quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Partida

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


O dia suicida-se junto aos cedros
poisa na minha mão as suas lágrimas de chocolate
acende um cigarro
esconde os lábios na sonolência da cidade de prata
e parte
sem deixar saudade...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 26 de Fevereiro de 2015


quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

sombra envenenada

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


o imaginado silêncio
pela orquídea do desejo
palavra por palavra
o sangue que foge da veia amaldiçoada
como a charrua
entranhada
na terra...
abraça-se ao poema
fingindo que amanhã não há madrugada
nem amanhecer
esta cidade inventada
em páginas de cartão

o imaginado silêncio
na mão
de uma sombra envenenada
ele espera pelo regresso da amada
mas o amor é uma carta
sem palavra
sem nada
que só a morte sabe reconhecer
quando o mar entra dentro de casa
e gritam
os barcos encalhados
nos semáforos da saudade...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 25 de Fevereiro de 2015


terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

as ruas húmidas do desejo

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


quando as palavras semeadas no papel envelhecido
morrem
aquele que as escreve
despede-se
entre lágrimas e falsos sorrisos
um desenho insignificante
poisa docemente no vulcão da madrugada
sem mágoa
ou... ou paixão
abraça-se à noite dos tristes aconchegos
grita pelos sonhos
e... e em vão...

percebe que a vida é um triângulo de luz
voando nas ruas húmidas do desejo
tenho medo do silêncio
e do cansaço dos dias junto ao rio...
aquele que as escreve
despede-se
e parece um vadio
esmiuçando ossos e cigarros
ou... ou talvez não...
porque tem no corpo um vazio
um buraco negro recheado de insónias e imagens sem nome
como têm os pássaros nos prismas imaginados por uma árvore doente...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 24 de Fevereiro de 2015


segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

 
(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Os sete orgasmos do Mussulo, a liberdade sobre as palmeiras invisíveis que me atormentavam, como campânulas de sofrimento, ao deitar, o caixão que dançava deixou de o fazer, dificuldades com o cachê, dispensa de artistas e cadáveres de cera, um altar recheado de almas, tantas almas como os versos do sem-abrigo quando sentado numa cadeira apodrecida de um circo ambulante,
Quero ser artista, mãe!
Nem penses..., nem... penses...
Filho meu não é artista!
Nunca,
Nunca, mãe?
Os sete, juntos, e sós, no Mussulo era mais barato, a saia descaída, o soutien desenhado no peito
E...
Nunca, mãe?
Nunca,
Nunca
No peito uma flecha de sémen rodopiando no gelo do ringue de patinagem,,,, o belo, a dança... e o corpo em pequenas rotações...


(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 23 de Fevereiro de 2015

fotografia

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


o triturador do sono
mergulhado nos teus olhos incandescentes
tens nos lábios o pingente beijo
iluminado pela saudade
entre quatro paredes
paredes
sós
nem porta
janelas
cubículo de prata
onde habitam todos os cheiros da cidade...
as abelhas do amanhecer saboreando a tua pele de mel
como se tu
janelas
fosses um pedaço de pólen
ou
nem portas
e nas paredes
as frestas da insónia
sombreadas
e acorrentadas
às sílabas enforcadas
do velho barco de esferovite...
que em criança eu brincava.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 23 de Fevereiro de 2015


Um sem-abrigo, sem... e sem mundo...

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


A morte dos esquissos preguiçosos e das palavras enamoradas,
o fogo do poema invadindo a biblioteca assombrada pelos cortinados vivos dos esqueletos de papel,
cá dentro, marés de solidão abraçam-se aos lápis e canetas abandonadas sobre a secretária,
os papeis parecem doentes, empilhados numa qualquer enfermaria...
esperam,
desesperam,
e acreditam que um dia vão ressuscitar...
mentira,
nunca o farei,
porque os papeis são para destruir
juntamente com o meu corpo de granito vagabundo,
um sem-abrigo, sem... e sem mundo...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 23 de Fevereiro de 2015


domingo, 22 de fevereiro de 2015


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


A aldeia padece de claridade, existem fios de escuridão nos telhados cansados das palhotas de algodão,
Enigmático, eu?
Nunca tinha assistido à dança de um caixão...
Já imaginaram o dançar de um caixão?
Há tripas e...
Moelas,
E palavras sem coração, sentia-me embriagado nas mãos do amanhecer, sentia-me um miúdo encostado à sonolência da idade,
A aldeia em chamas, os campos esbranquiçados na tela do desejo imaginavam canções de moluscos e alguns grãos de areia,
O desenho teu na cidade dos alicerces alienados, os bares em combustão, as miúdas dançando canções de solidão,
Amas-me?
Que não,
Que a arte vive e vai morrer no teu olhar,
Ouves-me?
E palavras sem coração, avenidas nuas, travestidas de machimbombos reumáticos voando sobre a cidade, eu... eu... adormecia,
Inventava beijos nos teus braços, a minha primeira paixão, imaginava-te uma flor triste e cansada, nos circos ambulantes da saudade,



(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 22 de Fevereiro de 2015

Estátua de gelo...

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


O amor suicida-se nos lábios do sorriso de xisto,
uma carta poisa respeitadamente sobre uma almofada granítica,
impregnada de silêncios
e fósforos adormecidos na inocência do poema,
faltam-me as palavras...
oiço-o nos braços do seu amante,
inventado beijos
e livros entranhados nos socalcos do desejo,
há no Outono uma noite em despedida,
a sinfonia da saudade
nas clarabóias do sexo,
e lá fora todos os transeuntes são imagens a preto e branco,
expostas numa parede branca,
descendo a calçada,
virava à direita,
o engate,
a rua,
em nada,
como lâminas de sono contra as marés de prata,
não quero os sonhos
nem os seios dos caixotes de vidro
que habitam as minhas mãos de medo,
o amor suicida-se
nos lábios do sorriso de xisto... e a penumbra é uma estátua de gelo...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 22 de Fevereiro de 2015


(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Eles chegaram, o caixão ainda cheirava à tinta fresca da manhã, brincava um silêncio de olhos verdes no vão de escada,
Foder num vão escada, como fodem todas as palavras do poema...
Sabíamos que o corpo não pertencia às nossas vidas,
Clandestino, eréctil nas disciplinas do abismo, o poema esfomeado esperando o amante suicidado,
amanhã, amanhã nascerá um cansaço de medo no afastamento dos círculos das cidades embriagadas,
Sem iluminação, sem mulheres ou bares para combater a distracção, uns panfletos expostos na parede xistosa,
Há Tripas,
O caixão dançava no centro da sala de estar,
Confesso,
Nunca tinha assistido à dança de um caixão...
Já imaginaram o dançar de um caixão?
Há tripas e...
Moelas,



(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 22 de Fevereiro de 2015


sábado, 21 de fevereiro de 2015

Calçada imaginada

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Imagino-te
nua
e triste
como uma calçada
ou uma simples rua...
mas tu não és uma calçada
nem és uma rua...
imagino-te
sentada
no jardim das acácias abandonadas...
mas tu
não és um jardim
nem és uma acácia
porque tu não és nada
nem imagem a preto e branco
nada
nada
apenas uma sombra descendo a calçada
imaginada...



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 21 de Fevereiro de 2015