foto de: A&M ART and Photos
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hoje vi o mar estampado no silêncio da
alvorada tarde quando emagrecida pela solidão
dos alicerces nocturnos do medo
pensei em ti quando brincávamos nos
charcos pardos dos musseques em flor
imaginei-te hoje com uma carapaça de
filhos
imaginei-te hoje com uma cabeleira em
açafrão e vestidos de alecrim
e tu olhavas-me percebendo que era eu
não sendo eu
dizias-me baixinho
CRESCESTE...
cresci imaginado sorrisos nas janelas
da escola com vista para o recreio
parti vidros desajeitadamente com uma
bola de futebol
partiram-me a cabeça
despropositadamente apenas com o pretexto de no futuro...
… amo-te
(e não amavas
e não gostavas das palavras com sabor
a zinco das sanzalas de vidro...)
imaginei-te hoje voando sobre as
mangueiras dos quintais do Madame Berman
vi o triciclo encolhido junto ao antigo
pombal
vi as galinhas esperando o sonâmbulo
milho
como migalhas de sexo perdidas na
cinzenta voz da paixão
hoje vi o mar
e confesso que não gostei das imagens
estampadas no silêncio da alvorada tarde quando emagrecida pela
solidão dos alicerces nocturnos do medo
confesso que hoje tive medo quando
recordei o teu rosto e o vi impregnado numa lâmina de xisto
voraz forçosamente como pirilampos nos
buracos de uma parede de orgasmos voando sobre os pássaros
imaginei-te quebrando o gelo e as
pequenas pinceladas de suor que iluminavam o teu corpo
e os sais de prata dos teus olhos em
noites de viagem aos rochedos negros...
imaginei-te e percebi que sempre foste
de sombra
(e não amavas
e não gostavas das palavras com sabor
a zinco das sanzalas de vidro...)
CRESCESTE...
imaginando bocas de sémen nos lábios
da madrugada
e cresci acreditando que o mar era uma
ténue luz de linho bordada pela mão das cicatrizes manhãs de
cacimbo
cresci imaginando os barcos cruzarem os
corredores da inocência
sem apitos
marinheiros fecundos
homens vestidos de cozinheiros...
cozinheiros vestidos de homens com
gabardines em chocolate
e chapéus de chuva com sabor a
claridade cansada
imaginei-te crescendo no meu colo
olhando as marés do encarnado beijo
e percebemos que as cordas de nylon
eram filhas dos alicerces nocturnos do medo
(e não amavas
e não gostavas das palavras com sabor
a zinco das sanzalas de vidro...)
(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 7 de Novembro de 2013