quinta-feira, 28 de setembro de 2023

Esconderijo do ódio

 Odeio-te no crepúsculo solar do dia

Odeio a tua voz

Os teus olhos

Odeio a tua boca

E as tuas mãos…

Odeio-te como sombra

Na palavra em sombra…

Odeio-te enquanto o dia

Não me traz a árvore do silêncio

Onde se esconde todo o ódio que te tenho…

 

 

28/09/2023

Livros meus

 Afasta-te de mim

Afasta-te da minha voz

E das minhas mãos

Afasta-te das minhas palavras

Das minhas noites…

E das minhas equações

Afasta-te do meu olhar

Afasta-te dos meus poemas

Os que escrevi

E os que irei escrever

Afasta-te do meu mar

E dos meus sonhos

Afasta-te da lua a crescer

E do luar

Poisado nos meus braços

Afasta-te dos meus beijos

E dos meus cansaços

E afasta-te dos meus livros

Que escondo nos meus abraços

 

 

 

28/09/2023

Espelho

 Despimo-nos em frente ao espelho da saudade

Erguemos as mãos às flores daquele jardim

Que transpira de alegria

Despimo-nos em frente ao mar

E não tenhamos medo da neblina

Que nos visita pela manhã

 

Despimo-nos em frente ao espelho da saudade

Tarde árdua em pequenas marés de engodo

Que morre pela boca

Que grita e se revolta

Despimo-nos então…

Contra a noite que não volta

 

 

28/09/2023

quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Solstício

 Meu pequeno solstício do desejo

Meu poema

Minha oração cansada

Quando deitada

Nesta cama

 

Sem perceber

Se um dia ao acordar

Também acordará a poesia

A mentira fictícia da ausência

Entre o sonho e o mar

Entre o mar

E o dia

 

E o dia em clemência

Pedindo

Ordenando que acorde também a noite

Quando um pedaço de tudo

Se ri de mim

E rindo

Também me rio também me amar

Do mar eu

Ao teu nosso mar

 

Meu pequeno solstício do desejo

Meu poema

Minha oração cansada

Quando deitada

Nesta cama

 

Dos livros nossos livros

Das nossas flores

Flores nossas mãos entrelaçadas

Ao lençol de neblina

Que cobre a tua pele

Do linho amargo ao silêncio-pastel

Deitado na tela

Deitado no teu ventre.

 

 

27/09/2023

Sonho desejar-te no sonho

 Sonho-te em constante amar-te desejo

Sonho-te inventando noites sem dormir

Sonho-te desejando-te desejar-te

Nos meus braços

Ao lado do meu livro de poemas,

 

Sonho-te em constante amor-beijo

Que brinca nos caniçais

Que brinca na tua sombra

De sonhar-te amar e amar desejando

Que também tu me sonhes,

 

Que também tu me desejes desejando

Que me sonhas

Que me desejas nos teus secretos sonhos

Sonho-te na vergonha do poema

Quando ele acredita que te sonha,

 

Que também ele te deseja tanto ou mais do que eu…

Sonhando-te

Desejando-te

Neste sonho em papel

Deste sonho mergulhado na ausência,

 

Sonho-te enquanto te sonho

Que te beijo

E desenho na tua boca

O silêncio nocturno dos pássaros sem nome…

Que te sonho tanto… que te sonho tanto e fico com fome.

 

 

27/09/2023

Purpurinas

 Escondes no olhar

As purpurinas palavras de escrever

Do silêncio da manhã sem poesia

Escondes na mão o mar

Que não se cansa de viver

Viver a cada dia,

 

Escondes no olhar

A alegria que acorda no amanhecer

Enquanto no teu cabelo de vento

Um pedaço de luar

Está desesperado e com medo de morrer…

Quando a morte é apenas um verbo sem tempo

 

E sem tempo de acontecer,

Escondes no olhar

A tristeza que avassala a sanzala com lábios de amar

Escondes no olhar o medo de viver

Junto ao rio que pincela o luar

Junto ao rio de amar…

Com o medo de tudo perder.

 

 

27/09/2023

terça-feira, 26 de setembro de 2023

Grito

 Eu aqui

Sentado

Preocupado com a vidinha

… e milhões de crianças

MORREM

Eu aqui sentado

Fumando

Bebendo

Bebendo o que fumo

E fumando o que bebo

O que não bebo

E o que já bebi

Escrevendo merdas

Lendo merdas de engenharia

E chateado

Quase em combustão

Eu aqui

Sentado

… e milhões de crianças

MORREM

Como se fossem um apagão

 

Uma fogueira em desordem

Um Deus que olha milhões de crianças que…

MORREM

E ele

Feliz

Como eu

Fumando

Bebendo

Bebendo o que fuma

E fumando o que bebe

O que não bebe

E o que já bebeu

Coitado de Deus

Coitado

Está velho

Como eu

 

Eu aqui

Sentado

Escrevendo de perna cruzada

Fumando

Bebendo

Olhando pela janela

E nada

Ninguém

Um tremor de terra

Ou uma explosão

Puro silêncio

Virgem

Como a lã

 

Aqui eu

Cá estou eu

Sentado

Escrevendo

Bebendo

Fumando…

… e milhões de crianças

MORREM

Desaparecem como mortalhas em dias de neblina

 

Sentado

Eu aqui

Por aí

Porque sim

Escrevendo

Lendo

Bebendo

E fumando

As palavras

Depois as letras

E finalmente

Enrolo toda a pontuação

E vou-me

Vou-me para S. Martinho do porto

Com a minha amada

 

Eu aqui

Sentado

Preocupado com a vidinha

… e milhões de crianças

MORREM

Eu aqui sentado

Fumando

Bebendo

Bebendo o que fumo

E fumando o que bebo

O que não bebo

E o que já bebi

E de todas as coisas visíveis e invisíveis

Ele acorda

Abre os olhos

Olha-me…

- Foda-se

Escrevendo

Pintando

Fumando

Desenhando o que pinto

Às vezes

Pintando o que bebo

E bebo

Tudo aquilo que escrevi…

(É com cada moca)

Coitado

Coitado dele

Está velho

A ficar doido

Sem cabelo

Coitado de Deus

Coitado

 

Preocupados com a vidinha

… e milhões de crianças

MORREM

 

 

26/09/2023