quarta-feira, 6 de maio de 2015

Um corpo sem corpo


Terá Deus incumbido à palavra

Para me atormentar

A qualquer hora

Do dia

Da noite

Na esperança…

 

Saberá Deus o significado

Da derrota

E da tristeza?

 

A maldita noite

Que cresce nos subúrbios do silêncio

E se alimenta de uma cidade em ruínas

O livro não escrito

Na prateleira do sofrimento

E sem beleza

Sem… sem desenhos do cansaço

Estampados no rosto

Em pergaminhos beijos

E da tristeza

Da derrota

Quando vem a tempestade,

 

E o mar se deita

Na melódica cidade

Sem o saber

Troca abraços

Por sombras

E sombras

Por uma viagem

Anónima,

 

Sem

Regresso

Nunca

Porque nunca habitará um corpo no meu corpo sem corpo.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 6 de Maio de 2015

terça-feira, 5 de maio de 2015

Horas


Há horas para tudo

Meu querido

Há horas para brincar

Horas para sonhar

Há horas para acordar

Comer

Ou foder

Há horas para dormir

E horas para partir

Há horas

Meu querido

Há horas para morrer…

E sorrir.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 5 de Maio de 2015

domingo, 3 de maio de 2015

As cavernas de incenso


Não me ouves

Caminhas desorientadamente

Entre

O silêncio e a espada da morte

Lá fora vivem as sombras do teu cabelo

E a maré dos teus seios

Não invento amores

Nem paixões

Escrevo-as sobre as lápides madrugadas junto ao Tejo

O cheiro

Teu

O teu cheiro envenenado pela solidão

Das palavras

E dos olhares de vidro

Os charros fumados

Sem sabermos que amanhã

Segunda-feira

Nada para fazermos

Ou lemos

Ou desenhamos

Ou…

Ou construímos cavernas de incenso

Nas pinceladas nuvens do amanhecer

As palavras

Que nunca tive oportunidade de te dizer

Não o quero

Fazer

Ou…

Ou escrever…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 3 de Maio de 15

O último olhar


O medo

Encarnado esqueleto esquecido dentro de um livro

As palavras voando em direcção ao rio

E Deus

A incógnita gaguejante dos sentidos desenhos em teu corpo

Nua

Despida

Apetecível

Como são as flores pela madrugada

Em despedida

A maré dos aflitos

Congelada sobre a toalha em linho

Adeus

Adeus corações de sangue

Com odor

A

Nada


Ele

Ela

Ele

A casa em chamas

O teu corpo mergulhado no meu corpo

Dois

Dias

Minutos

Segundos

Dois corpos inseminados pelo desejo

Percebia no teu olhar

O meu último olhar

Parvo

Eu

Sempre

Dias

Minutos

Segundos

O relógio galgando os teus seios

A espingarda

Sémen

Corpos

Dois

Madrugada

Sem madrugada

Amanhã

A

Nada


Ele

Ela

Ele

A casa em chamas

Como o teu púbis travestido…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 3 de Maio de 2015

sábado, 2 de maio de 2015

O amor entre parêntesis no Rossio


Ouvíamos os tímidos limites da solidão

Como se eles pertencessem aos adormecidos fantasmas

Dos telhados de vidro

Não existiam janelas no teu peito

Nem sol no teu cabelo

Não havia um único rochedo de lágrimas

Que nos abraçasse sem querer nada em troca

Fomos engolidos pela paixão

Como são engolidos todos os pássaros

Pelas ingrimes tempestades de areia

O tecto deslizava encosta abaixo

Sentados na sombra

Trocávamos beijos

Por palavras

E palavras

Por nada

Nem ninguém

Em nossa casa

Vazia

E só

Regressávamos e apenas uma ténue luz nos esperava

De língua afiada

Lambia-nos envergonhadamente

Como quem desenha telegramas

Nos muros de xisto da paixão

O amor entre parêntesis no Rossio

O ponto de interrogação

(que tem o ponto de interrogação, meu amor?)

O ponto de interrogação massacrado pelas amarras do abismo

E mesmo assim

Queríamos voar…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 2 de Maio de 2015

sexta-feira, 1 de maio de 2015

Pérfidos orgasmos de prata


“Mãe, as pedras falam?

Um dia, um dia… meu filho!”

 

O silêncio adormecia em ti

Como adormecem todas as tristezas

Dos dias insignificantes

Entre poesia

E viagens ao desconhecido

Tínhamos todas as imagens do sono

Habitava em nós o cansaço

E a solidão da noite

Ouvíamos o ranger da janela

Em pérfidos orgasmos de prata

O silêncio das coisas inacessíveis

O sexo desacreditado

Numa cama de um qualquer hospital

As lágrimas

Nas janelas

Para…

O mar, mãe?

Um dia, um dia… meu filho!

No poço da penumbra

Os teus braços engasgados no medo

O amor

Quando inventado na madrugada de papel

E deixamos perder o luar

Amanhã, mãe, amanhã as pedras falam?

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 1 de Maio de 2015

quinta-feira, 30 de abril de 2015

Das minhas tristes palavras…


O significado da paixão

De todas as noites


Encerrado entre cinco paredes

Um pavimento

E tecto

Aluga-se

Meu amor

Barato

Farto das palavras

E do sindicato

Todos os Domingos

Feriados…

E… Domingos

Lembro-me de ti

Meu amor

Da carroça de bois

Penhorada ao silêncio

Das ervas

E

Dos cheiros

A morte alimenta-me

Sinto-a perto de mim

Como sentia o cheiro a “puta”

Quando…

Lisboa

Cais do Sodré

Fome

Não fome

E literatura

Farto-me

De ti

De mim

E deles

O significado da paixão

Pintado na parede da solidão

As palavras reduzias ao pó da insónia

Cresce

A

Noite

Em ti

Meu amor

Das palavras

E palavras

Limitada

Angola à vista

Apenas no mapa da infância

Meu amor

As sílabas apaixonadas do teu corpo

No meu corpo

O inferno

A chuva

Outra vez…

A paixão

O ódio das tristes tardes no jardim

Outra vez o jardim

E o beijo

Outra vez a vida

E o desejo

Em ti

Das minhas tristes palavras…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 30 de Abril de 2015

quarta-feira, 29 de abril de 2015

O covarde


Viajo nas tuas mãos

Andorinha selvagem

Sem poiso

Agreste

Na sombra da viagem

Peço-te o beijo da despedida

Não o queres

E rejeita-lo como se fosse uma faca de sangue

No corpo da paixão

Ignoro a tua ausência

Não percebo porque existem ruas desertas

Mulheres

Mulheres sem nome

Galgando a penumbra madrugada

Sem sossego

Sem

Sem nada

Viajo dentro de ti

À boleia do desejo

A sagrada noite vestida de lentidão

Sem

Sem nada

Amanhece

Cresces entre os desassossegos da liberdade

Trocas o beijo prometido

Por

Ausência

Falta de tempo

Porque amanhã

Tenho de trabalhar…

E eu

E eu amanhã tenho de escrever-te

Dizer-te

Dizer-te o que nunca tive coragem de o dizer

(covarde)

Eu sei

Sempre o fui

E sempre o serei…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 29 de Abril de 2015

terça-feira, 28 de abril de 2015


Sabíamos que o tecto da saudade

Deslizava sobre o silêncio da morte

O homem acabava de pertencer…

… de pertencer à solidão

Havia na madrugada

Panfletos de insónia

Voando contra o luar

Amanhã saberei porque morrem os pássaros

E as abelhas do inferno

Como nascem as lágrimas no teu sorriso

Sabíamos que o tecto

Morto

Salivando barcos a vapor

E pequenas marés de enxofre

E sabíamos

E não conseguimos acordar…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 28 de Abril de 2015

domingo, 26 de abril de 2015

O espelho


Esta vida em crescentes cansaços

a pele iluminada na ira do vulcão

como sempre

esboçando nos tentáculos orgasmos dos homens

este amor

meu amor

um computador

novo

(ao menos

enquanto estiver com ele

não penso em ti...)

como quando desenho noites

nos teus lábios

no espelho da cidade que nunca sorri...

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 26 de Abril de 2015