domingo, 15 de agosto de 2021

Da paixão. O meu poema voando como uma serpente,

 

Todas as horas são palavras para adormecer. Despe-a solenemente enquanto ao longe a quebrar o silêncio dos uivos, ROUGH AND ROWDY WAYS semeia nas pequenas gotículas da paixão o poema em construção. Beija-a, abraça-a, escreve-lhe no copo o desejo em pequenos pergaminhos e, sabe que dentro dela, todas as noites, urgem as pequenas sílabas da paixão.

Transportas no púbis o pôr-do-sol, cintila no olhar o silêncio da noite, quando todos os livros danças ao som de BOB DYLAN e, ambos sabemos que a paixão fervilha nos socalcos cansados de uma enxada de luz.

Pinta no corpo o amanhecer, da pele lúcida e transparente adivinham-se as canções nocturnas do rio e, todas as horas são horas para amar.

Alicio-a

Canso-me nos beijos, canso-me nas palavras imaginadas por uma máquina fotográfica e, o retracto de desejo absorve-se como se fosse uma lâmina de gemidos dentro do túnel com acesso ao mar. Os barcos brincam na sua mão, na boca, os pequenos uivos e gemidos da tempestade, depois

Alicio-a,

Danço no seu corpo de tela inacabada, sempre que me sento nesta pedra, imagino-a saindo dos seios do mar, como se ela fosse uma página em branco, em que todas as noites escrevo o meu poema

Da paixão.

O meu poema voando como uma serpente dentro de um buraco negro; as estelas olham-se no espelho da manhã, os cigarros fumam-se a cada pequeno passo nas planícies do silêncio e, o amor

Alicio-a e dispo-a.

Aos poucos, deixo de ouvir ROUGH AND ROWDY WAYS, o som mistura-se com as palavras embebidas no prazer,

Sinto-a dentro de mim,

E, eis os gonzos da noite.

Sinto-a nas palavras entre relógios de pulso e sombras de luz nas profundezas das palmeiras junto à baía e, vem até mim o cheiro das algas acabadas de acordar.

Poisa os seios no parapeito olhar de uma janela de hotel, urgem as pequenas sílabas da paixão e, eles olham o veleiro que zarpa das suas coxas. Enveneno-me de luz, embriago-me de silêncios gemidos depois de perceber que fui palavra no útero de minha mãe,

As saudades, eles percebem-me.

E, devem estar muito felizes.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 15/08/2021

sábado, 14 de agosto de 2021

A insónia de Deus

 

Uma abelha de luz poisa no teu olhar. Haverá sempre noite; mesmo que a lua se suicide no teu olhar, haverá sempre luar na tua vida,

O cansaço,

Nos dias que se perdem, nas horas em que nasce e, morre uma estrela, mesmo assim, haverá sempre Primavera na esplanada da saudade.

O esqueleto rangia como os gonzos do silêncio e, nunca percebeu que lá fora, junto ao rio, um fio de nylon tentava regressar à velha fotografia; tinha na mão a imagem de Cristo crucificado.

Em cio, avança o exército de gaivotas em direcção ao mar; os barcos da minha infância são hoje objectos raros, distantes de uma cidade envergonhada pelo passado.

Pedacinhos de linha, anzóis despedidos pelo velho pescador e, junto ao cais

Uma criança inventa electrões, protões e a tomografia por emissão de positrões e, eu desconhecia que o PET lhe vasculhava tudo até aos ossos; amores e paixões, flores e jardins, sumo de laranja e bacalhau com natas. No final

A sentença. CONDENADO.

Ela

CONDENADA.

Hoje, há quem me diga que são muito felizes, os dois e, vão amar-se eternamente.

O dia e anoite,

A lua e o luar,

Ambos, ambas, condenados

Condenadas pela insónia de DEUS.

Hoje são pequenos grãos de areia na mão da tempestade. Vivem num cubo de vidro, alimentam-se de pequenos nadas e, lêem as escrituras divinas. Nada a fazer, digo eu

Tudo a fazer, dizia ela

CONDENADA pelo oxigénio abstracto da manhã.

 

 

Alijó, 14/08/2021

Francisco Luís Fontinha

quinta-feira, 12 de agosto de 2021

Um gajo com mau feitio

 

Sou um gajo de mau feitio, pensava eu enquanto me entretinha a olhar o espelho convexo da noite, olhava pela janela,

Em voz alta,

Ela parecia ter saído dos banhos nas Termas de S. Pedro do Sul,

Em criança,

O livro comprado no Café Tavares, em frente ao rio, lia o sorriso dos patos bravos acabado de acordar e, mal sabia o que era a paixão.

Duas coisas eu já sabia; ser filho único e com mau feitio,

A noite trazia-lhe as mentiras das montanhas adormecidas, sexo só à noite, junto aos pinheiros e, ela sempre que acordava,

Ele,

Não sabia nada à cerca do ciúme. Tinha fome. Alimentava-me de cigarros adormecidos, café envenenado por uma cidade esquecida na tempestade e, debruçava-me no parapeito da forca, estendia a cabeça, colocam-me a corda no pescoço e, voava até ao infinito.

Morreu de quê?

A saudade da mãe, os dias intermináveis junto a um rio ancorado na neblina, folheava todas as fotografias e, nada a dizer; amanhã ele estará melhor.

O avô questiona-o se já tinha terminado a tropa e, com sorrisos embrulhados em mentira

Já, avô, já estou em casa.

Não sabia o que era a geada, tinha medo da neve e, pensava que as primeiras botas calçadas pertenciam às forças especiais de qualquer ramo das forças armadas. Feridas. Dor. Das mãos regressavam as aldeias em frieiras,

Calça as luvas, Luisinho!

Podia ter nascido em Trás-os-Montes, mas não era a mesma coisa.

Olhei este vosso, meu, Rio Douro. Mais tarde mostravam-me os encantos do Tua e, nunca mais chorei por ela.

Uma cidade abandonada, musseques engasgados no capim envelhecido, ao longe, o velho Zacarias, fumava pedras da calçada,

Tão lindos os mabecos!

Numas longínquas férias da Páscoa apaixonei-me por uma trapezista de um circo sem nome, no seu enlace,

Caminhei até às proximidades do Ujo, perdi-me,

E, talvez hoje fosse Presidente do Conselho de Administração do Circo sem nome, além, as gaivotas dormem nos braços das mães que espreitam as mãos nocturnas da montanha, chovia derradeiramente e, não havia nada a fazer; pelos vidros invisíveis das janelas regressava até mim o silêncio travestido de frio, a porta de entrada sempre aberta, alguém tinha furtado a fechadura e, em dias de geada, ao descer as escadas embebidas no fino oiro geada, tombava e, rebolava até ao chafariz.

Na praça. Da praça.

Fotografaram-me junto à Gricha, sentei-me em cima do burro e, tombei.

Todas as manhãs navegava nas gavetas da paixão, escrevia palavras nas paredes do quarto, levei nos cornos da minha mãe e, pedia ajuda ao meu pai: estava salvo. Mais um livro que trazia na algibeira, quase sempre adquirido na papelaria Grifo. O hiper dos anos 40, 50…, sentado na parte mais estreita do meu corpo, sentia o baloiço dos meus ossos contra a manhã, dias seguidos enclausurado nas paredes amarelas da hepatite.

À noite, percebia que de trapezista eu nada percebia, chegar um dia a Presidente do Conselho de Administração, pior ainda.

Sou um poeta.

- Novamente atrasado, Sr. Fontinha

Sou um gajo de mau feitio, pensava eu enquanto me entretinha a olhar o espelho convexo da noite, olhava pela janela,

Em voz alta,

Ela parecia ter saído dos banhos nas Termas de S. Pedro do Sul,

Em criança,

Foi o trânsito, meu Capitão, as mulas estavam furiosas.

O avô Domingos espetava pregos nos machimbombos, nos bolsos guardava a fotografia das filhas, mulher e netos, sem que eu percebesse, que junto a eles e a elas, habitava um ascendente que tinha nascido em Lisboa e era cocheiro. O meu bisavô.

Hoje, quase todos, pó.

Eu, transeunte modificado geneticamente, espero que acordem as ruas de Carvalhais.

Fui. Disse ele.

E, nunca mis regressou à cidade da saudade.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 12/08/2021

terça-feira, 10 de agosto de 2021

Um menino de porcelana

 

Em criança, os meus pais, ofereceram-me um barco com motor,

Passava tardes intermináveis a construir vestidos para um estúpido boneco que baptizei numa qualquer igreja clandestina, numa tarde em Luanda; o “chapelhudo”.

Colocava uma enorme bacia com água e deliciava-me com o meu barco em pequenos círculos com olhos verdes, nos bracinhos tinha uma pequena almofada embebida em ar para não afundar, e divertia-me até que as pilhas falecessem.

Nada a fazer, perguntava-me,

Sempre fui apaixonado por barcos, papagaios em papel e, vestidos para o meu amigo “chapelhudo”. Do mar, um imenso cardume de estrelas, verdes, encarnadas e, cinzentas,

Extintas as portas de entrada, aos poucos, o paquete ausentava-se de mim, mar adentro, confinado pela tempestade, segredava ao meu pai,

- Tenho fome,

Os cigarros engasgavam-se na garganta inflamada pela nafta, do outro lado, na piscina, meninas brincavam com bóias de sabão, o mar fugia e, Luanda desparecia no horizonte; alto mar.

Tenho fome do Mussulo, das palmeiras eternas nas noites recheadas de neblina e, como sempre, nos meus versos, uma saudade enorme de um rio que mais tarde me viu suicidar; junto ao Tejo,

Passei uma noite debaixo da ponte Oliveira Salazar, quase não me lembro das estrelas, manhã cedo, em direcção ao Porto de Lisboa, vi um magala dilacerado pelo silêncio, suicidava-se aos poucos com shots de Vodka e Uísque, mais tarde,

Ontem,

Percebi que aquele palhaço era eu, vinte anos depois.

Sentei-me, peguei-lhe na mão e, com pequenos toques infundados por debaixo da mesa, sem que ninguém percebesse, ia escrevendo o poema da saudade,

E, da saudade,

Um menino de porcelana, loiro com caracóis que o pai resolveu numa tarde dizimar (cabelo à homem),

Coisas dele,

Minha sina foi ser caixeiro-viajante, de terra em terra, de Oceano em Oceano, percorri todas as palavras escritas com o olhar,

Amanhã

Amanhã reescrevo o poema da saudade,

Pincelados de cinzento, nos olhos a nostalgia do silêncio, olhos rasgados pela tempestade, ao longe, S. Tomé e Príncipe, Las Palmas de Gran Canaria e, Ilha da Madeira, Lisboa aproximava-se, dentro dos caixotes em madeira, coisa nenhuma, meia dúzia de tarecos e saudades.

- Tenho fome do Mussulo, uma saudade enorme de um rio que mais tarde me viu suicidar; junto ao Tejo, conheço-te desde sempre, aqui, acolá, além-mar,

Âncoras ao pescoço, drageias de incenso para adormecer, porque nas mãos trazia sempre a cartilha da sanzala abandonada,

Dorme.

Ai que dorme.

E, dorme desde então; dizem que abraçado ao pescoço dela.

Chorou. Dentro das lágrimas viam-se os botões de rosa da madrugada, da pensão, alguns gemidos, friestas no gesso apodrecido e, apagou-se nos braços da amante.

O coração tinha recusado horas extraordinárias e, no pulso, o relógio do sono.

O mar.

A mãe segurava-o enquanto ele desenhava gaivotas coloridas em papel envelhecido; notícia de última hora!

O mar, também ele, tinha morrido nas lágrimas envergonhadas das manhãs junto à Fortaleza; barcos e canhões limitados, com sede na Rua do Azeite, número quatorze.

De herança, deixou três búzios e uma enxada de prata.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 10/08/2021

segunda-feira, 9 de agosto de 2021

Todas as pedras do sono

 

Dizem que o vento o levou e, semeou nas páginas da insónia o poema paixão.

 

Poema paixão

 

Escrevo a minha última carta

Para as longínquas estrelas.

Flores que se amam, há muitas,

Desde que as palavras escritas,

Adormeçam nas extintas lágrimas da noite;

A paixão levou-o num barco em papel

Dançando nas pequenas sílabas

Do Outono passado.

O dia desaparece na página de um velho livro,

O velho mendigo, de cigarro na algibeira,

Dá aulas de Filosofia numa esplanada invisível, junto ao Rio;

O pequeno-almoço, morreu-lhe

E sempre que se recorda do retracto junto ao pôr-do-sol,

O mar parece doido, cansado, de tanto vigiar os rochedos da morte.

Traz no rosto as lágrimas da saudade,

Reza religiosamente às sombras da cidade e,

Uma estátua aparece a cada vez que o mesmo mendigo

Consulta o relógio da ausente do pêndulo uniformemente acelerado.

Calcula a velocidade da queda,

Verifica que a aceleração é contante,

Dentro de uma máquina fotográfica.

Semeia imagens nos socalcos da infância,

Desenha tentáculos de esperma

Nas nuvens de antigamente e,

Travestido de sonífero, foge da cidade.

Cada noite é um colchão envenenado pelo silêncio,

Cada beijo,

Uma flor perfumada no sorriso da areia,

- “Escrevo a minha última carta

Para as longínquas estrelas”

Pudera;

A paixão é uma lágrima na cara do objecto,

Desenho tranquilo,

Deserto,

Faminto.

Ama-se de quê?

Como a morte.

Morre-se.

E, ama-se.

 

 

A noite é um emaranhado de fios condutores, vêem-se todas as lágrimas de electrões, protões e todos os cabrões das vaidades incompreendidas, a esmola é muito e, de gorro na cabeça, depois de nascer o sol, vomita as equações que silenciaram durante a noite; o cio.

A dor da mão quando escreve na terra húmida, todas as coisas mortas, visivelmente como uma janela virada para o mar.

Quatorze horas de fome, almoços cansados sobre a mesa e, o velho mendigo, de tanta Filosofia, entoirido de medos e lagartos sem nome. Primeiro vem o beijo desejado pelas palavras escritas, metáforas e animais mamíferos, toca o despertador;

- Morreu entre as duas e as três -
Entalado?

Cercado por uma cerca eléctrica, que só as cidades conseguem construir.

- É isto a loucura? -
Uma laranja embriagada nas cinzas de uma eira abandonada. E, toca o despertador para a ordinária equação de todos os gomos envenenados, desertores de uma guerra de palavras, sobre a cabeça dos homens.

- Isso dói? -
Mais rápido que a velocidade da luz, o anzol procurando a sua presa acabada de se enforcar nos seios de uma aranha, há música sobre os ombros dos alicerces não terminados, o carpinteiro procura a enxada, vomita pequenas línguas de fogos, aquece as mãos durante o Inverno

- Que horas são, meu primeiro poema? -
Ontem pertencias aos mares navegados por petroleiros de ossos, gaivotas de vidro e, pequenos adornos ao pescoço.

Durante o Inverno, perto da noitinha abençoada, acende a lareira do sono, deita a cabeça sobre o peito dela e,

Segreda-lhe muito baixinho;

Amo-te.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 09/08/2021

sábado, 7 de agosto de 2021

Os livros da minha infância

 

Trazes nos lábios

O silêncio

Onde habitam os peixes da minha infância,

Das tuas mãos

Oiço

O baloiço

Dos meninos da minha infância,

E, desenho a saudade

Na sombra sonolenta

Das palavras

Da minha infância.

Capto o sorriso que de ti

Palmilha as montanhas da minha infância,

Porque ontem

Percebi

Que já brincavas nas sombras da minha infância.

Oiço-te quando do longínquo oceano

Regressam as flores da minha infância,

E, talvez seja a chuva

Que deixei na minha infância,

Te liberte das palavras minhas,

Quando escrevia na laranja

O poema da minha infância.

Sinto o teu corpo

Nas fotografias da minha infância,

Um esbranquiçado preto e branco no silêncio infinito,

Quando dentro da cidade,

A janela da minha infância…

Brincava na montanha.

Sinto os pássaros da minha infância

Desajeitados como a minha boca,

Escrevendo beijos

Beijos e coisa pouca.

E, o rio.

O rio da minha infância,

Descendo a sanzala,

Uma cubata aqui,

Palhota acolá,

Mas na minha infância

Já sabia que os teus lábios

Eram desejos,

Desejos

Todos beijos.

 

Trazes nos lábios

O silêncio

 

No olhar as minhas palavras,

 

Sinto-o

E, alimento-me de ti,

Sempre que nasce a madrugada.

 

 

Francisco Luís Fontinha, Alijó/07-08-2021

sexta-feira, 6 de agosto de 2021

Dos pássaros em cio às palavras envergonhadas

 

Do oiro imaginário às sete drageias do destino, sobe a montanha em direcção ao céu, senta-se à sua direita e, adormece. O vento arranca-lhe os rochedos aprisionados ao olhar magnético que a divina montanha desenho quando nasceu. A casa, dorme.

Sinto-lhe a mão suspensa numa imagem a preto e branco

Assim morreu depois do sono.

O mar entra-lhe pela janela da paixão, a imagem a preto e branco alicerça-se ao cansaço matinal, acordava sempre maldisposto, noites de insónia ventiladas pelo sexo das flores, cinco imagens dormem sobre o velho cabelo e, sempre que imaginava o mar

O mar dança na sua mão.

Dizem que o mar é um velho preguiçoso, mulherengo durante a noite, insatisfeito ao pôr-do-sol; tínhamos desenhado as estrelas sobra a areia fina do Mussulo, ela, dançava em cima da sombra cansada das palmeiras, e ele, vestido de marinheiro, fazia-se ao mar, todas as sextas-feiras, o barco voava nas montanhas pinceladas de carvão.

Tenho fome, mãe.

Come pão.

Quero uma sandes.

Só tenho pão.

O pai, zangado, oferecia-lhe sandes de pão com pão, dizem aqueles que experimentaram ser sem dúvida o melhor manjar da ilha dos amores.

A ilha tinha uma janela voltada para os lábios da solidão, quando acordava travestido nos calções de porcelana, dos braços saiam-lhe palavras que mais tarde, depois da caminhada improvável sobre a areia, deitava sobre os seios da madrugada; tirava fotografias aos barcos acabados de morrer.

Um dia, depois de sepultar a tarde numa jarra com água-benta, foi de encontro aos retractos deixados numa caixa em papelão, pelo pai, quando este fugiu para Ambriz, numa bela tarde de finados. Ontem tudo parecia uma folha em papel envenenada pelo desejo,

Comeu-as todas,

E, não só de desejo vivia ele, também acariciava as palavras embriagadas pelo mordomo, que de enxada não mão, fazia dirigir as cabras para o areal; todos os dias, o medo de que alguém estivesse abraçado à tristeza.

Os desenhos queriam sair das paredes velhas de um café em ruínas, lia o jornal, vaticinava sobre o fim da guerra e, quando se deitava, sempre à procura do medo de não acordar ao outro dia, dizia-se Ateu, apenas para enganar a solidão,

Hoje, não.

A cabeça pesada, os vómitos das curvas endiabradas e, sempre que questionava se faltava muito,

Dizia-lhe, estamos quase, estamos quase.

As laranjas sabiam a saudade, de todos os livros que tinha, um deles era sobre o mar

Abraça-a todas as noites.

Havia um louco que não sabia andar de bicicleta, transportava-se num velho triciclo que tinha pertencido a uma família de gaivotas, acabadas de partir devido à guerra, hoje

Nada sei de o doce olhar do amanhecer.

Hoje, sinto uma fina angústia de sono junto aos tornozelos, os cigarros são sombras inventadas pelo velho cozinheiro da aldeia e, em todas as ruas, uma estátua de luz dorme.

“O sexo entre duas pedras de gelo e uma doze de uísque”

- Do oiro imaginário às sete drageias do destino, sobe a montanha em direcção ao céu, senta-se à sua direita e, adormece. O vento arranca-lhe os rochedos aprisionados ao olhar magnético que a divina montanha desenho quando nasceu. A casa, dorme.

Sinto-lhe a mão suspensa numa imagem a preto e branco

Não sei, talvez,

E, sempre que pode, senta-se numa pedra junto ao mar.

 

 

Francisco Luís Fontinha, Alijó 06-08-2021