terça-feira, 28 de outubro de 2014

de trapos...


cínicas palavras de aventura
estas
que se suicidam nas árvores da madrugada
mendigas folhas em papel colorido esvoaçando sobre a cidade
estas
de ternura
encurraladas na negra sanzala
corpo crescente em rochedos húmidos
quando do cansaço acorda a gente
e na gente...
um punhado
de trapos...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 28 de Outubro de 2014

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Em círculos


Sem pressa de caminhar sobre as nefastas palavras de chorar
o fogo das tuas mãos que iluminam esta cabana de chita
o teu sorriso... impregnado no meu silêncio...
enquanto me recordo em frente ao espelho da solidão
sou um vadio navegante
deixei de saber como era
quem era
apenas recordo algumas das imagens
muito sombreadas
como uma nuvem de carvão
voando em direcção ao mar
sem rumo... sem... sem luar,
esta esplanada de incenso
que durante anos arde no meu peito
o odor da tua pele nas paredes em lágrimas
a janela amortalhada
quase a esquecer-se da minha existência...
permaneço neste barco
em círculos
em quadrados imperfeitos
gaguejando
às vezes
às vezes sem perceber porque o meu corpo se evapora ao anoitecer
sem rumo... sem... sem luar,
sem palavras para escrever...
sem pressa de caminhar
vivo e habito nos teus lábios prateados
vivo e habito nos teus seios... como desejos parvos
sem cigarros no tecto da insónia
vivo e habito
em círculos
em quadrados imperfeitos
em parábolas moribundas
e cansadas...
como eu
sem rumo... sem... sem luar!



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 27 de Outubro de 2014

domingo, 26 de outubro de 2014

O sonâmbulo diplomado


Habito este túnel íngreme dos ossos argamassados
pareço um sonâmbulo diplomado
sem braços
sem pernas...
sem... sem sonhos
habito esse teu corpo desgraçado
sobrevoando a minha sanzala
sombreando o pecado,
habito este túnel desgovernado
galgando as montanhas da solidão
gritando
gritando... “o amor é uma roda dentada com dentes enferrujados”,
ai estes sons que se entranham nas minhas asas de plátano envelhecido
este túnel sem luz
ou... saída para o infinito
habito
em ti
como se fosses uma gaivota poisado junto ao Tejo
me olhando
me dizendo... “o amor é uma roda dentada com dentes enferrujados”.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 26 de Outubro de 2014

As cordas da paixão


Esta seara de trigo
que ele deixou nos braços do vento
do cansaço construiu o sofrimento
e hoje vive no planalto da inocência
como uma sombra sem infância
dos palhaços voadores
viveu
e cresceu
na laminada sonolência que os fantasmas trazem ao peito
era um desajeitado poeta sem palavras
mendigo nas horas vagas...
esta seara de trigo onde habitam as húmidas mulheres de gesso,
perdeu-se numa calçada
a última vez que foi encontrado...
brincava
sonhava
dentro de um crocodilo de prata...
poeta desassossegado
poeta despedido das avenidas incendiadas
corpos em chamas
sexos murchos...
embriagados poemas...
e fotografou o amor no Tejo longínquo
como uma gafanha apaixonada,
esta seara onde te escondes
e desenhas
o meu sorriso envergonhado
olho a fotografia do Tejo longínquo...
não te reconheço
não sei quem és...
e o odor do teu corpo foi ancorado aos cais da despedida
um adeus ácido alicerçou-se nos meus cabelos...
veio a noite
e toda a aldeia sob uma podridão de gotículas inanimadas...
porque esta seara
não pertence às cordas da paixão.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 26 de Outubro de 2014

sábado, 25 de outubro de 2014

Vaguear na geometria de amar


Vagueias entre os lábios das andorinhas de papel
és uma planície desgovernada
que espera ser semeada...
com palavras
e beijos de pólen
vagueias nos disfarces da madrugada
ténue luz
janela encerrada,

Vagueias... com arte
vagueias na geometria complexa do meu olhar
esperamos o regressar da vertigem
há em ti o silêncio e a viagem
de vaguear sem destino
vagueias na metamorfose dos ossos de cristal
entre os barcos cansados de caminhar...
… e os homens embebidos nos poemas de chorar,

Vagueias no sexo inventado dos amores risíveis
trazes no peito a claridade da insónia
misturamos os dedos nas mãos que vagueiam as montanhas de sémen...
vagueias por vaguear
e sonhas com círculos suspensos no Céu
… e os homens embebidos nos poemas de chorar
que o poeta deixou na clareira amortalhada
que o poeta cessou depois da tua partida,

Vagueias miúda no cigarro incandescente
corres, corres... corres sem perceber que há no amanhecer fotografias tuas
calendários moribundos...
e relógios com mecanismos envenenados
vagueias nos alicerces da solidão
deitas a cabeça no meu peito
e em tristes suspiros...
finges que me amas... quando é impossível amarem este poeta de luz...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 25 de Outubro de 2014

"O Futuro Está Já ali" - Colectânea - vários Autores



Com a participação de Francisco Luís Fontinha - Alijó

Espelhos nocturnos...


O esboço atrapalhado das palavras incendiadas pelo teu coração,
a ilha afundada no centro geométrico do Oceano da escuridão,
os tímidos beijos engasgados na neblina falsa quando a manhã se masturba no teu olhar,
a confusão dos lábios quando há mãos fugitivas que acariciam o teu peito de anelar amanhecer,
fingir que...
… que existem flores no teu cabelo,
às horas adormecidas num triste calendário suspenso na parede da solidão...
e fogem,
e saltitam...
todas as madrugadas de desassossego,
o meu corpo se esquece de caminhar,
e arde,
o esboço na algibeira do cansaço,
o parvo pedreiro construindo muros invisíveis com sabor a paixão...
dos homens, dos silêncios embalsamados que transportam poemas,
poemas envenenados pelas tuas coxas de marfim prateado,
o esboço amor numa límpida árvore em pleno voo...
ao longe o mar..., só,
ao longe os azimutes do sexo alimentando espelhos nocturnos...
… que nem a própria noite aquece,
que nem os teus seios desejam,
perco-me na tua jangada de suor quando a tua pele de papel se deleita...
e uma estrada sem saída, e um carrossel de madeira em pequenas fatias de morte,
gritam eles...
“não temos sorte”,
e há uma casa que nos espera, e há uma casa vazia com pobres janelas...
não durmo, não leio o que escrevo,
por medo, por medo, por medo... dos espelhos nocturnos.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 25 de Outubro de 2014