domingo, 10 de agosto de 2014

A cidade dos mendigos


Esta cidade de mendigos,
sem porto para aportar,
estes esqueletos vivos...
sem corpo para transportar,
esta nudez das árvores silenciosas,
que brincam na areia límpida dos cigarros de arder,
esta lua, este luar... esperando o amanhecer,
esta cidade de mendigos,
estes rochedos que servem de abrigos...
sem porto para aportar,
esta noite ventosa,
fria..., amarga... sem lábios para beijar,

Esta cidade moribunda,
quando o poeta espera o regresso do amor,
estas correntes de luz sem sabor...
que me aprisionam ao teu olhar,
este cansaço, estas montanhas de abraçar...
que se escondem nos teus seios de triste madrugada,
esta cidade,
esta cidade amaldiçoada...
vestida de rosa sem odor,
triste, febril... esta cidade imunda,
onde passeiam os peixes, e as algas... e os corações sem cor,
esta cidade, esta cidade que vive nas lâminas da saudade.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 10 de Agosto de 2014

O silêncio magoado


Há na tua voz um malmequer apaixonado,
um triângulo equilátero em desejo,
há nos teus lábios um jardim profanado,
uma árvore vestida de beijo...
há na tua voz um corpo cansado,
uma mão atrevida que semeia nos teus seios a liberdade,
há na tua boca o silêncio magoado,
que constrói madrugadas e jangadas envidraçadas,
o teu corpo arde, o teu corpo mistura-se com as serpentes envenenadas...
há no teu olhar um Oceano de saudade,
uma canção perdida na cidade,
há na tua voz um malmequer apaixonado..., um sorriso de criança procurando a felicidade!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 10 de Agosto de 2014

sábado, 9 de agosto de 2014

Menina das insónias ondas do Oceano desejar!


Pertences ao desejo amanhecer,
és a amante dos meus braços cadentes que a noite absorve,
pertences à cidade florescente dos rochedos sem nome,
és o beijo disfarçado de manhã adormecida,
e há na tua pele uma pluma doirada, e amar-te parece um poema inacabado,
és mulher, és a poesia das árvores dançando com o vento,
és o luar, és o alimento...
dos veleiros passeando no mar,

Pertences ao rio cansado de amar,
és a filha das sanzalas de papel com odor a neblina,
és a menina dos olhos de sisal...
és o beijo,
és o texto embriagado com as palavras de cristal,
e há nos teus lábios um labirinto de doçura, um poço de silêncio envenenado...
que me engole, que me embrulha... como se eu fosse o teu corpo,
o corpo que desenha prazer no teu corpo de algodão,

Pertencerás-me um dia?
Menina das insónias ondas do Oceano desejar,
tens nos teus olhos a textura dos cortinados de néon que inventam o amor,
menina,
menina dos abstractos nocturnos que povoam os teus seios...
dos pássaros, dos pássaros que poisam nas tuas coxas cinzentas,
pareces a montanha nua..., pareces a Aurora Boreal dos cinzeiros de prata,
… pertencerás-me um dia? Menina..., menina das insónias ondas do Oceano desejar!



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 9 de Agosto de 2014

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

O trigo silêncio da madrugada


Serás a eterna folha de papel,
a pele húmida da tempestade que me embrulha quando cai a noite na eira de Carvalhais,
oiço o espigueiro atrapalhado no interior das canções de um sino em delírio...
oiço a tua ofegante voz quando tentas tocar-me... e foges, e desapareces no trigo silêncio da madrugada,
serás a eterna folha...
onde vou escrever os meus beijos, onde vou escrever as minhas caricias e os meus desejos,

Serás o rio onde me vou sentar,
os socalcos seios onde poisarei a minha cabeça...
depois... depois de acordar,

Serás a migalha de prazer que deambulará numa cama inventada,
os lençóis de seda que as tuas mãos aprisionam..., os sótãos do amanhecer,
e os gemidos quando és penetrada,
serás o luar,
e os versos ensonados das manhãs de liberdade,

Serás a eterna folha de papel,
a tinta ensanguentada dos orgasmos poéticos,
serás a eterna claridade dos espelhos de brincar,
o carrossel de uma cidade..., o cansaço de uma noite de amar,
serás o trapézio que se esconde na ardósia da tarde...
… a geometria nocturna de um corpo entranhado pelo poeta sem nome!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 8 de Agosto de 2014

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

O beijo poético…


Meu amor,
Existes?
Perturbo o teu sono,
Visto-me de abelha e brinco na colmeia da tua insónia,
Sorris, brilham nos teus olhos as minhas palavras,
Habitam nos teus seios os meus desejos, os meus versos…
O rio que corre nas minhas veias,
Há dentro de mim uma África perdida,
Socalcos, vinhedos…
Barcos coloridos que atracam nas tuas mãos,
Meu amor,
Existes?

Perturbar o teu sono é poesia,
São canções inventadas por estórias, são searas de trigo dançando ao som do vento…
Perturbar os teus sonhos, deitar-me no teu corpo… como se eu fosse a tua pele de alecrim em flor,

A montanha que nunca dorme,
O luar que jamais cessa de brilhar,
Meu amor,
Existes?
Nas frívolas manhãs de Primavera, e… e absorver os teus lábios de livro em construção,
Percorrer o silêncio de uma ponta à outra, sem me cansar de te olhar,
Sorris…
Olhas-me…
Existes?
Estrela-do-mar,
Que me ilumina ao deitar,
E sem pressa… e sem pressa ofereço-te o beijo poético…



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 7 de Agosto de 2014

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Um dia dia vou regressar?


Nunca vi o teu nome escrito na fogueira da tarde,
imaginava-te uma serpente de luar enrolada no pescoço da noite,
tinha medo de ouvir a tua voz, tinha medo... da minha própria voz,
sabia que havia um espelho onde habitavas, um espelho mágico onde aparecias depois de cessarem todas as luzes em mim,
sentava-me sobre a ponte metálica da sonolência, inventava silêncios para não ouvir os teus gemidos,
desenhava-os como se eles fossem o acordar da manhã no pulso de um mendigo de aço,
e acreditava nas palavras não ditas, aquelas que tu escondias junto ao teu peito de anémona-do-mar,
sem vontade de amar,
sem vontade de viver...
nunca vi o teu nome nas ardósias madrugadas de suor,
quando uma cama recheada de sombras cobria a tua pele...
uma janela que se suicidava, e tombava no pavimento térreo da saudade,

Uma criança que chorava, e tu, e tu pensavas que eram os mabecos enfurecidos pelo cacimbo,
e afinal, e afinal eram apenas as mãos do desejo a penetrarem em ti,
desgovernada mulher dos sete lençóis de prata...

Tínhamos uma palhota com pernas de solidão,
e nunca vi o teu nome... escrito... na fogueira da tarde,
hoje, hoje sei que a tua voz é de cristal, e com a tempestade... quebrar,
grãos de amêndoa voando na algibeira do Tejo,
os cacilheiros em apitos joalheiros, e cansados de tantas viagens sem regresso...
um dia dia vou regressar?
Nunca soube a resposta aos apelos do Oceano,
num recreio de escola, uma criança vestia-se de estátua, no seu pedestal apenas uma flor amarela, e não palavras, e não... e não sorrisos,
e... e não sonhos,
nunca via o teu nome,
em mim...
como as escoras da insónia nas frestas do gesso envelhecido.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 6 de Agosto de 2014

terça-feira, 5 de agosto de 2014

O Acrílico Corpo


(À minha amiga Isa V.)


No acrílico corpo esconde-se a madrugada,
escrevê-lo parece impossível, acariciá-lo... o acrílico corpo voando nos meus braços de papel,
entre flores doiradas e alicerces de suor,
sentir na tua pele a humidade do silêncio,
entranhar-me em ti... eu a gaivota do amanhecer,
no acrílico corpo, as coxas montanhas recheadas de luares de incenso,
os rochedos do medo evaporando-se em pedaços de gemidos...
os cortinados da manhã esganiçados contra a janela do prazer,
e do teu acrílico corpo, uma maré de sílabas invadindo o teu sorriso,
escrevê-lo... parece impossível,
numa cama de luz o teu acrílico corpo nu...
esperando os meus desenhos vestidos de palavras!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 5 de Agosto de 2014