domingo, 26 de abril de 2015

O espelho


Esta vida em crescentes cansaços

a pele iluminada na ira do vulcão

como sempre

esboçando nos tentáculos orgasmos dos homens

este amor

meu amor

um computador

novo

(ao menos

enquanto estiver com ele

não penso em ti...)

como quando desenho noites

nos teus lábios

no espelho da cidade que nunca sorri...

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 26 de Abril de 2015

sábado, 25 de abril de 2015

No teu corpo em STOP


as hastes virtuais do cansaço alimento

tenho no corpo as sentinelas do abismo

pensando bem

amanhã perguntarei ao corredor envidraçado

se...

se a Primavera é isto...

a porcaria caligrafia dos voos nocturnos da paixão

o exilado amor

acorrentado às primeiras páginas de um livro

as tormentosas sílabas do adeus

caminhando junto à praia

a morte constituída arguida das sombras em flor

o prisioneiro eu


sempre só

meu amor

amor meu


sou uma árvore sem sorriso

um esqueleto de letras

cambaleando na noite dela

nunca tive a noite

meu amor

sentia-me disforme

ambíguo

sonâmbulo das viagens clandestinas

no teu corpo em STOP

Pára tudo

meu amor

as pessoas

os carros

as pessoas e os carros

embrulhados em perfume de luz

vou

e acredito não voltar mais

para quê?

meu amor...

regressar aos teus braços...

 

Francisco Luís Fontinha - Alijó

Sábado, 25 de Abril de 2015

sexta-feira, 24 de abril de 2015

O envidraçado corredor alimentado por fotografias e pensamentos, olho as fotografias, e sinto os pensamentos no corpo, sento-me, e levanto-me, caminho sem destino, volto a sentar-me, e levanto-me, durmo, tantas vezes que o cansaço me absorve, que figura
Os esqueletos de luz passam, e
Que figura, embriagado por uma cadeira, não sonho, invento bonecos de palha no silêncio da dor, e a morte mesmo ao seu lado…
Perdi-me em ti, meu amor, não sei quando acordará a manhã e tu, cá, vestida de insónias sobre a minha campa de palavras, o envidraçado, de vez em quando, sorri
Odeio o riso, odeio a luz e a noite, odeio as cidades e os rios e o mar,
Os barcos,
O que têm os barcos, meu amor,
Corpos,
Mortos,
Desenhos na caligrafia, os desenhos embrulhados às poucas palavras,
Nunca
Lhe
Ouvi
Uma apalavra
Nunca lhe ouvi uma palavra, disse-me ela enquanto tomávamos um café
O cigarro,
Apagado,
O dia terminado, sem que eu tenha alcançado as ruínas dos teus ossos, a cada sílaba retirada
Um ai,
O cansaço das árvores enquanto dormem, as pedras minúsculas do teu olhar, pregadas, à parede sem saberem que o dia nunca existiu
O meu irmão António
O dia nunca existiu, tu, tu nunca exististe, ela nunca existiu nem ele e ela alguma vez tenham existido,
Confusão, as tuas palavras, confusão, meu irmão, a nossa vida
Desgraçada,
António, amanhã vais ao terreiro e trazes meia dúzia de cigarros, três ou quatro fósforos… e fugimos, para longe, meu irmão, para longe, lembras-te, quando pedimos à mãe que nos levasse ao circo…
Não gostavas de circo, não gostavas de nada nem de ninguém, não pertencias a esta vida, o agora, o antes, porque o depois
Circo, António,
Porque o depois torna-se o agora e o agora transforma-se em ontem, e onde estiveste ontem, António,
No circo, no circo,
Do envidraçado, não via nada, nada, apenas esqueletos de luz…
 
(ficção)
Francisco Luís Fontinha - Alijó
Sexta-feira, 24 de Abril de 2015


Gaivotas de espuma…


Enquanto escrevo

Acredito no esboço do beijo

Deitado

Sobre o esquiço do cansaço

As palavras entre lábios de esperança

E bocas de amargura

Deitado

Submerso

Ele

Enquanto dorme

Submersa ela

Enquanto deambula na cidade

E vê nas sombras

A verdade

A mentira disfarçada de verdade

As lágrimas

No esconderijo do silêncio

Caminho desesperadamente sobre as pedras inanimadas da solidão

Não percebo o sofrimento

Nem… nem o reencontro de alguém

Com o espelho da madrugada

Não acredito

Em nada

Nada

Na

Da

Amanhã

As sílabas magoadas dentro de um livro escuro

A capa em cor de noite

Com pedacinhos de algodão

Lá dentro

Habitam pessoas

Casas

Ruas

Nuas

Nu

As

E amanhã

Caminho

O livro escuro

Encerrado

Para descanso do pessoal

Reabrimos…

Nunca

Nun

Ca

Os cigarros espalmados nos alicerces do passado

Não

Não sei

Talvez

O dia seja desejado

Ou…

Ou…

Deitado

Sobre o esquiço do cansaço

As palavras entre lábios de esperança

E bocas de amargura

E não consigo olhar o envidraçado olhar

Das gaivotas de espuma…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 24 de Abril de 2015

O corredor


Solidifica-se o corredor da esperança

Sinto as vergastadas palavras

Do sofrimento

Alimento-me de poemas

Meu amor

(meu amor inventado)

Vê tu

Poemas

Sei que todas as tempestades

Morrem

Como o amor

Solidifica-se o corredor

Sento-me

E durmo

Não sonho meu amor

Imagino transeuntes brincando na areia

Folheando peles cintilantes

E namorados invulgares

Tanto sofrimento

Meu amor

Perceber que a vida

É a vida

Um segundo apenas

No teu relógio

A madrugada sobressai nas límpidas telas dos beijos encarnados

Imaginava-te penumbra como a noite

Com asas

E voavas…

O infinito adeus

Quando tu

Sentado

Me abraças

Gosto de ti

Gosto de ti como se fosses o meu preferido livro de infância

Aquele com desenhos de estanho

As curvas

Uma pulseira nos teus lábios

O marfim

A morfina andorinha pregada ao teu texto

Escrevo com odor

Sem pensar

Que tu

Meu amor

És inventada

Inventada

Uma boneca de sorrisos

Um cortinado em linho

Suspendido

Crucificado ao amanhecer

Existes

Meu amor?

Porque são desertas as ruas da nossa cidade

Do nosso bairro

Da nossa infância

Os primeiros beijos desenhados num velho Castanheiro

As castanhas entranhavam-se nos teus seios minúsculos

A morte

Meu amor

És inventada

Uma carta nunca escrita

Secreta

Anónima…

… Amo-te

Meu amor…

Adormecida cancela da escuridão

Sei que tu…

Partirás para o Inverno

Não importam os teus álbuns fotográficos

Porque

Meu amor…

Perdi a paciência para te amar

Meu querido

Como é o sofrimento?

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 24 de Abril de 2015

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Barcos de espuma


Estou cansado da esperança

Deixei de acreditar no sorriso fictício da madrugada

Sinto o teu sofrer

No meu sofrimento

De te perder

De não conseguir achar-te

Nas ruas desertas da minha cidade

Estou triste

Meu querido

Sofreres

E eu

Impávido

Escrevendo palavras

Inventando amores

Para esquecer a tua dor

Desenhando flores…

Flores… meu querido

Que vão alimentar a tua lápide

Não tenho coragem de desiludir-te

Invento estórias

Para adormeceres

E acreditares que existe madrugada

E que amanhã estarás vivo

Mas percebo o quanto é difícil

Mentir-te

Escrevo-te

Meu querido

Sabendo que amanhã é outro dia

Sem endereço no calendário

O oculto desejo de caminhares sobre os rochedos da insónia

Sabes que não aguento mais este sofrimento inválido

Nos cigarros fumados num jardim com odor a morte

Nunca tive sorte

Nem vontade de lutar

Sou fraco

Meu querido

Choro em silêncio

E pareço uma estátua em granito

Finjo

E minto-te

Mas não acredito

Deixei de acreditar

Quando vejo a tua vida

Escoar-se numa conduta sem saída

Às vezes

Sinto as tuas mãos nas minhas mãos

Víamos os barcos no porto de Luanda

E hoje

Não Luanda

E hoje

Não barcos

Estou cansado da esperança

E das esquinas sombrias da melancolia

Estou cansado do meu corpo envolto de abelhas

E do pólen envenenado pelas madrugadas de sofrer

Não me ouves

Meu querido

O dia deixou de pertencer aos Luares nocturnos dos visitantes sem nome

Nunca me esqueço

Dos sonhos alicerçados nos teus cabelos

Caducos

Inexistentes

E hoje

Percebi a tua agonia

Nas vagas de espuma do silêncio

Que o mar engole em cada amanhecer…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 22 de Abril de 2015

terça-feira, 21 de abril de 2015

Conversas


Nossas palavras

Voando nas linhas curvilíneas do abismo

Sabes meu amor?

Sinto-me sem esperança

Vontade de acreditar

Não

Meu amor

Deixei de acreditar

Sinto-me um afluente

Em busca do silêncio

Sinto-me a montanha

Acorrentada ao amanhecer

Sou uma árvore caduca

Sem saber o verdadeiro preço da paixão

Não

A paixão não se vende

Transacciona

Ou colecciona

Não é facturada

Com IVA

Sem IVA

A paixão se sente

Quando acorda o dia

Visto as calças do avesso

Troco a camisa pelo pijama

E durmo

Sabendo que nos teus lábios

Habitam narcisos

Orquídeas

E sombras

A paixão é como a tempestade

Liberta-se do corpo

Voa

Voa nos finíssimos fios da saudade

Não penso

Nas tuas palavras indigestas

Traiçoeiras

Circunferências de tristeza

Que apenas o teu corpo conhece

Ama

E sente

Todas as noites

Tinham inventado as cartas de amor

Desenhavas tão mal

Meu amor

Os corações pareciam rochas embriagadas

E as setinhas…

Uma serpente venenosa

Enrolada

Nos Sábados sem nada fazer

Sabes

Meu amor

Não existe amor nenhum

Invento-te para esquecer a solidão

E as noites em frente ao espelho

A… a pedir perdão

Perdão porque errei

Sempre erro

Sempre

É o meu destino

Amar

As folhas de papel pinceladas pelos teus cabelos

Escrever no teu perfume

“Esqueci-te”

Nem os teus ossos

Existem dentro dos nossos livros

Folheio-os em buca da tua sombra

Uma personagem minha

“A Silvina”

Que por acaso era a minha avó…

Meu filho

Um dia

“Esqueci-te”

Nem os teus ossos

Nem os teus carinhos

Nada

Meu amor

Nada voando nas campestres avenidas do sexo

Hoje

Hoje sinto-me “o maior filho da puta do mundo”

Um dia

Sem ti

Meu amor

E repentinamente

Escrevo meu amor

E no computador aparece…

Mar…

Coisa estranha

Meu amor

Já devia estar embrulhado em mim

E não

Eu aqui a escrever parvoíces

O amor

Como se eu fosse Doutorado em “O Amor”

Nada

Doutorado não sou

Licenciado sou quase

Mas tu

Meu amor

És a poesia vibrante das tendas de circo

O sexo na ardósia do sexo

Dois homens beijam-se

Meu amor

Como o Tejo se beija

A cada regresso

Olhei-te

Corrias de livro na mão

E eu

Eu tive a sorte de encontrar uma das personagens

Não

Não era a minha avó

Era a “Deusa das Crenças Perdidas”

Ouvir-te sem sentido

Nenhum

Esta triste noite

Sinto-me triste

Meu amor

Esta semana

Parece um túnel sem fim

Nada

Não aconteceu nada

Mas…

Mas adivinho qualquer coisa

Ou o regresso de um grande amor…

… Ou a partida de um grande amado…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 21 de Abril de 2015