sábado, 17 de novembro de 2012

Escrevo-te da tua boca nos lábios de deus


Estavas tão cansada que esqueceste a minha mão de madrugada
poisada sobre a fúria noite em construção
desenhei-te na almofada silenciosa de uma cama de hotel
e os telhados de vidro choravam a tua partida
como eu meu amor
no indefinido sofrimento das palavras
escritas no teu corpo resgatado ao guarda-fato da insónia
os teus olhos sibilados pelos rios do prazer,

Estavas tão cansada
a minha mão de madrugada
nos lábios de deus
e no entanto
o teu sofrimento
percebi-o como percebo a tua ausência
cintilante que clareia nos quartos de hotel
das janelas com fotografias para a cidade adormecida,

Escrevo-te sabendo que a noite à lareira descerá dos livros sem palavras
como da tua boca os doces morangos da noite mal dormida
cinco minutos submersos no teu ventre de oiro poema das marés encantadas
escrevo-te
da tua boca
a almofada dos gemidos círios dos versos consumidos pelo fogo da paixão
o arbusto do sonho
nos teus olhos sibilados pelos rios do prazer.

(poema não revisto)

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Os gemidos da paixão


Linda
a paixão de cartão
enrolada no dedo tua mão,

De pétala
há pétala silenciosa sinfonia que o amor constrói
nas nuvens encostadas às árvores de papel,

Aos cansaços
linda
a paixão
tua pele
teus lábios
coração de mel
nos cortinados do amanhecer
enrolada no dedo tua mão,

Perco-me em ti
e dentro de ti
até encontrar o mar
o mar meu amor a paixão de cartão
enrolada no dedo tua mão,

(Linda
a paixão de cartão
enrolada no dedo tua mão)

Lindas
as folhas do teu corpo onde escrevo as palavras de amar
Lindo
meu amor
o desejo infinito que a luz desenha nos teus lábios
e pinta
no púbis tua mão
o dedo da paixão
a feliz paixão de cartão
quando recolhe a noite
aos aposentos da solidão
e ingenuamente geme em ti o coração da paixão...

(poema não revisto)

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Os jardins com flores de mármore


Digo-o porque assisti ao romper desmesurável das mãos entrelaçadas nas lanças de aço que profundamente entram no coração doirado do velho com óculos, oiço-lhe os gemidos cansados dos alforges doces sargaços que o mar desencontra nas tardes de solidão, digo-o e oiço-o, e às vezes apressadamente contra o muro da paixão, nunca soube, ele, que me tinha apaixonado e loucamente caminhava no arame que atravessava a rua deserta de palavras, ficticiamente adornada com oiro e cinza de olhos encarnados que os mendigos construíam com as migalhas de vidro, gostava dele, muito dele, digo-o enquanto lá fora chove, e a luz silenciosa da morte alicerça-se nas palavras escritas na ardósia extinta da infância,

não me ouvirás mais, doce pergaminho dos dias acorrentados aos negros e pasmados buracos que a noite transpira, digo-o, oiço-o, pensando que amanhã me sentarei no teu colo infinitamente débil dos versos traduzidos e semeados nas searas longínquas da saudade, e um dia perceberei que as estrelas são de papel, e as nuvens, no entanto, hoje, são de lágrimas janelas que a maldita cidade esconde nos jardins com flores de mármore, porque assisti ao romper desmesurável das mãos entrelaçadas de aço que profundamente entraram no teu coração de vidro frágil como a água dos rios antes de encontrarem o oceano,

gosto tanto de ti,

digo-o, oiço-te, loucamente percebias as minhas palavras, loucamente davas alegria às minhas loucuras clandestinas nas areias finas do Mussulo, gosto tanto de ti, e os meus machimbombos continuarão a saltitar de paragem em parem, de berma em berma, e de candeeiro em candeeiro, a morte desce do tecto da madrugada, cai sobriamente nas algibeiras das montras doiradas onde um louco vende poemas e sonhos, e inventa a amizade, e inventa a saudade, e as flores e as pedras e os socalcos,

gosto tanto de ti,

e os socalcos desaparecem nas fresta do velho NOGUEIRA, escrevo-te, hoje, como se amanhã todos os rostos de uma cidade perdida na escuridão fossem alegremente as palavras dos teus medos, anseios, e no entanto, no entanto, hoje, são de lágrimas janelas que a maldita cidade esconde nos jardins com flores de mármore,

gosto tanto de ti,

digo-o, oiço-o.

(texto não revisto)

Francisco Luís Fontinha
15-11-2012

A boca em silêncios de pedras loiras


Uma chuva de pedras loiras
sobre as sombras cansadas dos invisíveis olhares da noite
vais partir em direcção ao nada
manhã desgovernada
cansada triste a paixão das palavras tontas
na tua doce mão,

cansada chuva de pedras loiras
em direcção ao nada
madrugada dos pincéis alimentados pelos desenhos dos espelhos coloridos
perdidamente apaixonados
dentro do cubo de vidro
onde adormecem os teus olhos meus,

uma chuva
longa
tonta
deserta
na tua doce mão
a boca em silêncios de pedras loiras.

(poema não revisto)

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

A noite de ninguém


À via láctea da saudade
aporta a dor indesejada das veias mergulhadas na insónia
das palavras semeadas nas avenidas
ruas desertas
cansadas
das meninas
sem janelas para as andorinhas do silêncio eterno
quando dorme a cidade na tua mão de marinheiro sem porto nem barco nem destino,

sem dinheiro
à via láctea da saudade
a viagem para a outra distante margem
funda
imunda
nos cigarros inventados pelo louco jardineiro do amanhecer
quando dorme
sem janelas,

e sonha com o mar de pérolas desenhadas na areia
funda
imunda
a saudade
na partida
quando cessa o regresso
e todas as árvores
e todas as árvores tombam sobre a noite de ninguém...

(poema não revisto)

Em destaque - Cachimbo de Água


terça-feira, 13 de novembro de 2012

O muro da paixão


Escrevo-me na parede transparente dos teus lábios
silenciosamente cansados das palavras suspensas na janela da saudade
ouvem-se os murmúrios dos albatrozes
e a saliva do texto nu sobre a cama de cinzento vidro
a cidade fervilha nas distantes árvores de papel invisível
escrevo-me
na parede
dos teus lábios
transparente a noite que absorve os nossos corpos e tortura-os
nos gemidos dos sexos deitados no poema
escrevo-me
escrevo-me sempre que oiço a tua voz,

ao cair a noite sobre nós
descem da cidade
transeuntes apressadamente fingindo a felicidade
nas ardósias da tarde
oiço-me quando o espelho de chocolate
derrete nas tuas mãos incisivas
ao cair a noite dentro do quarto
sexta-feira abro-te e escrevo-me na saliva do texto
palavra por palavra
uivo entre os outros muitos uivos
das perdizes alienadas pelo cansaço da aldeia
escrevo-me nas tuas coxas que o homem da guitarra desenhou no muro da paixão,

escrevo-me
escrevo-me no gelo circunflexo do amor
às janelas de longe terminam o cais das sandálias de couro
ou os barcos no regresso a casa
em abraços
e pouca coisa nas mãos indefesas nefastas oleadas pelas marés dos rochedos
que a tua boca engole quando me aproximo da madrugada
escrevo-me no mar
e nas paredes da solidão
crescem as rosas vermelhas
de olhos verdes com luzinhas cintilantes nas pálpebras de aço
que o homem da guitarra desenhou no muro da paixão...

(poema não revisto)

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Falso amanhecer


O dissilábico falso amanhecer
à mão de papel
que a noite desencanta
uma rua deserta
pura
alimenta as fissuras de um coração
aos parêntesis desenhados nos teus olhos roubados pela noite
longe dos oceanos
barcos engasgados no purpuro cabelo do vento
a alma do falso amanhecer
à mão transversal das paredes do destino
deus na janela do prazer

e alicerça-se em ti a saudade
como as palavras
como os desenhos invisíveis que a noite come no veneno do teu sofrimento
pura
alimenta
as fissuras de um coração com sal e pimenta

coitado de mim tão frágil dentro dos lençóis da insónia
pura
a alicerça-se
como o poema
dentro de um quarto com fotografias de corsários
e piratas
governando
não governar
as vaginais cansadas madrugadas abraçadas ao infinito
desiludidas canções de engate
o Rossio sentado em mim
e sinto-me uma gaivota perdida nas mamas do dissilábico falso amanhecer

hoje não é sábado
e a livraria está encerrada
o bar paralelepípedo do desejo olha o Tejo
saltita entre as aranhas da cidade adentro
um longínquo gemido atravessa a parede da paixão
hoje não é sábado
e a livraria está encerrada
a farmácia dos sonhos
com os livros de sexta-feira na algibeira do domingo saudável
desgraçadamente
não é sábado
e nunca acordarão os extintos medos dos teus braços de mel.

(poema não revisto)

Em destaque - Cachimbo de Água


sem estrelas nem árvores apenas o mar e o rio


uma gaivota de sémen mergulha nos lençóis húmidos da madrugada
quando do clitóris desce o Rossio em direcção ao rio
das palavras
sento-me apaixonadamente no Jeronymo (Chiado)
e enrolo-me no café amargo que da mão da caneta de tinta permanente
escreve “para ti, com amor”...
e um silêncio de noite
entranha-se no novo livro de A. Lobo Antunes (Não É Meia Noite Quem Quer)
e eu quero
preciso urgentemente que seja sempre sábado
noite
sem estrelas
nem árvores
apenas o mar
e o rio
apenas tu
com amor
no poético corpo de gelo que a madrugada me oferece.

(poema não revisto)

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

O transeunte apaixonado


O imperfeito incrédulo transeunte emagrecido
nas pálpebras azuis do destino
podia acordar a alvorada
e escrever nas paredes cansadas
que as arcadas cadeiras sem focinho
constroem na insignificante janela do Outono
ai a cidade com um rio travestido de mar
e o mar
e o mar em engates na maré do silêncio
o amor é o amor
das palavras
e no corpo tua boca em soluços madrugadas,

o amor amar os barcos em sucata
pedacinhos de aço
nos lábios desejados das ranhuras frestas do granito jazigo literário
os poemas em festa
orgias
e danças de salão na cave do eléctrico para Belém
deixando a Ajuda nas águas transversais adormecidas das gargantas loucas
e eu procuro-te pensando nas árvores infinitas tuas mãos
abraças-me?
dar-me-ás um beijo invisível com sabor a chocolate?
abraças-me nas finíssimas argolas de papel suspensas no tecto da algibeira?
e as vacas do tio Serafim comeram toda a erva do meu caderno preto,

e dou-me conta que não estou louco
nem doente
estou apaixonado
feliz por ser amado
e é nos momentos que me apetece adormecer eternamente
que quero amar loucamente os cortinados loiros dos teus olhos encarnados
(O imperfeito incrédulo transeunte emagrecido
nas pálpebras azuis do destino
podia acordar a alvorada)
podia adormecer a noite
e todas as lâmpadas se extinguirem nas sombras da calçada
porque eu não me importo que chovam as palavras que a cidade transpira,

não me importo das vacas do tio Serafim
nem dos livros ainda não escritos
e dos poemas que apenas fazem parte do teu ventre lilás de sílaba acácia
que os dias mortos desenham na areia
não me importo da chuva
e do vento sem vento fingindo ser vento
porque a paixão come a erva do meu caderno preto
perco todas as palavras semeadas na Primavera
perco as gaivotas melancólicas do Tejo enjoado
também ele apaixonado
pelas pequenas flores que os barcos transportam
e deixam abandonadas no fundo oceano o desejo construído com os insectos...

(poema não revisto)

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Entre sílabas e palavras e silêncios madrugadas


O doce frio
emagrece o corpo embrulhado em desejo
fingindo-se de morto
e evapora-se nas frestas do olhar esverdeado
que o rio abraçado à janela
pinta nos lábios do poema,

é isto o amor
dois corpos
mergulhados no oceano de livros
é isto amar
caminhar sobre as nuvens
e sonhar,

amar a tua pele de cravo que Abril semeou
nas mãos de uma criança
quando dormia a cidade
amar o amor em doce frio
que o desejo consome dentro das estrelas azuis
e papeis ornamentais nas paredes do sofrimento,

acorda o cansaço
o doce frio
o abraço
que dos lábios crescem as noites infinitamente desencontradas
abraço-te
e desenho no teu doce frio corpo os uivos das madrugadas,

às vezes
as lágrimas de ti desaguam no meu rio inventado
não dou importância aos barcos sem motor
nem às flores sem cor
às vezes
às vezes disfarço-me de esqueleto com duzentos e seis ossos,

e fingindo-me de vivo
beijo-te loucamente sempre que posso
porque poucas vezes
às vezes fingindo-me de poema
deito a minha cabeça nos teus olhos
e adormeço entre sílabas e palavras e silêncios madrugadas...

(poema não revisto)

Francisco Luís Fontinha
Alijó, 07-11-2012
http://cachimbodeagua.blogs.sapo.ao/  


terça-feira, 6 de novembro de 2012

E será que me ouves?


Trazes de ti as chaves complexas da paixão
o vidro da madrugada nas árvores ou o amor
que submerso nas coxas do rio
o púbis equilátero do silêncio
na mão do espinho
à boca confusa da maçã
quando se desembaraça da gravidade
grave gravíssimo o planalto dos sonhos

e trazes de ti as chaves
da paixão e descem as gotinhas de desejo
na pele adensada de moluscos e fios de luz
quando da cidade choram as pontes
e todo o aço saudável
derrete na mão de deus
e dizes de ti em ti
os cansaços fictícios que os teus lábios desenham no leito dos amantes indefinidos

os ausentes
os oprimidos
os desgostosos dias de cimento
entre ventos e velas de mármore
em lápides
sem alimento
trazes de ti as chaves complexas da paixão
o vidro da madrugada nas árvores ou o amor

vem vêm vem ao destino marcado no xisto
vêm as águas preguiçosas do Outono
vêem-se águias e gaivotas e barcos
nas abelhas enferrujadas
vem vêm vem ao meu encontro
a tua língua sílaba doirada
em sol e da lua
à Primavera desejada...

E será que me ouves?

Francisco Luís Fontinha / 06-11-2012

(poema não revisto)

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

A paixão das árvores e silêncios parvos


Saborearei as luzes desejos que no teu corpo vivem
as estrelas de pétalas e sorrisos amargos
que eu transformo em silêncios parvos
saborearei os enjoou-os das palavras sem nome
sobes as escadas cansadas
em fome
a maldita alvorada
quando pela calada
te vêm buscar e desapareces entre as aspas do paragrafo sonolento
do texto escrito na porta de entrada da casa
da tua misera casa de ossos de pano
e janelas de papelão,

Desenhas flores nos muros que circundam as sandália de couro
do miúdo da aldeia empenhado no banco de jardim
alguns euros para o transporte desassossegado dos carris paralelamente
com abraços no infinito
dois homens com chapéu de palha e uma mão de cigarros embainhados nas madrastas hortas
das planícies orvalhadas das meninas de cabelo loiro
e olhos azuis fingindo alegrias e sílabas de seda
oiço-te das luzes desejos
saborearei nas tuas coxas os poemas construídos nos sonhos
quando o mar te entra em casa
e o teu ventre cinzento
se alicerça nos espinhos da morte...

(poema não revisto)

As finas lâmpadas de solidão


A circunferência das palavras gastas
nos voos invisíveis das gaivotas de aço
sobre o infinito mar de árvores
que a lentidão do vento alimenta
ouvem-se os sofridos olhos da lua
nos gemidos dele
o pássaro cansado do nocturno poema
sobre a mesa do café
homens cambaleiam cinicamente
contra os cortinados encarnados da dor
às lágrimas de sangue embaladas
nas finas lâmpadas de solidão.

(poema não revisto)

domingo, 4 de novembro de 2012

A ilha e a cidade e a infância perdida em mim


Inventas o medo nas cartas das palavras silêncios
sem perceberes que na tua boca vivem as sílabas do desejo
como a janela com vista sobre a cidade
quando cai a noite submersa na tua pele pergaminho

Inventas as mãos com que me acaricias
no regresso dos barcos do outro lado da cama
que a mesa-de-cabeceira derramou as flores sensíveis à luz dos teus olhos
inventas os sonhos
e os mármores e os granitos das paredes de vidro
quando cai a noite
submerso em ti o pergaminho azul da manhã depois do sexo se extinguir na neblina
que cobre as ardósia castanhas dos teus cabelos

Inventas-me e metade de mim é poema
inventas-me nas clarabóias que o mês de Janeiro desenhou no vento desassossegado
das roldanas engasgadas na ferrugem dos lábios do velho Armindo
sozinho
à minha espera
quando depois de me inventares
escreveres no céu nocturno de Lisboa
que o rio nunca existiu

(Inventas o medo nas cartas das palavras silêncios
sem perceberes que na tua boca vivem as sílabas do desejo
como a janela com vista sobre a cidade
quando cai a noite submersa na tua pele pergaminho)

Inventas o ciúme das palavras
que o meu corpo poema escreve nas sanzalas desgovernadas
que os machimbombos preguiçosos
comem as sombras das mangueiras
inventas o mar
e as areias brancas do Mussulo
e nunca esqueceste da cadeira onde me sento
inventaste a ilha e a cidade e a infância perdida em mim...

(poema não revisto)

Que novamente seja sábado


Gosto muito de ti Digo-o todas as manhãs quando percebo que o meu pequeníssimo cubículo de madeira não tem um espelho, e seria tão fácil para mim mulher de muitos ofícios construir um, adquiria o recipiente de plástico numa qualquer feira de aldeia e simplesmente água límpida da chuva, e sei que aparecerias com os lábios desenhados em beijos de amêndoa e com mil sorrisos de girassol, depois de eu escrever nas sílabas do tecto as palavras mágicas, e no entanto, a minha preguiça é mais forte que o meu desejo, e imagino-te sentado junto ao Tejo a desenhar flores nas sombras da noite, imagino-te junto ao Tejo a contar os barcos que entram, imagino-te junto ao Tejo a contar os barcos que saem, não falando nos que se afundam por falta de alimentos,

- As gaivotas dos teus seios quando o vento transporta as sementes dos silêncios cobertores que a alvorada come sem perceberes que do outro lado da rua há uma janela amarela com cortinados de papel com tons de acrílico, o mar vive na criança que choraminga ao acordar, na lâmpada de néon que não se cansa de acender, e não se cansa de navegar, e nunca se extingue na saliva do prazer,

Gosto muito de ti,

- Digo-o toda as manhãs antes de acordar, saltar solenemente da cama de cartão e olhar o espelho invisível que irei construir com a água límpida da chuva que irá descer do céu, um dia, uma qualquer hora sem destino marcado, as tuas mãos entranhar-se-ão no meu pescoço de malmequer e pedacinhos de mel, saborearei a tua língua de uva doirada na minha boca infinita que o xisto esmigalha nos arcos circunflexos da montanha ate que o rio entre no teu corpo e desapareças nas finas estrelas de silício,

Gosto muito de ti Digo-o todas as manhãs de sábado e saboreio a poesia mágica Moçambicana da antologia submersa na prateleira que os teus olhos de feiticeira iluminam, e hoje foi sábado, e hoje nenhum barco entrou, saiu ou se afundou, adormeci na cadeira da saudade sem me dar conta das palavras suspensas nos loiros cabelos do fim de tarde, o Tejo é assim, o Tejo é uma mulher em desejo e que dança ao som das garrafas de vodka de um qualquer bar plantado numa qualquer cave, sombria, húmida a terra doente onde deitas as mãos depois de acariciares as plantas que adornam a varanda sobre Lisboa,

- As tuas coxas de vidro

Gosto muito de ti,

- Na imensidão longínqua que o oceano engole nas madrugadas (e nunca se extingue na saliva do prazer) as coisas belas que o amor pinta na tela da simplicidade da arte abstracta, as tuas coxas de vidro nas manhãs bíblicas das orações da dona Arminda, os teus seios guardados escrupulosamente no interior de um livro de poemas (e como eu queria ser o livro de poemas de AL Berto onde guardo os teus seios gramaticais com rimas abraçadas às infinitas caravelas que o teu púbis absorve), e vi acordar a lua nos olhos cerrados dos peixes, das plantas, e dos animais vestidos de literatura,

Gosto

Muito

Gosto muito de ti antes que termine a noite e os dias se transformem em cinzas de azoto, gosto muito de ti sem me preocupar com as horas engasgadas do meu relógio de pulso cansado, que novamente seja sábado, e a antologia de poesia Moçambicana “Nunca mais é Sábado” se abra na tua mão de vidro, também de vidro, as tuas coxas,

- De ti.

(texto de ficção não revisto)