domingo, 26 de outubro de 2014

As cordas da paixão


Esta seara de trigo
que ele deixou nos braços do vento
do cansaço construiu o sofrimento
e hoje vive no planalto da inocência
como uma sombra sem infância
dos palhaços voadores
viveu
e cresceu
na laminada sonolência que os fantasmas trazem ao peito
era um desajeitado poeta sem palavras
mendigo nas horas vagas...
esta seara de trigo onde habitam as húmidas mulheres de gesso,
perdeu-se numa calçada
a última vez que foi encontrado...
brincava
sonhava
dentro de um crocodilo de prata...
poeta desassossegado
poeta despedido das avenidas incendiadas
corpos em chamas
sexos murchos...
embriagados poemas...
e fotografou o amor no Tejo longínquo
como uma gafanha apaixonada,
esta seara onde te escondes
e desenhas
o meu sorriso envergonhado
olho a fotografia do Tejo longínquo...
não te reconheço
não sei quem és...
e o odor do teu corpo foi ancorado aos cais da despedida
um adeus ácido alicerçou-se nos meus cabelos...
veio a noite
e toda a aldeia sob uma podridão de gotículas inanimadas...
porque esta seara
não pertence às cordas da paixão.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 26 de Outubro de 2014

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