quarta-feira, 1 de maio de 2013

Os cadernos de nós

foto: A&M ART and Photos

As cerejas de Deus que nos teus lábios comem as minhas palavras
que das tuas mãos Deus colocou sobre o meu rosto de pergaminho
as sílabas transparentes dos degraus impossíveis de transpor
pelos teus sonhos em silêncios azuis
como as pétalas da rosa esquecida no muro em frente à tua alegre casa,

Tínhamos um telhado
onde nos escondíamos nas tardes de solidão
e depois de alicerçares nos teus braços os cadernos de nós
ficávamos assim livres a olhar as nuvens
e a inventar histórias que um jornal de província nos comprava,

Tínhamos dinheiro para o pão
e para comprarmos novos cadernos
tinta
e às vezes
sobrava-nos algumas moedas para fingirmos que fumávamos flores enroladas em marés de Inverno,

Víamos os barcos a morrer como gente desesperada
cansada de trabalhar
cansada... de viver
as cerejas de Deus... comem as minhas palavras
e deixam os caroços sobre a terra semeada,

Víamos os barcos em círculo na janela da solidão
barcos que escreviam histórias
nos corpos amarrotados como o papel higiénico da pastelaria
entre migalhas de torradas e o cheiro a chá de hortelã...
vivíamos felizes sem percebermos que éramos miseráveis.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

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