sábado, 10 de janeiro de 2015

O enforcado barco da insónia


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Habito nesta cáfila cúbica de palavras envenenadas pela insónia
oiço o cheiro das sílabas camufladas pelos rochedos da madrugada
não me perguntes porquê...
quando deixo de sentir o sorriso nocturno dos candeeiros em flor
há neste jardim pássaros ferozes
incendiados pelo incenso
que gritam
guerreiam... e sonham
e sonham como se estivessem esquecidos numa ilha sem nome
um barco desnorteado
enforcado
nos lábios da cidade de vidro...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 10 de Janeiro de 2015

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Quem és... feiticeira dos meus sonhos?


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


quem és?
Feiticeira dos meus sonhos
poema da minha infância
orgasmo da tarde junto rio
quem, quem és?


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 9 de Janeiro de 2015

Em socalcos


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


tento mergulhar nos teus braços
como se eu fosse um deserto esquecido no mapa
como se eu fosse um cubo de areia
ou... ou uma rua sem nome
na cidade que incendeia
e come
as palavras da liberdade
as palavras da madrugada,
o fumo constrói nos meus lábios montanhas de neve
e fios de gelo
lâmpadas de silêncio
e medo...
e tento
tento mergulhar nos teus braços
como uma criança faminta
uma árvore encaixotada
que o Oceano transportou
e perdeu...
num qualquer porto
numa qualquer baía,
e eu
eu não sabia
que os teus braços são de porcelana
que o teu corpo são socalcos olhando o rio...
e poisa na minha cama
em cio.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira. 9 de Janeiro de 2015

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Carta

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Entras-me em casa
e aposentas-te nos meus braços
escrevo palavras nos teus olhos
vagueio sobriamente nos teus seios
entras-me em carta como se fosses uma carta
lembras-te?
daquelas onde desenhavas corações
flores
e eu?
círculos e quadrados,
equações,
a cidade arde no sexo desejado
o amor alicerça-se à sombra do teu corpo
e eu?
um acorrentado,
morto.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 8 de Janeiro de 2015


O feiticeiro dos barcos plastificados


(desenho de Francisco Luís Fontinha)

O lavatório permanecia triste, havia uma sombra ensanguentada de lágrimas,
Não percebi,
No espelho, o meu rosto desintegrava-se como se eu fosse um cometa, um pedaço de cartão, ou... ou uma caneta escondida numa mão, um muro sólido, robusto... um pulmão quase a rebentar, e os cigarros dançavam sobre os meus ombros, e as palavras atrapalhavam os meus sonhos,
Não percebi, as ratazanas nos cinzeiros de prata, esqueletos de cigarros esperando a chegada do cangalheiro, e no cemitério alguém perguntava
Morreu de quê?
Porra,
E no cemitério alguém perguntava se as cidades são os esconderijos do amor, se as ruas são os sorrisos de uma qualquer flor, e que não, pode lá ser, respeitadamente respondi-lhe
Morreu,
Morreu enquanto olhava a tristeza do lavatório e tentava conversar com a sombra ensanguentada de lágrimas, nada mais do que isso,
Isso... o quê?
Trazia um casaco bordado com lantejoulas, durante a noite sentia-me o palhaço mais pobre do circo da minha aldeia, nunca tinha poisado a minha mão na neve,
Mãe... o que é a NEVE?
Morreu de quê?
Porra,
No espelho, os alicates da saudade suspensos no olhar da madrugada, uma canção voava sobre os telhados de silêncio, não,
Medo?
Nunca tive medo...
Não, nunca tinha tocado na neve, não, nunca tinha sido aliciado pela geada em plena madrugada, e o feiticeiro dos barcos plastificados gritava
Morreu...
E o barco não flutuava, lançava-me ao tanque público... e mergulhava para salvar o meu barco plastificado, e percebi
Não
E percebi que tinha sido enganado, este maldito barco nunca sairá deste tanque sem nome, nómada, anónimo
Como eu?
Sim como eu,
Sim... sim como tu,
E hoje, sinto saudades do lavatório de ferro... e rangem as suas tenras pernas recheadas de reumático, como rangiam os meus dentes quando a geada comia a madrugada,
Medo?
Não, nunca tive medo...
Mãe... o que é a NEVE?
Morreu de quê?


(texto de ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 8 de Janeiro de 2015

A caneta


uma caneta no silêncio da noite
vagueia na mão da liberdade
beija palavras
e abraça-se aos desenhos que só as paredes de um olhar
conseguem projectar
na madrugada de uma cidade…
não há covarde
ou idiota
… ditador
cabrão…
que com uma espingarda
ou canhão
consiga amedrontar
a palavra
disparada
pela caneta no silêncio da noite!



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 8 de Janeiro de 2015

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Um lápis consegue derrubar um exército de idiotas...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 7 de Janeiro de 2015