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foto: A&M ART and Photos
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Não tenham pressa da minha presença, talvez um
dia, talvez, regresse, talvez, um dia, decida levantar voo e andar, e
andar, até encontrar o planalto das rochas encarnadas, não, pressa
não, porque um dia, eu, regressarei dos finos cortinados de espuma,
uma camisa furtada do estendal da vizinha Amélia,
as calças, são do cigano Mário Zé, especialista em auto-rádios e
carros de pequena cilindrada, e eu, desiludida, contigo, comigo,
connosco, e os velhos sapatos pertenciam ao primo Justino,
A cabeça balança entre as mãos frígidas dos
lilases argumentos sem palavras de amor, palavras de dor, ou
não às palavras,
Havia dentro de nós circos, roulotes e
malabaristas, o meu pai era trapezista e a minha mãe, entre os
intervalos de bailarina esfomeada, tinha um pequeno número de
ilusionismo, e
nunca me esqueci do sucesso número dela, quando me
colocava dentro de uma caixa de cartão, batia as palmas, e eu
Desapareceste da minha vida naquela fatídica manhã
de Sábado junto ao Tejo acabado de assassinar-se, os motivos, ainda
hoje desconhecidos, morte incógnita, mas presente entre nós, e tu
Eu desaparecia, ela abria cuidadosamente a caixa de
cartão, remexia, remexia, virava de um lado, mostrava o outro, e o
rapaz
Desapareceu de casa de seus pais, digo, desapareceu
da roulote onde vivia com os seus pais um rapaz do sexo masculino,
cerca de seis anos de idade, cabelo castanho e olhos verdes, vestia
calções e uma camisola antiquada, calçava umas velhas sandálias
de couro, e levava na mão esquerda, sim, penso que sim, espere, não
sei, quase que tenho a certeza, e levava não mão esquerda um cavalo
cavalo?
Perdão, um caderno de capa ondulada e escuro, sem
imagens, apenas com palavras semeadas numa tarde de vento quando os
bancos de jardim ainda tinham ripas de madeira, não podres, ripas de
madeira a sério, e já agora pergunto-me – Onde raio fui eu buscar
o cavalo? - há cada coisa, em cada hora, a cada momento, numa rua
deserta da cidade, uma feira de velharias, uma boina de um soldado da
EX-URSS, compro, não compro, pensei
deve ter piolhos,
Não comprei, depois, mostraram-me os cachimbos,
compro, não compro, não comprei
lembrei-me da quantidade de saliva – Do tipo... um
milímetro por segundo! - desisti
Pensei,
Vou comprar um livro,
que livro – Que tipo de livro deseja? - respondi,
talvez de AL Berto
Ela, Como? Quem?
pensei, que raio, nem ela conhece o AL Berto...
Desisto, desisto, e desisti, hoje sou feliz,
finalmente apareci dentro de uma das caixas de cartão que a minha
mãe fez um dia, num lindo espectáculo, desaparecer, cresci algures,
e o meu pai hoje não trapezista, reformou-se e vive desafogadamente
com uma linda reforma da Caixa, não, não aquela de cartão onde a
minha mãe me fez desaparecer, é a outra caixa, e a minha mãe,
hoje, abre a janela da roulote e conta o número de comboios machos
que passam em frente à árvore dos telhados bolorentos, porque os
comboios fêmeas, ela, deixa-as seguir, sossegadamente, como se
fossem o vento numa noite de cavalos...
cavalos?
Quais cavalos, menino?
Uma tarde, numa linda tarde, estava eu com uma das
mãos prisioneira de uma das barras de ferro do portão de entrada, o
quintal era enorme, tinha mangueiras, e ao fundo, nas traseiras da
casa, havia um galinheiro, tínhamos galinhas, patos e pombas, às
vezes, passeava-se por lá um velho triciclo, outras, escondia-se
debaixo da sombra, e, e nessa linda tarde, repentinamente e no
intervalo entre o depois do lanche e a chegada do meu avô, vi passar
em frente a mim...
Como não sabe quem foi o poeta AL Berto?
Uma menina vestida de branco, montando um lindíssimo
cavalo branco,
Tem ao menos alguma coisa do Pacheco?
ele, o cavalo olhou-me, e desde então, pertence-me,
e anda dentro de mim até que um dia
Qual Pacheco? O Luiz, minha senhora, o Luiz,
que não, não sabe dessas coisas, ora agora..., um
cavalo
Qual cavalo, menino?
(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha