terça-feira, 29 de julho de 2014

A Casa Amarela


Desejastes-me Senhora,
quando eu tudo tinha,
hoje, que não tenho nada,
vós, minha Senhora,
odiais-me...
pareceis, hoje, uma alminha,
denegrida,
deitada na madrugada,

Desejastes-me Senhora,
nas mansardas de Belém...
fazíamos amor olhando o rio,
triste, e habitado por chulos, putas... e Cacilheiros,
à janela,
os cigarros semeados numa casa amarela,
fumegavam, e gritavam... e gritavam... esta Senhora é bela,
bela Porcelana,
que rica Porcelana... ela!
Desejastes-me Senhora,
quando eu tudo tinha,
hoje, que não tenho nada,

vós, minha Senhora,
odiais-me...

O poeta é um fotógrafo de palavras,
um pintor de caricias e medos,
o poeta é... o poeta é um escultor...
molda, molda o corpo da minha Senhora bela,
do granito embalsamado...
que olhando outro rio,
não triste, não habitado por chulos, putas... e Cacilheiros,
vive como um coitado,

vós, minha Senhora,
odiais-me...

E ainda guardais dentro de um livro uma envelhecida flor,

Não morreu o poeta, não morreu a minha Senhora bela...
mas... mas morreu o amor,

E morreu a casa amarela.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 29 de Julho de 2014

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Grito, fujo... às palavras começadas por...


Um rio esquizofrénico que não me deixa viajar,
sou acorrentado ao tédio cansaço do cais invisível,
não durmo, não vivo... vivendo nos lábios do desamor,
uma estrada congestionada abraça o teu corpo de linho,
e pareces um cortinado com odor a morte suspenso na solidão,
sem sorte,
grito, fujo... às palavras começadas por... não sei, talvez... talvez por A,
vendo o meu nome em troca de livros, vendo poemas em toca de beijos,
vendo-me... vendo-me em troca de nada,
nada,
que hoje a noite vai ser uma trampa,
um rio, um rio esquizofrénico que não me deixa viajar...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 28 de Julho de 2014

domingo, 27 de julho de 2014

Os socalcos das coxas cinzentas dos pinheiros bravios...


Feliz aquele que tem alguém para amar,
feliz aquele que tem um livro para ler,
escrever, tão feliz... tão feliz aquele que sente a noite adormecer,
adormecer... nos braços do luar,

Feliz aquele que tem lábios para beijar,
que habita numa boca com sorriso de amor,
feliz aquele que inventa cabelos na planície do amanhecer,
e sem querer... e sem querer começa a chorar,

Felizes os barcos que têm marinheiros de papel,
corpos nus, corpos com sabor a mel...
feliz aquele que tem seios para pintar,
segredos para desvendar, quando o calendário da solidão... desaparece no mar,
feliz, eu?
talvez venha um dia a acreditar,
que há sanzalas com odor a chocolate,
que existem nuvens plantadas nos socalcos das coxas cinzentas dos pinheiros bravios...
feliz aquele que morre sem o perceber,
feliz..., tão felizes os cigarros de fumar,
tão felizes os cigarros de viver,
… quando há uma mulher embrulhada numa folha amarrotada,

Feliz aquele que tem alguém para amar,
feliz aquele que tem um livro para ler,
feliz..., tão feliz aquele que tem um poema a crescer...
a crescer... no verbo desejar.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 27 de Julho de 2014