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sábado, 14 de agosto de 2021

A insónia de Deus

 

Uma abelha de luz poisa no teu olhar. Haverá sempre noite; mesmo que a lua se suicide no teu olhar, haverá sempre luar na tua vida,

O cansaço,

Nos dias que se perdem, nas horas em que nasce e, morre uma estrela, mesmo assim, haverá sempre Primavera na esplanada da saudade.

O esqueleto rangia como os gonzos do silêncio e, nunca percebeu que lá fora, junto ao rio, um fio de nylon tentava regressar à velha fotografia; tinha na mão a imagem de Cristo crucificado.

Em cio, avança o exército de gaivotas em direcção ao mar; os barcos da minha infância são hoje objectos raros, distantes de uma cidade envergonhada pelo passado.

Pedacinhos de linha, anzóis despedidos pelo velho pescador e, junto ao cais

Uma criança inventa electrões, protões e a tomografia por emissão de positrões e, eu desconhecia que o PET lhe vasculhava tudo até aos ossos; amores e paixões, flores e jardins, sumo de laranja e bacalhau com natas. No final

A sentença. CONDENADO.

Ela

CONDENADA.

Hoje, há quem me diga que são muito felizes, os dois e, vão amar-se eternamente.

O dia e anoite,

A lua e o luar,

Ambos, ambas, condenados

Condenadas pela insónia de DEUS.

Hoje são pequenos grãos de areia na mão da tempestade. Vivem num cubo de vidro, alimentam-se de pequenos nadas e, lêem as escrituras divinas. Nada a fazer, digo eu

Tudo a fazer, dizia ela

CONDENADA pelo oxigénio abstracto da manhã.

 

 

Alijó, 14/08/2021

Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

O perplexo sentido da fuga do corpo em translação


O perplexo sentido da fuga

Do corpo em translação

O abraço submerso

Nas marés de ninguém

Acordar

Acender o último cigarro da vida…

Escrever o poema nas tuas pálpebras incendiadas pelo desejo

Que só a minha mão o sabe fazer

Ler-te o último parágrafo do meu livro

Oferecer-te um beijo

E partir sem regresso

Ao teu olhar

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

quarta-feira, 25 de Novembro de 2015

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

as oito esquinas do medo

foto de: A&M ART and Photos

deixarei de pertencer aos teus olhos
e vagamente... deixarei nas tuas nuvens de algodão o cigarro fantasma
deixarei de adormecer nos teus cabelos como o fazia antes das madrugadas serpenteadas
nas oito esquinas do medo
ouvirei perfeitamente as tuas mágoas...
terei o leve cuidado de acariciar os teus lábios
e
deixarei de voar nas tuas lágrimas de maré embriagada
e vagamente transformar-me-ei na cinza do teu imaginário cinzeiro
haverá uma janela engomada
com cortinados de fumo
e haverá... uma língua endiabrada pernoitando no meu angustiado peito

servirei de teu mordomo devidamente fardado
andarei pelos corredores da tua imaginação levitando sem tocar nos objectos de adorno
sentirás dentro de ti o meu vagabundo corpo
e nada conseguirás fazer para cessarem os teus sinceros gemidos
baterá o vento levemente nas ardósias dos tentáculos pinheiros de Carvalhais
ouviremos o sino engasgado nas sílabas das searas de milho
deitar-te-ás dentro do espigueiro...
e o teu ventre correrá em círculos na eira granítica do desassossego
amar-te-ei?
mesmo sabendo tu que sou um espantalho de aldeia
onde poisam os pássaros
e cagam os pássaros... sobre mim

sobre nós
deixarei os livros cansados das minhas mãos
dos meus olhos
às palavras... às palavras vou derramar-lhes o fogo do silêncio
embrulhado em pergaminhos sonos
e verei transversalmente o meu esqueleto no patamar da morte
ouvirei os teus casmurros beijos
como sentirei em mim os teus deleitados dedos
sujos
imundos...
transbordando sémen como caravelas esquecidas no Oceano dos vidros solitários...
e acabarei por pertencer aos ramos caducos do Outono


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 29 de Novembro de 2013

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Navegantes sorrisos

foto: A&M ART and Photos

Os desencontros dos navegantes sorrisos
da sua boca o desassossego em preguiça
os meus teus lábios voando sobre as calçadas do silêncio
entre medos
degredos
teus luxos segredos
quando um cortinado se esbanja à janela da solidão
e a tempestade avança contra nós e nos tomba no chão,

Os espelhos dos teus seios como coloridas manhãs de Primavera
havíamos plantado árvores de brincar
tínhamos bancos de sentar
como inventada madeira
saltitando nervos dos horóscopos aquários
eu vagabundo
eu imundo... sorrindo cansaços marasmáticos em saliva amanhecer
e oiço a tua sóbria voz no meu peito de xisto,

Tinhas na boca a minha boca em papel cremado
sentia a tua língua em poesia escrevendo versos no meu pescoço...
pegava-te na mão dilacerada e esperava pelas tuas doçuras coxas
inventávamos areia sobre os lençóis de linho
e desciam as estrelas sobre os nossos corpos em delírio
coisas em coisas como tinta numa tela encarcerada dentro da prisão dos húmidos desejos
e havíamos esgotado todos os livros e marés de ninguém
e tínhamos um cubículo de fome só nosso... como flores esquecidas na jarra sobre a mesa-de-cabeceira....

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha