sábado, 3 de maio de 2014

poema de ninguém

foto de: A&M ART and Photos

embainhas-te no meu corpo como uma bala perdida
há na tua mão a espingarda do desejo
oiço entre as sombras e os sons metálicos
pigmentos do teu olhar envidraçado na cidade do feitiço
às tuas pálpebras de pergaminho
vêm a mim as insignificantes flores da paixão
das tuas palavras
as lágrimas da solidão
sem medo
rompem a montanha das árvores de papel
há luz na cabana
e uma cama que nos espera...

(estarás vivo, meu poema de ninguém!)

há dentro de ti uma janela
um telheiro com odores de Carvalhais
um velho espigueiro aproxima-se do teu coração
e entre as frestas das ripas em madeira cansada...
os teus beijos
como nuvens de espuma
saltando
e brincando na eira
cruzo os braços
e espero o regresso do paquete teu corpo
há âncoras de sémen nas palavras da madrugada
e uma flor deita-se nos teus seios de silêncio.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 3 de Maio de 2014

sexta-feira, 2 de maio de 2014

meu amor madrugada


esta prisão que me mata
quando há no teu olhar lacrimejados beijos
grandes em papel
janelas infinitas com sombras de rímel
esta vida de chapa
esta vida que dói e corre calçada abaixo
e sob o teu corpo
a minha mão disfarçada de amanhecer

esta prisão...
este medo de amar e morrer
morrer e amado pelos poemas de escrever
grades
corpo
relógios melancólicos quando tu me abraças
e me dizes...
“Adeus”... meu amor madrugada.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 2 de Maio de 2014

quinta-feira, 1 de maio de 2014

anónimo no meu peito

foto de: A&M ART and Photos
não o sei
às vezes desce sobre mim a voz do silêncio
o rio com mãos de porcelana
acorda
deita-se na nossa cama
chora...
olha-se ao espelho e grita
não o sei
e às vezes
pergunto-me porque há barcos em papel com coloridas manhãs de Primavera
e às vezes
não o sei

os sonhos sonhados quando a noite deixa de nos pertencer
as palavras escritas amadas e desamadas
e o palheiro da madrugada invadido pelos odores do jardim anónimo
não o sei
acorda
e às vezes
tantas vezes... meu Deus
percebo que há andorinhas com fome
e fome vestida de gaivotas
chora...
não o sei
porque vives escondida no meu peito.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 1 de Maio de 2014

madrugadas de azoto


não queiras ser como eu
não o desejes sabendo que o desejar não existe
é um fantasma vestido de saudade
é uma estrela embrulhada em madrugadas de azoto
como os nossos braços
abraçados à árvore do desgosto

não tenhas medo do vazio
dos buracos negros que existem no teu corpo
não o queiras
desiste
viaja para o cimo da montanha
e acredita no Luar

não chores
não adormeças...
não queiras ser como eu
um baobá esquecido no cacimbo
um cigarro imaginário em pedaços de suor sobre a tua pele de cortinado amanhecer
não não queiras ser como eu... um desejo com sabor a envelhecer.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 1 de Maio de 2014

quarta-feira, 30 de abril de 2014

cigarros do nada


havia em ti pérolas de naftalina
eu pensava que o mar era só meu
e o egoísmo alimentava-me e fazia com que as minhas asas de amanhecer...
ardessem
como o cigarro que fumo e suspenso na janela com vista para os patamares do Douro
o rio entranhava-se em pedacinhos de dor
sofrimento
e algumas lágrimas invisíveis... poucas... voavam como gaivotas sem nome
descubro o amor numa solitária videira
a paixão numa triste pedra em granito... perdida na rua
à espera do silêncio na esquina sem transeuntes
e oiço as palmeiras com sombras de doirado anoitecer.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 30 de Abril de 2014