sábado, 26 de novembro de 2022

Os barcos da minha infância

 Procuro na tua boca

O simples abraço nocturno dos pássaros embriagados

Procuro nos teus lábios

Os barcos da minha infância

Que repentinamente deixei de olhar.

 

Tragam-me aquele mar de incenso

Tragam-me as lágrimas dos poemas

Que deixo no teu diário

E quando tiver o simples abraço nocturno dos pássaros embriagados

Posso partir em paz; entre o silêncio e a madrugada onde poisas a cabeça.

 

Procuro nas tuas mãos de sono

As tristes palavras que habitam no meu peito

E este feitiço de sémen

Permanecerá enquanto houver manhã

Como as flores dos teus olhos.

 

 

 

 

Alijó, 26/11/2022

(Francisco)

sexta-feira, 25 de novembro de 2022

As frestas do teu olhar

 As frestas do teu olhar deixavam entrar as finíssimas lâminas de luz que em viagem regressavam dos rochedos em flor,

Inventa-me, enquanto acredito nas feras amansadas das tristes noites de Primavera.

Deste veleiro em busca do vento, oiço as canções das tuas lágrimas, com que te escondes enquanto as flores do meu jardim, entre os parêntesis da manhã, correm para o mar.

E o mar ergue-se na alvorada, ele é pássaro, ele é nuvem, ele é a luz…

O corpo flutua nas tardes junto ao cais, a caneta que dá vida às palavras, separa-se do corpo, troce-se sobre a mesa, e esta cidade sufoca-me,

O cigarro morre,

Entre olhares, a rádio em ecos desvairados, os animais em círculos, caminham para o areal em sinfónica maldade da noite, quando a paixão mergulha nas mãos de um mendigo; as flores, meu amor, as flores que transportas nos teus olhos cinzentos e de mil e uma palavras, o barco morre, e termina o luar nas tuas mãos.

Este mar de insónia, morre-me,

E acredito que as palavras que deixo no teu diário, também vão morrer, de tédio.

Cruzas os braços, e também eu, de tédio, morrerei numa tarde de sono. Agora, vêm a mim a tua mão, pegas no meu olhar, e em pequenas fatias de paixão, voamos em direcção ao Sol.

Sou o sono, oiço-te.

E estamos vivos porque as cancelas da noite nos prendem ao calendário diurno das tardes em poesia, beijo-te e invisivelmente, sou a fera metálica das lareiras em chama, e ardem nos teus braços as flores cintilantes do olhar.

A tua voz, morre-me,

E morrem-te as minhas palavras em ti, como morrem todos os poemas que escrevo.

Voamos em direcção ao Sol, como voaram todas as abelhas das colmeias que habitavam junto ao rio. Depois, os sonhos mergulharam nos degraus que nos levavam até ao sótão.

E este barco dorme docemente nos teus seios, quando a minha boca inventa em ti as sonâmbulas lágrimas dos socalcos floridos; um barco, um barco de silêncio nas tuas coxas, meu amor.

E cai sobre ti a alvorada e as frestas do teu olhar.

 

 

 

 

Alijó, 25/11/2022

(Francisco)

(ficção)

As palavras de amar

 Nas finas corda de sangue

Peço à tua boca o prazer desejado

Das palavras que te escrevo

E a semente que deixo no teu peito

Mais tarde

Um poema nasce e sobe até à lua

 

E da lua

E de todas as estrelas

Oiço a voz dos silenciados foguetões das madrugadas invisíveis

 

Um grito

Os pequenos suspiros dos ossos envergonhados

A tua boca na minha boca

Quando as gaivotas junto ao mar

Dizem-me que são apenas palavras

 

As palavras de amar.

 

 

 

 

 

Alijó, 25/11/2022

(Francisco)

Os pequenos lençóis do sono

 Este homem que vos escreve

Com um braço de sono no coração

E daquele livro em construção

As muralhas da cidade

Em círculos de insónia.

 

A fogueira esconde-se na algibeira dos sonhos

Junto à janela

Amo-te enquanto os teus pedacinhos de mel

Dormem sobre o meu peito

Onde juntamente com os teus pedacinhos de mel

Uma espada rouba-me a tua voz.

 

Não durmo enquanto a lua não acordar

Não durmo enquanto dos cortinados dos meus sonhos

Os pássaros da madrugada subirem a montanha

E procurarem-me em vão

Como se eu fosse uma sombra de pedra

Sem perceber porque morrem as abelhas.

 

O meu corpo parece um pequeno silêncio de espuma

Na secreta lápide onde escondo as nuvens

E nesta mão

Este homem que vos escreve

Dorme nos lábios da cidade.

(dos pequenos lençóis do sono)

 

 

 

 

 

Alijó, 25/11/2022

(Francisco)

Destes barcos sem nome

 Abraço-me a este pobre rio

Onde poisam os barcos sem nome

O comandante

Bebe as lágrimas dos subúrbios da insónia

E sobre os ombros

 

Os dedos imaginários das tuas mãos

A serpente de Deus

Brinca no teu pescoço

E um beijo voa sobre o mar

A casa

 

A casa é indivisível

E um portão de ferro

Apreende as primeiras lágrimas da manhã

Batem à porta

Senta-se sobre a sombra e enforca-se com o poema

 

Em pedacinhos de sono

A mesinha-de-cabeceira geme

Como gemem os gonzos das portas por onde entro

E destes sonhos que me despeço

O mar leva-me

 

E parto em busca dos teus cabelos

Que semearam as planícies do teu diário

E dos dias das minhas mãos de luz

O silêncio

Deste rio onde poisam os barcos sem nome.

 

 

 

 

Alijó, 25/11/2022

(Francisco)

Marés de Inverno

 

Meu amor

As ruas em silêncio

As palavras semeadas neste velho jardim

Meu amor

Das páginas deste livro

Que foges de mim

Meu amor

Dos olhos estrelares

Meu amor

Meu amor em luar

Meu amor de todos os mares

Em marés de Inverno

Meu amor

Quando a noite é inferno

Da noite amor

Na noite em flor

E meu amor

Quando o poema cresce em tua mão

E de mim

A silenciada paixão

Quando o meu coração

Meu amor

Desce às profundezas do medo

E em desejo meu amor

O teu sorriso beijo.

 

 

 

Alijó, 25/11/2022

(Francisco)

quinta-feira, 24 de novembro de 2022

As loucas palavras

 A loucura

O louco que sou

Nesta loucura

 

As palavras

Loucas

As loucas palavras

Do velho louco

Quando o rio louco

É o único louco da noite

 

Uma árvore louca

Onde poisam pássaros loucos

E eu

O louco

Que escreve

Que fuma e bebe

No louco cansaço da noite

Abraça a louca árvore

E ouve as loucas palavras

Palavras loucas

Deste vosso louco

 

As palavras

As loucas madrugadas

A fome

E o louco pão

Na mão

Desta louca mão

Que pinta

O louco sorriso deste louco coração.

 

 

 

 

 

Alijó, 24/11/2022

(Francisco)