minhas no teu corpo de escrever,

São rosas a sorrir, são rosas a sofrer.

 

São gladíolos de papel,

Barcaça, batel…

De todas as paisagens que visitei,

São telas em pastel,

São o grito que pintei.

 

De todas as paisagens que visitei com prazer,

São livros para ler,

São amigos para conviver…

 

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

04/05/2019

sexta-feira, 3 de maio de 2019

A morte


A morte.

A tempestade dos cadáveres poéticos,

Quando do espelho, ao anoitecer, a mão do poeta sufoca o próprio poeta.

O comboio alimenta a morte,

O poema,

O texto.

O corpo do poeta evapora-se nos lábios de uma rosa,

Voa,

E chora ao anoitecer.

A morte.

A fragrância das palavras deitadas sobre a mesa,

Um candeeiro a petróleo vomita lágrimas de luz,

Escrevo,

Apago o que anteriormente escrevi,

Porque não faz sentido,

Porque a morte é parva, estúpida e ignorante…

A faca,

O pescoço alicerçado à lâmina,

O frio do aço que escorrega debaixo das mangueiras,

E nos braços, junto aos pulsos, a cratera do desespero,

Sem perceber o significado do sonho!

As nuvens suspensas na madrugada,

De hoje,

De ontem…

E de amanhã.

A morte,

A sagrada morte num corpo sofrido, silenciado pela sombra…

Nos teus braços.

Adormecer.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

03/05/2019

quinta-feira, 2 de maio de 2019

O teu sorriso


O teu sorriso é uma rosa de pétalas encarnadas,

A sombra do plátano,

Na Primavera encantada,

O teu sorriso é o mar em cio,

A madrugada atrapalhada,

Quando regressa o frio.

O teu sorriso é uma jangada,

O silêncio da alvorada,

Junto ao rio.

O teu sorriso é um livro de poesia,

Palavras voando sobre a cidade dos pássaros…

No final do dia.

O teu sorriso,

O esplendor da floresta virgem,

As marés,

E os barcos de papel,

O teu sorriso,

Um batel,

Sonâmbulo das noites intermináveis…

Como uma jarra de flores,

Sobre a mesa,

Sobre a secretária…

Recheada de livros.

O teu sorriso é o luar,

Marinheiros enfurecidos nas asas do embriagado mar,

O teu sorriso é oiro,

Incenso,

Mirra…

Ai, menina, o teu sorriso!

O teu sorriso é literatura,

Ternura,

Nas tardes de xisto.

O teu sorriso é feitiço,

Nas caravelas,

No cais da despedida…

O teu sorriso é a sanzala,

O capim,

Jardim,

Que nunca se cala.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

02/05/2019

domingo, 28 de abril de 2019

O poema


Hei-de escrever-te um poema,

Numa tarde de Domingo,
enviá-lo pelo melro amigo,

Deste meu jardim recheado de palavras,

Hei-de escrever-te um poema,

Guardá-lo na algibeira,

Enquanto não regressa o melro amigo.

Hei-de semear uma bandeira,

Na tua mão de alecrim,

A bandeira do meu País…

Que vive a morte assim;

Uns são presos,

Outros, corruptos,

Outros nada são,

Só no meu País…

País do meu coração.

Hei-de escrever-te um poema,

Lindo de morrer,

Poema que vai aquecer,

O teu corpo de menina.

Hei-de escrever-te um poema,

Que um dia vai pertencer,

Ao livro da saudade,

Antes de eu morrer…

Hei-de escrever-te um poema,

Levar a espingarda,

E com o meu amigo melro,

Descer a escada,

Que dá acesso ao mar.

Levo a bandeira,

Levo a espingarda de papel…

Um dia vou,

Vou escrever-te um poema,

E assinar,

Ofereço-te a bandeira,

Ofereço-te o meu amigo melro…

Mas eu fico com o poema.

 

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

28/04/2019

sábado, 27 de abril de 2019

Noite


Um fio de luz,

Desce o teu corpo,

Tens na algibeira o livro da nova poesia,

Que um dia, vai aportar na tua mão.

Trazes nos lábios o sabor da cereja bravia,

Cansada de correr,

E um dia,

Junto ao mar,

Vai morrer.

Trazes nos cabelos a luz da madrugada,

Negra,

Sem perceber,

Que a paixão,

Um dia, que a paixão um dia vai adormecer.

Trazes na boca a loucura,

As tâmaras apaixonadas da Primavera,

Toco-te, e acaricio-te…

E da minha mão,

Brotam toneladas de palavras.

São rosas,

São gladíolos…

São jardins em construção…

Como vampiros.

 

Um fio de luz, no teu olhar.

 

Serve-me.

 

Inspira-me.

 

Enquanto desce a noite nos teus seios…

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

27-04-2019

sexta-feira, 26 de abril de 2019

O circo


Sou filho da noite.

Sempre adorei a noite, onde vivem as palavras e os amores proibidos,

Ou impossíveis,

Ou amores inanimados.

 

Quando criança, brincava com aviões em papel,

Papagaios em papel,

Barcos de esferovite,

Com motor.

 

Sempre me lembro desalinhado com os momentos passados,

Tristes, alguns,

Alegres, outros,

E adorava, adoro, o circo.

 

Hoje, temos cá o circo,

Sempre foi o meu sonho fugir com um circo,

Viver de noite,

Andar de terra em terra.

 

Apaixonado pelas árvores.

Pelos palhaços,

Trapezistas

E outros malabaristas.

 

Os últimos já existem na política,

Temos malabaristas a mais,

Todos formavam uma grande companhia de circo…

O circo da merda.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

26/04/2019

quinta-feira, 25 de abril de 2019

O falso poeta


O pilantra poeta que vos escreve,

É um falso poeta,

É um nocturno livro com folhas de nada,

O abismo,

Na madrugada.

 

O falso poeta,

O profeta das palavras imaginadas por um louco,

Que um dia sonhou ser poeta,

E hoje é um palerma de merda,

Sentado numa qualquer esplanada.

 

O profeta, poeta, embrulha-se no seu poema,

Roubado dos jardins públicos da aldeia,

Escreve no chão,

Grita a liberdade por estar vivo

E não ter ido à Guerra.

 

Esse mesmo, o eu, o poeta de merda…

O homem dos sonhos irrealizáveis,

Dos desenhos abstractos das montanhas do silêncio…

Quase nada,

Nada.

 

O pilantra poeta,

O dos livros queimados,

O transeunte ilustre da cidade apagada…

Fujam de mim,

Que nada valho…

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

25/04/2019

quarta-feira, 24 de abril de 2019

A revolução dos petroleiros


O fogo.

O belo que arde,

O feio que resiste à tentação da paixão.

As lâminas da solidão quando alimentam as madrugadas de Inferno,

O algodão,

A barriga negra, queimada pelo xisto abstracto da noite,

O cansaço da fogueira,

Que descansa na calçada,

As lâmpadas do sofrimento,

O belo que arde,

O fogo,

A fogueira onde brincam as flores,

Os pássaros e as abelhas,

Poisam docemente nos teus lábios…

Apenas nos teus; em mim, não.

O medo de arder enquanto chove na minha mão,

O medo de te perder enquanto chove no meu corpo salgado pelo Oceano do clitóris…

Amanhã,

Não.

O fogo,

O regresso das espingardas de cartão,

Pummmmmmmmmmmmmm….

Suicida-se a poesia nas lápides,

Suicida-se o poema nas palavras tristes das lápides…

E… PUM.

O tiro certeiro na cabeça do carteiro,

A revolução dos petroleiros que a maré vomitou,

Marinheiros,

Mulheres,

Gajas, gajos,

Embriagados pelo amor.

Eu não.

Nunca.

Pum.

Morreu o caderno negro.

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

24/04/2019