quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Sou um estranho… no teu peito


Sou um estranho teclado
dentro do teu peito,
sou a manhã na boca da insónia...
e perco-me nas tuas mãos
como um pássaro em sofrimento,
surpreendo-me com o teu olhar entranhado na escuridão,
pareces um cortinado invisível,
uma espingarda de papel...

sou um estranho teclado
dentro do teu peito,
sou os rochedos incinerados
que escondem as tuas palavras,
e nunca tenho tempo para abrir a janela
do teu coração,
sou um emaranhado de estrelas
sem passado nem canseiras,

Sou um estranho...
… no teu peito,
visto-em de negro
e confundem-me com a noite,
sou o silêncio dos teus cabelos
e a cartilha dos teus medos...
sou a clarabóia do teu sorriso
quando lá fora...

gritam o meu nome em vão,
e eu, e eu nunca tive um nome,
uma pátria,
uma bandeira,

nem... nem paixão...

gritam o meu nome em vão,
e o teclado estranho
que habita no teu peito...
chora... chora como a bala de um canhão.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 10 de Dezembro de 2014

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Jardim de transeuntes


As manhãs são límpidas tristezas
Que só o vento consegue abraçar,
Parar no semáforo e olhar a rosa mais bela
Do jardim de transeuntes em movimento,
Tem no sorriso a bandeira da paixão
E nos lábios…
A doçura inseminada das palavras,
Do vermelho…
O verde verdade
Da esperança…
As manhãs são límpidas tristezas
Que vergam o frágil esqueleto da cidade,
Não tenho tempo para desenhar
A saudade na mão de quem me espera,
Não tenho vontade de abrir a janela
Deste quatro latas cansado,
As manhãs são límpidas tristezas
Que só o vento consegue abraçar,
São rosas transeuntes suspensas no mar…
São palavras ignoradas,
Sombras deitadas na estrada,
As manhãs
São… límpidas tristezas
Sem tempo para amar…



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 9 de Dezembro de 2014

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

As pálpebras do poema


Não sabia que o teu nome
era apenas um nome
uma solitária palavra
sem alma
sem coração
sem... sem barcos ao anoitecer,

não sabia que o teu nome
era apenas um nome
sem corpo
sem sombra...

não sabia que o teu nome
era apenas um silêncio
sem imagens
sons
ou... ou fotografias
em constante mutação,

não sabia
não sabia que o teu nome
era apenas uma assombração
uma cidade esquelética voando no pôr-do-sol,

(Não sabia que o teu nome
era apenas um nome
uma solitária palavra)

como as pálpebras do poema antes de ser o poema,

não sabia que o teu nome
era apenas um nome
um soluço mastigado nas sílabas do Diabo...
não sabia
que... que o teu nome
é como a areia húmida
e o mar apaga todos os seus desenhos
como a morte... apaga todos os seus corpos...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 8 de Dezembro de 2014

Sinfonia da paixão


Sou um ignóbil cemitério de cinzas
recheado de falsos amanheceres
e de tristes madrugadas,
sou um pirata
que tem medo da noite,
sou... um pirata
de lata,
que chora e branca
nas sanzalas da infância,
sou uma sombra com odor a insónia
que não se cansa de lutar,
sou um ignóbil cemitério de cinzas,

prateadas
amadas
e cansadas...

arde a cidade do meu corpo
como plumas de sílabas enraivecidas,
tenho um livro na algibeira
sem palavras...
sem... sem brigas, sem... sem vírgulas,
sou um covarde vestido de luar
sou um desalmado com medo...
com medo de amar,

sou um ignóbil cemitério de cinzas
recheado de falsos amanheceres
e de tristes madrugadas,

sou a bailarina do desejo
em busca do sexo barato,
sou rua,
sou... sou lagarto,
sou... sou prostituta,
sou a âncora dos teus abraços
quando emerge em ti a sinfonia da paixão,
e todo o amor morre em tesão...

simplificado
os meus lábios inseminados pelos teus seios,
esta cidade que saltita no meu amor...
e me acolhe nos seus rochedos.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 8 de Dezembro de 2014

domingo, 7 de dezembro de 2014

Gaivotas & Revoltas


Oiço as tuas palavras mastigadas em prazer,
sinto o círculo das tuas coxas alicerçado ao centro geométrico do meu corpo,
somos apenas um ponto perdido no espaço...
traçamos parábolas na cintilante areia do Mussulo,
e há na tua pele de neblina adormecida... flores,
gaivotas,
revoltas,
palavras gritadas em vão...
e gemidos rochedos ao pôr-do-sol,
não habito em ti... mas há barcos nas nossas veias,
cansados de amar...
marinheiros sem pátria,
toda a gente nos apedreja com silêncios
e medos desgovernados,
somos um ponto em movimento,
temos coordenadas,
e... massa,
a luz que nos ilumina esconde-se entre a chuva miudinha do fim de tarde,
e toda a gente,
em delírio...
chicoteando as nossas sombras,
em pedaços de fotografias embriagadas pelo suicídio...
oiço as tuas palavras mastigadas em prazer,
nesta cidade em ruínas...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 7 de Dezembro de 2014

Palavras sem paixão


Todos nós
somos anfíbios poetas,
algas de acariciar...
todos nós somos estrelas em solidão
nuvens por catalogar...
palavras sem paixão...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 7 de Dezembro de 2014

sábado, 6 de dezembro de 2014

O menino da preia-mar


Há feridas invisíveis no teu sorriso
que nem o espelho da saudade consegue desenhar,
pareces uma fotografia embalsamada,
sem alma...
esquecida num qualquer lugar,
há feridas invisíveis...
e crateras de espuma
que só as tuas pálpebras alicerçam às meticulosas palavras sem destino,

em ti o menino vestido de preia-mar
que corre e correr... e corre sem se cansar,
em ti e de ti...
as feridas entristecidas dos biombos nocturnos da vaidade,

esta cidade,
o teu corpo vagueando no sexo da paixão
como um cadáver enraivecido... fundeado no rio sombreado pelo incenso...
uma carta sem destino que te bate à porta,
um carro preguiçoso em tristes aventuras,
há feridas invisíveis no teu sorriso
que os cigarros da despedida alimentam,
mas... mas no teu olhar cessaram as lágrimas de chocolate,

em ti
e de ti...

a mentira do silêncio embrulhada na portaria
de pequeníssimos fios de luz,
o teu livro preferido que arde... enquanto se extingue o dia,
dentro dos teus seios,

em ti
e de ti...

o cansaço abstracto das montanhas de papel,
os rochedos envenenados pela noite dos marinheiros
e que tu não entendes os seus medos
e inquietações,
não me ouves... porque a minha voz pertence ao cacimbo
e do cacimbo emerge como uma lâmina de sangue,
em veias de nylon
ao deitar.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 6 de Dezembro de 2014