quarta-feira, 14 de outubro de 2015

A morte da verdade


Fontinha – Outubro/2015
 
A estátua que habitava no teu peito
Esta sentada, hoje, numa cadeira sem jeito,
Brinca, hoje, num jardim amarrotado por mãos inanimadas,
Como são tristes todas as madrugadas
E todos os versos do poeta,
Como são tristes todas as manhãs embriagadas
À mesa com um qualquer pateta,
Um imbecil encurralado na noite
Esperando o acordar de um relógio sem alma,
Chora, acredita nas lágrimas do sofrimento,
Chora, e inventa o inferno
No corpo do vento…
 
A estátua… não se cansa de dançar
Sobre a tua pele grená…
Os lábios manchados de sangue,
Os braços entranhados na face de um inocente,
Chora, acredita na liberdade,
Chora, acredita na saudade
Dos ausentes corpos de esferovite,
Grita, grita contra o muro invisível da prisão,
Morre a verdade,
Morre o ditador em pedacinhos de cacimbo…
Rasga o convite
E fica esquecido no tédio limbo…
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 14 de Outubro de 2015
 


segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Loucos pássaros


Fontinha – Outubro/2015
 
Ouvi-los… nunca,
Estes loucos pássaros envergonhados e tristes,
Estes homens sem fronteira
Galgando a sombra de outros homens,
Na fome, na miséria beleza
Quando o mar se aproxima, e mata, e eles fingem morrer,
Junto à ribeira,
Com o medo de tudo perder,
Eles, os pássaros, eles, os homens sem fronteira,
Agachados nos riachos envenenados pelo dinheiro,
Rastejando no capim outrora fértil de palavras…
E hoje, e hoje Oceanos de lágrimas laminadas.
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 12 de Outubro de 2015
 


domingo, 11 de outubro de 2015


Fontinha - Outubro/2015

Revolta


(Liberdade para todos os Presos Políticos em Angola)

 

Não acredito no amor,

Porque “o amor é um gajo estranho” (Pop Dell`` Arte),

O amor é um cadáver deitado no vazio,

É um esqueleto de estanho,

Em cio,

No princípio da madrugada,

Com fastio,

Drogada,

Não acredito no amor,

Não acredito na alvorada,

Me mente,

E me ama…

Como uma enxada,

Desenhando nos Socalcos do Douro a paixão de quem manda,

O fuzilamento de mim

Abraçado ao teu cabelo,

Sentado,

Cansado…

Cansado deste jardim,

Me escondo de ti,

E tenho saudades tuas…

Escrevo, rasco o que escrevo…

E nem devia,

E não devo…

Escrever o que sentia,

Esquecer o que me rodeia…

Nesta aldeia,

Neste cubículo de quem semeia…

O amor que não acredito,

Paro,

Escuto e grito,

“Liberdade para os presos Políticos de Angola”,

Foda-se,

A prisão

E as ditaduras,

O medo,

O medo e todas as esculturas,

Os ditadores,

Os impostores…

Agachados nos meus berços.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 11 de Outubro de 2015

sábado, 10 de outubro de 2015


Fontinha/Outubro-2015

Os desenhos do amor


Os vampiros da noite

Ente os aplausos e o derradeiro Adeus,

Do silêncio teu corpo

A alvorada impressa na sombra do teu olhar,

Do silêncio teus lábios

A madrugada a mendigar…

Nos vampiros,

Da noite,

A gaivota apaixonada voando sobre os desenhos do amor,

As palavras embriagadas

Dormindo nas esplanadas sem dono

Perdidas na cidade,

 

E eu aqui,

Sentado,

À tua espera…

 

Os vampiros da noite

Descendo as escadas da paixão,

Descendo até à profundidade da solidão,

Trazes-me um livro,

Pegas na minha mão,

Não falas,

Não sorris porque a escuridão engole-te…

E mais uma vez desapareces,

Transformas-te em poeira…

Cinza,

Sanzala inabitada,

Sem meninos… sem nada.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 10 de Outubro de 2015

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Querer-te

Querer-te não te quero
Querendo, assim, querer-te sem saber se te quero,
Querer… dormir nos teus braços,
Não querendo,
Querer…
Sonhar nas tuas mãos,
Querer-te não te quero
Querendo
Querer-te,
Assim… triste como a noite,
Desejando querer-te
Querer… beijar os teus lábios querendo,
 
Sem tempo,
Sem crença…
De querer-te,
 
Querer-te não te quero
Querendo, fingir que te amo não te amando,
Querendo,
Não o quero…
Querer-te
Querer-te brincando,
 
Neste submerso cansaço da paixão,
O querer e não o querer,
O amar e não o ser amado,
Querendo,
Querer…
Querer-te amando,
Amar,
Sem saber que o amor é querendo,
 
Sem saber que o amor é querer-te,
Hoje,
Ontem não, ontem não querendo,
Querer-te beijando,
O querer,
O não o querer,
Sem sono,
Sem o saber,
Que querer…
É querer sem o saber,
E o quero-te…
É uma carta por ler.
 
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 9 de Outubro de 2015

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

As lágrimas da solidão


Invento as lágrimas da solidão

Sobre o papel amarrotado da paixão,

O significado da morte esvaece-se no corpo de um sonâmbulo,

O mar que desenhei no teu olhar…

Não existe mais,

Nem o mar,

Não existe mais,

Nem o teu olhar,

 

Invento as lágrimas da solidão

Antes do regresso da noite vestida de canção,

Perdeu-se nas palavras adversas, perdeu-se nas planícies submersas…

Dos jardins suspensos da madrugada,

 

Visivelmente cansado…

 

Inventar objectos estranhos como as lágrimas da solidão

Em combustão,

Sobre o papel amarrotado da paixão,

Visivelmente cansado,

Sem destino,

Sem uma mão,

Caneta…

Para escrever no coração da tristeza…

 

Este menino,

Visivelmente cansado,

Sem destino…

Dorme docemente na sombra do abismo.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 8 de Outubro de 2015

O sono do desejo


Estes cacos incendiados nas escarpas do silêncio,

O teu corpo permitindo-me adormecer,

Sobre ele,

Uma rocha cor de cinza,

Faz fumo,

Incendeia-te como se fosses pedacinhos de papel…

Voando sobre a noite,

Na janela um cortinado negro com lábios de luar,

Entra o rio nos ombros flácidos das palavras embriagadas na sombra da morte,

A voz alimenta-nos,

Beija-nos,

Abraça-nos como se fossemos duas pedras em queda livre,

O abismo que habita o teu olhar,

O marinheiro sentado numa esplanada de esperma…

Sentas-te,

Foges-me,

Como a água,

Os barcos…

E todas as flores do Adeus.

terça-feira, 6 de outubro de 2015

Montanha do silêncio


Não,

Não venhas falar-me de amor,

Da paixão embriagada,

Entre noites,

E enxadas de geada,

Não, não meu amor…

Não,

Não venhas falar-me do mar quando fui eu que matei o mar em criança,

Não, não meu amor,

Não venhas falar-me desta cidade inacabada,

Só,

Sem pessoas ou madrugada…

Não,

Não pareço uma estátua,

Não,

Não sou um esqueleto de rosas perdidas num qualquer jardim,

E, e, no entanto, sinto-me envergonhado quando a noite se veste de despedida,

Os relógios pintam-se de vermelho,

O sangue do amor,

Dos automóveis em cio…

Ruelas, e o vício…

O vazio,

A escuridão dos seios entranhados na montanha do silêncio,

E os poemas,

Não,

Não venhas falar-me de amor,

Porque o amor…

O amor é uma enxada de geada.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 6 de Outubro de 2015