terça-feira, 24 de janeiro de 2012


84,1 x 59,4 – Francisco Luís Fontinha

Ai o amor

Uma duas três… quatro gaivotas suspensas no teto da minha sala,
- O quê? Estás bêbado sussurra-me uma voz de papagaio que julgo vir do cortinado da janela da sala sem vista para o mar,
E pergunto-me o que fazem quatro gaivotas suspensas no teto da minha sala e ninguém e ninguém responde, como sempre, nunca ninguém responde às minhas inquietações,
- Precisas de um psiquiatra,
E eu preciso é de uma psicóloga que perceba
- Gaivotas Francisco?
Que sou perfeitamente normal como os plátanos do jardim, tive sonhos, adormeço e acordo, amo,
- Ai o amor…
E fui criança e fui menino e brinquei de papagaio de papel na mão à volta das mangueiras,
Uma caixa de sapatos com paredes de vidro e uma tampa encarnada de onde descem beijos amestrados e tartarugas marrecas, ai o amor… o amor é fodido segundo Miguel Esteves Cardoso, para mim, o amor é uma caixa de sapatos cheia de neve que há muitos anos um menino parvalhão revolveu atulhar até ao teto encarnado,
- Precisas de uma psicóloga meu rapaz,
E preciso
- Gaivotas Francisco?
Preciso urgentemente de um médico legista que faça do meu corpo a praia do Mussulo, preciso urgentemente de um médico legista que desenhe barcos e petroleiros e putas em Cais de Sodré no meu corpo, preciso
- Entro no Texas e as putas amam-me Sempre me amaram as putas da noite e os paneleiros dos jardins de Belém,
Preciso Eu preciso de fazer alguma coisa para que a minha vida deixe de ser uma merda, quarenta e seis anos, desempregado, quase sem abrigo, sem futuro segundo a minha mãezinha,
- E o que será de ti desgraçado depois de eu morrer,
Entro no Texas e as putas amam-me e as putas gostam de poesia, sentava-me e fazia versos nos lábios de meninas adolescentes,
- Ai o amor…
O Miguel que é fodido e eu uma caixa de sapatos com teto encarnado,
- E preciso urgentemente de uma psicóloga, preciso de uma psicóloga que analise os meus desenhos, E desde que uma me mandou desenhar uma árvores e como resposta e como resposta
Que eu estava apaixonado
Está loucamente apaixonado, foda-se pensei eu, o que tem o desenho de uma árvore para estar apaixonado?,
E estava e desde essa data fiquei com raiva aos psicólogos porque através de desenhos conseguem desvendar os nossos segredos,
Quatro gaivotas suspensas no teto da minha sala, Porquê Caralho?,
- O quê? Estás bêbado sussurra-me uma voz de papagaio que julgo vir do cortinado da janela da sala sem vista para o mar, e pareço a Cristina da Comissão das lágrimas de António Lobo Antunes com as malditas vozes na cabeça,
- Porquê Cristina? Questiona-me o Lobo Antunes e confesso que não sei, e confesso que nunca vivi em Luanda, e confesso que nunca vivi na Vila Alice nem no Bairro Madame Berman, tudo mentira senhor António Lobo Antunes, tudo mentira,
Tão pouco sei onde fica Angola,
- Mas estas vozes,
E preciso urgentemente de um médico legista que do meu corpo construa um papagaio de papel para brincar nos céus de Luanda,
- Porquê Cristina? Questiona-me o Lobo Antunes e confesso que não sei, Não sei… mas que estão quatro gaivotas suspensas no teto da minha sala lá isso estão,
Estás bêbado sussurra-me uma voz de papagaio que julgo vir do cortinado da janela da sala sem vista para o mar, e as putas do Texas amavam-me, e os barcos do Tejo amavam-me, e as gaivotas do Tejo amavam-me, e os paneleiros de Belém
- Verdade senhor António Lobo Antunes… por favor não me torture mais, verdade que nunca vivi em Luanda nem na Vila Alice nem no Bairro Madame Berman, juro por deus que nunca acreditei,
Que as putas do Texas me amassem, que os barcos do Tejo me amassem, que as gaivotas me amassem, porque nunca fui amado e porque nunca vivi em Luanda,
- Ai Cristina As malditas vozes,
E quer lá saber o António Lobo Antunes de um gajo que acredita que tem quatro gaivotas suspensas no teto da sala, e quer lá saber o António Lobo Antunes de um gajo que acredita ter vivido em Luanda, que diz ter brincado na Vila Alice e no Bairro Madame Berman,
. Tudo mentira Cristina, Tudo mentira,
E quer lá saber o António Lobo Antunes de um gajo que diz
- Preciso urgentemente de um médico legista,
Ter brincado no mar do Mussulo,
O Miguel que é fodido e eu que é uma caixa de sapatos com teto encarnado, e estranho, nunca perguntei ao António Lobo Antunes o que é para ele o amor…
- O que é para ti o amor Cristina O Lobo Antunes enquanto folheia a comissão das lágrimas.
Ai o amor, quarenta e seis anos, desempregado e sem futuro e uma psicóloga que afirma que eu estou loucamente apaixonado… porque desenhei a puta de uma árvores sentada no banquinho do Texas e nos lábios de adolescentes escrevi versos que nunca ninguém leu, versos que ninguém lê, e que os paneleiros dos jardins de Belém adoravam em noites de lua cheia.
O que é para ti o amor António?

(texto de ficção)

Francisco Luís Fontinha

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

A carta de Amor

Há coisas que nunca devem ser feitas na vida,
Não me refiro à noite em que me passei da cabeça e queimei a grande parte dos meus desenhos e textos e poemas numa lareira do Bairro do Hospital quando tinha vinte e poucos anos e mais tarde percebi que Nikolai Gógol tinha feito o mesmo com “Almas mortas”,
Mas refiro-me a uma carta de amor E já sinto nas vossas cabecinhas a pergunta pertinente Porquê uma carta de amor?,
Porque numa noite de copos na Ajuda onde seis marialvas bebiam e comiam, incluindo eu, um dos presentes, bom rapaz e muito honesto e muito simples e coitado… que carregava nos ombros uma história de abandono por parte da mãe e um pai todos os dias embriagado com uma ninhada de irmãos, e de instrução quase nenhuma porque abandonou a primária nos primeiros anos para ganhar para a casa
- Porquê uma carta de amor?,
Para ganhar para a casa as letras para ele pareciam os carris da linha férrea Pinhão-Régua em assobios dentro dos socalcos do Douro, e com ele guardava religiosamente uma carta da namorada que tinha chegado nessa tarde, e pensava ele que dos cinco eu era o que tinha mais juízo, e juro que quando me olhava ao espelho acreditava ser um menino de igreja que depois da solene deixou de frequentar, não incluindo as faltas à catequese da Benigna, mas adiante, pede-me
- Podes ler-me esta carta se fazes favor E eu cá para mim Já te lixaste,
Pede-me e já a carta poisava nos seios da minha mão, começo silenciosamente a despi-la e aos poucos pela janela do envelope começam a acordar corações desenhados a marcador encarnado e a palavra Amo-te a todo o comprimento do lençol e milhões de beijos,
- Na Ajuda onde seis marialvas bebiam e comiam,
E amor eterno até que a morte Até que a morte nos separe,
- Então Fontinha o que diz?,
Respondo-lhe que era melhor ele não saber, Porque eu precisava de tempo para inventar uma estória, e fazendo o papel de leitor de uma carta de amor disse-lhe os maiores disparates incluindo o fim do namoro e ao cair do pano um par de cornos, e claro que nada daquilo existia na carta, mas ele acreditou,
- Não chores pá Gajas há muitas Dizia-lhe um dos marialvas,
E chorava e chorava e chorava,
E foi muito difícil convencê-lo que tudo não passava de uma brincadeira de cinco gajos que bebiam e comiam… e estavam fartos das noites da Ajuda,
- Então Fontinha o que diz?,
Que há coisas que nunca devem ser feitas na vida, uma delas, gozar com os sentimentos dos outros…


Francisco Luís Fontinha

23 de janeiro

E que pegasses na minha mão e me levasses a ver o mar e com os teus lábios escrevesses nos meus lábios
- Amo-te e estou apaixonada por ti,
Escrevesses nos meus lábios o encanto da noite quando todas as luzes dormem, quando todos os barcos sonham, quando todos os pássaros voam,
E era tudo o que eu queria ouvir de ti, Hoje.

23/01/2012
Francisco

domingo, 22 de janeiro de 2012

Versos a um amor impossível

Um dia enquanto urinava num urinol público de Belém, junto à esplanada onde me estacionava nos finais de tarde a olhar o tejo, a comer bolas de Berlim, a beber café e água sem gás, a ler e a escrever versos a um amor impossível (porque nos finais dos anos 80 acreditava existirem amores impossíveis, e com o andamento da roda da vida percebi que a impossibilidade só existe na nossa cabeça), lembro-me como se fosse hoje, na altura andava a ler “Doutor Jivago” de Boris Pasternak, prémio nobel da literatura em 1958 e impossibilitado de o receber por razões políticas, e tal como os amores impossíveis, as coisas mudam, e hoje seria diferente,
E enquanto apreciava o meu rosto impresso nos azulejos da casa de banho pública de Belém percebo pela sombra que alguém ao meu lado direito olhava o meu coiso, e claro que na altura era normal por aqueles lados, mas eu ficava sempre chateado porque a jogar ao montinho na arrecadação do Moreira não tinha a mesma sorte, isto é, de seis montes eu parvalhão escolhia sempre o monte de menor valor, e o Moreira
- Já te fodeste,
E se eu tivesse tanta sorte ao montinho como tinha para ser atraído por panascas, acreditem que hoje tinha, não diria um mercedes, mas que hoje tinha uma lambreta, e não é mentira nenhuma,
E o Moreira sempre com uma sorte do caraças a arrebanhar moedas e a assar chouriços roubados na cozinha, e quando numa noite apagava as labaredas da cama porque o álcool onde púnhamos o chouriço a laminar saltou e ficou-se a dormir como um anjo barrigudo Diz-me
- Sorte ao jogo Azar ao amor,
Diz-me E eu fodido sem moedas e eu fodido com um gajo de meia-idade a olha para o meu coiso que de tanto envergonhado começou a diminuir até desaparecer no tejo,
E eu na altura confesso Nem sorte ao jogo Nem sorte com amores impossíveis Mas tinha uma pontaria para ser assediado por panascas, e procurei e procurei e procurei…
- Coiso nenhum E só mais tarde percebi que já andava em banhos no tejo, e quando olho o senhor de meia-idade, feio e sem dentes, com óculos de fundo de garrafa e ainda por cima com bigode de piaçaba de desagarrar merda das sanitas Confesso que me assustei e não condeno o meu coiso por ter dado de frosques e ir a banhos para o tejo,
E hoje podia ter no mínimo uma lambreta
- Já te fodeste,
No mínimo uma lambreta, mas quis o destino que não, e hoje desse tempo tenho meia dúzia de fotografias e três caixas de cartão com versos a um amor impossível, escritos numa esplanada de Belém junto a uma casa de banho pública onde numa tarde de agosto um senhor de meia-idade engraçou com o meu coiso,
- Sorte ao jogo Azar ao amor,
E os chouriços até que se comiam embrulhados em cerveja.

(texto de ficção, inspirado na minha passagem por Belém – Maio de 87 / Agosto de 88)

59,4 x 84,1 – Francisco Luís Fontinha

O jeitoso engomado

O jeitoso engomado encosta-se ao parapeito do vento, pesca um cigarro entre os destroços da algibeira e acende-o com a lente dos óculos, a princípio gotinhas de fumo dispersam-se pelas marés ruivas da tarde, depois, gargalhadas de fumo contra os uivos fabricados no sótão do prédio em frente,
- Ai Ui Foi tão bom,
O cigarro incha e cresce na boca dele como se fosse uma barra metálica ou um pénis argamassado entre o beiral e a clavícula do mendigo sentado no passeio a pedir esmola queixando-se que a reforma não chega para viver, o pénis furiosíssimo
- Não chega? E eu quase sempre teso,
Furiosíssima a clavícula pendura-se na cabeça do mendigo e o jeitoso com voz de malmequer,
- A menina dança?
E que não Não sei dançar responde-lhe a menina,
- Ai Ui Foi tão bom,
O jeitoso engomado pega nos restos mortais do cigarro e entrega-os ao senhor proprietário da funerária onde num pedaço de cartão pendurado sobre a entrada podia ler-se “FASEMOS INTERROS SEM FATORA”, combinam o preço e o jeitoso engomado ao sair do estabelecimento comercial manda foder o mendigo e diz para a clavícula
- Foi tão bom,
E diz para a clavícula Hoje foi um dia de merda, e em passos clandestinos desce a calçada em direção ao rio.

(texto de ficção)

sábado, 21 de janeiro de 2012

Cachimbos



Tenho cachimbos
Para dar e vender
E pena minha
Não servirem os cachimbos para comer

Tenho cachimbos em madeira
E de espuma do mar
E se os cachimbos dessem para comer
Não precisava eu de mendigar

Tenho cachimbos
Para fumar
E cachimbos para acariciar
Para dar e vender
E pena minha
Não servirem os cachimbos para comer

Hoje

Hoje
Sou um velho onde cessaram os sonhos
Hoje
Sou um velho que deixou de acreditar
E ter esperança
Hoje
Sou um velho que inventa oceanos
E desenha barcos de papel e petroleiros de papel
Nas asas de gaivotas invisíveis
E hoje esqueço-me onde nasci
Tão pouco sei se nasci
Mas lembro-me do mar pintado nas minhas costas
Quando me suspendia no pescoço da minha mãe
Hoje
Imagino um musseque perdido
E meninos de calções presos a papagaios de papel
E triciclos em viagem a circularem
Debaixo das mangueiras

Hoje
Sou um velho onde cessaram os sonhos
Hoje
Sou um velho que deixou de acreditar

Hoje
Olho os barcos de papel
Hoje
Olho os petroleiros de papel
Hoje
Eu e eles
Velhos
Sentados à fogueira a sacudir a ferrugem dos ombros

Francisco Luís Fontinha

Post-scriptum

Meu querido Luiz Pacheco,
Quando me referi que o meu pedido de rendimento social de inserção foi indeferido, por lapso, não te disse que apenas foram necessários três dias para o indeferimento,
- Três dias Pá? Foda-se os gajos em Vila Rela trabalham bem,
E que a minha inscrição no Centro de Emprego é uma treta,
- Emigra Pá,
Como vês meu querido Literalmente estou fodido, desempregado e sem subsídio algum, e apetece-me perguntar-te o que tens a dizer às novas gerações mas quase que adivinho a tua resposta,
- Puta que os pariu,
Nem mais meu querido Puta que os pariu.

Um abraço,
Francisco

Esperança e Acreditar


59,4 x 84,1 – Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Carta a Luiz Pacheco


Meu querido Luiz Pacheco,
Literalmente estou fodido, desempregado e sem subsídio algum, esforço-me e não encontro trabalho, recorri ao rendimento social de inserção e foi indeferido, pedi a isenção de pagamento de taxa moderadora e quase de certeza também vai ser indeferido, já pensei ir limpar latrinas mas devido à crise duvido que ainda exista merda para limpar porque de tanto apertarem o cinto os portugueses aos poucos deixam de defecar,
Não comem pá,
Já pensei fazer como o teu mangala que passeava pelas ruas de Braga e fazer-me à vida nos jardins de Belém mas nem para isso tenho jeito, o meu amigo doutor psiquiatra receita-me injeções e tenho de pagar um euro para me picarem o rabo,
- Pede supositórios Pá… E ainda consolas o rabinho,
Isto é se for na data marcada porque se for fora do agendamento são quatro euros,
- Estás mesmo fodido Pá,
Pois estou Meu querido,
E pronto Não sei o que fazer à puta da vida, ainda tenho os teus livros para ler e do António Lobo Antunes e do Saramago e do Cesariny e do AL Berto e do Milan Kundera e do Proust e do Gogol e do Tolstoi e do Dostoevsky, isto é, reler, porque já os li mas tal como o melhoral que nem faz bem nem faz mal, certamente voltar a lê-los também
- Tens vinte paus Pá?,
Também a noite tem algo de silencioso quando vocês entram em mim e particularmente fico fodido quando o AL Berto diz que se gritar mar em voz alta o mar entra pela janela, e abro a puta janela e o caralho do mar onde está?,
Não comem pá,
De tanto apertarem o cinto deixaram de defecar,
- Tens vinte paus Pá?,
Paus já eram e agora só existem aéreos e até ao final do mês só tenho cinquenta e cinco cêntimos,
- Essa merda dá para quê Pá?,
Para nada,
- Então estás Literalmente fodido Pá.

(texto de inspiração pessoal e dedicado ao Grande Luiz Pacheco; Lisboa, 7 de Maio de 1925 – Montijo, 5 de Janeiro de 2008)

Francisco Luís Fontinha

59,4 x 84,1 – Francisco Luís Fontinha

Por todos não custa nada


Coitadinho do senhor… E que não lhe chegam 12.000€ para as despesas do mês, que direi eu, desempregado e sem subsídio algum…

Em todas as madrugadas

Em todas as madrugadas
Vem até mim a ausência
Em todas as madrugadas
Descem até mim as estrelas
E as cordas de nylon suspensas em plátanos magoados
Balançam como corpos despedaçados pelo vento

Em todas as madrugadas
Procuro o teu corpo na algibeira dos lençóis
E não te encontro

Em todas as madrugadas
Uma janela se encerra
E uma sombra esconde o mar no estomago dos rochedos

Em todas as madrugadas
Vem até mim a ausência
E uma abelha sem asas
Poisa na minha mão
E dos corpos despedaçados pelo vento
Crescem malmequeres desgovernados nas manhãs de inverno

Hosana nas alturas

A evolução do homem

Cinco


Cinco Tintos se faz favor,
…Cheios!

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

O vendedor de sonhos

A vida tem destas coisas e tanto estamos na “merda” como repentinamente pertencemos ao estrelato do céu noturno de inverno, e pensava eu que terminaria os meus dias como mendigo dos tempos modernos e que engando eu estava,
- É preciso acreditar e ter esperança,
E eu perguntava-me Acreditar em quê ou em quem?, E eu perguntava-me Ter esperança em quem ou em quê? Que a noite se vestisse de dia e o dia se travestisse de noite? Que deus descesse à terra e se ajoelhasse a meus pés e me pedisse perdão? Ou que em vez de termos um túnel encravado na serra do marão tivéssemos o mar em Trás-os-Montes com gaivotas com traineiras e petroleiros e ao final do dia o pôr-do-sol?
- Nem acredito e muito menos tenho esperança murmurava eu todas as noites antes de adormecer,
E hoje precisamente enquanto tomava café pago por um dos meus amigos porreiros li na penúltima página do jornal
- Amor, Possibilidade de encontrar um grande amor. Trabalho, faça aquilo que melhor sabe fazer.,
E por grande amor entendo talvez alguém com cento e oitenta centímetros ou duzentos centímetros de altura e com cerca de cem quilogramas de peso, e nada, nada Acredite em mim Rigorosamente nada, e as únicas coisas grandes que vi hoje resumem-se a três cisternas carregadas de vinho, Vinho?, Sim vinho
- É preciso acreditar e ter esperança,
E do bom,
E dei-me conta hoje que a melhor coisa que sei fazer é sonhar e de mendigo dos tempos modernos vou começar a vender sonhos pelas ruas da cidade, e tenho-os desde cinco euros até vinte e cinco euros e de várias cores e sabores,
- É preciso acreditar e ter esperança,
E hoje também decidi mudar de marca de cigarros, do SG Filtro vou começar a fumar Tinto, é mais barato e não prejudica os pulmões e ainda ganho uma moca inteiramente grátis,
Sim vinho
Porque nos tempos que correm só com uma grande moca é que se consegue sobreviver (acreditar e ter esperança) e se for do bom,
E do bom,
E assim, senhoras e senhores, e assim se me virem pelas ruas da cidade com uma mala suspensa no braço e recheada de sonhos, não tenham medo, aproximem-se e comprem-me um,
Obrigadinho e que se faz tarde e antes que chegue a ASAE vou dar de frosques e fumar um Tinto,
Do bom.