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quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019


Da tarde emancipava-se a lunar luz do horizonte, tenho lágrimas nos olhos sombreados pela tempestade, como ontem, o limite entardecer que ofusca a madrugada, não sei se acordará em mim o feitiço do entardecer, está frio em ti, tens na mão o silêncio da noite, somos dois,

Perco-me em ti,

Somos dois pássaros revoltados com o orvalho, diariamente sentimos as frestas da sonâmbula rua adormecida, só e triste,

Perco-me em ti,

Triste nos horários invisíveis, a cidade acorda, submete-se ao abismo,

Tenho medo, mãe.

Perco-me em ti, meu amor, desde a infância até hoje, perco-me em ti todas as manhãs quando acordam as árvores do meu quintal, os pássaros, mãe, os pássaros choram por ti, e

perco-me...

E sei que não regressarás mais aos meus braços, e sei que deixarei de escrever nas tuas mãos as palavras adormecidas pela chuva gélida de Inverno, saberás que um dia vou navegar para longe, saberás que um dia serei duzentos e seis ossos em fino pó, como a terra que nos alimenta nas estrelas,

Perco-me.

Da tarde, uma gotícula de tristeza desce o teu invisível cabelo, saberei que amanhã não estás, saberei que amanhã as minhas mãos serão tábuas de silêncio suavemente suspensas no teu rosto,

Perco-me em ti, meu amor,

Sabes, mãe?

Trinta dias sem rumo a navegar nesta barcaça,

Tens medo, filho?

Trinta dias escrevendo nas ondas o teu nome, desenhando o vento nas nuvens dos teus lábios, e, um dia vamos acordar na longínqua Luanda, com palmeiras, com capim e mangueiras...

Tens medo, filho? Não, mãe, não tenho medo da tua sombra ao acordar.





Francisco Luís Fontinha

28/02/2019

sábado, 24 de novembro de 2018


Podia desenhar-te o Céu.

A vida é um suspiro, a casa vazia, triste e a tremer de frio…, o cansaço do amanhecer perdeu-se no teu olhar, respiras, sofres por mim, e não o queres demonstrar.

Sabes, tenho medo dos pássaros, que deixem de voar, que fiquem estonteantes, como eu, ao ver-te aí deitada, tenho medo da madrugada, porque amanhã não sei se vou ler nos teus olhos a palavra amo-te…

E é tão triste, e é tão belo, todo este silêncio que nos abraça.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 24 de Novembro de 2018

domingo, 28 de janeiro de 2018

A dança da chuva


O resto a gente dá um jeito.

As cabras no monte,

O meu corpo submerso nas pedras coloridas da manhã,

Os sonhos, as palavras que dançam com os sonhos, na esperança de um novo amanhecer,

Amanhã a gente dá um jeito,

Qualquer coisa serve, apenas uma sílaba de luz,

As mãos trémulas quando o teu sorriso acorda,

Após quatro horas de sofrimento,

Tens o olhar límpido, clareado como a areia do Mussulo,

Os barcos dançando no teu finíssimo cabelo de espuma,

E zás, cais sobre mim.

O mar que se afunda em ti, mergulha nos teus ossos, e da noite regressa um lápis desajeitado, como eu, descubro o sonho, finjo arder no sofrimento, mas em ti, apenas em ti oiço o amanhecer,

A dança da chuva, as flores donzelas sobre o teu peito, e uma vela acesa pela tua alma…

Há coisas estranhas em ti,

Camélias,

Cravos,

Rosas…

E as velhas salinas brincam nos teus olhos.

Amanhã.

Quando se levantar em ti a alvorada.

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 28 de Janeiro de 2018

domingo, 21 de janeiro de 2018

Jangada de nylon


Os poemas morrem na tristeza do teu olhar.

Como sofre o dia nos teus ombros,

Enquanto lá fora, ainda noite, uma jangada de nylon gagueja em frente ao mar,

As lágrimas no teu rosto,

O silêncio das tuas mãos quando afagam o meu rosto…

Distante maré no meu corpo abalroado nas insignificantes janelas de vidro,

Os tentáculos de seda, todas as coisas impossíveis, nas tuas mãos,

Quando regressa a madrugada.

Choras.

Escreves nos meus braços as palavras invisíveis da tempestade,

Os barcos ancorados aos teus dedos…

E sofres.

E morres de mim.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 21 de Janeiro de 2018

domingo, 14 de janeiro de 2018

Cabeça de xisto


Lívido sacrifício das noites indomáveis,

Os livros da despedida esquecidos no espaço,

Viagem sem regresso,

Habito neste pobre musseque,

Que deambula pela madrugada do meu sono,

Os esqueletos teus no vidro meu,

Uma cabeça de xisto suspensa na alvorada,

E as dores que assolam o teu corpo, e as dores que dormem na tua cabeça…

Despedidas madrugadas sem dormir,

Pensando em ti,

Como uma jangada livremente sobre as nuvens…

Tenho em mim o sono da morte,

E o desejo do abismo,

Os cartazes escondidos no meu quarto,

Caras, rostos desfocados, simplesmente abandonados,

E deixo na tua mão o silêncio do rio,

Que entre montanhas,

Corre nas tuas veias…

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 14 de Janeiro de 2018

domingo, 22 de outubro de 2017

Os livros sobre a mesa


Nas cinzas do meu corpo

Habitam as palavras do fogo sombrio do sofrimento,

A dor semeia-se na terra cansada da minha mão,

Quando o luar adormece, quando uma flecha sangrenta se espeta no meu coração,

Domingo à noite,

Música fúnebre para me alimentar,

Palavras que voam em direcção ao mar…

E te levam, e te levam para o Oceano da tristeza,

E fica a beleza,

Os livros sobre a mesa…

Escrevo-te,

Imploro-te…

Que fiques, aqui, comigo…

À lareira.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 22 de Outubro de 2017

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Agradecimento

Fernando Martins Fontinha
29-11-1938 / 29-07-2015
 
Em todas as guerras há sempre um vencedor e um vencido. Infelizmente perdemos a guerra e venceu a doença. Nem sempre é assim, e é com enorme felicidade quando temos conhecimento que alguém ganha esta guerra.
Tudo foi feito por parte do IPO-Porto e seus Profissionais, tal como da nossa parte, eu e a minha mãe.
Quando se fala tão mal do nosso SNS, apenas queria deixar algumas considerações; se o meu pai tivesse uma vida contributiva até aos 100 anos, provavelmente não pagaria um décimo do que esta Instituição gastou com ele (cirurgia, radioterapia, quimioterapia, tratamentos inovadores, PET´S vários…, etc.). Nunca nos disseram que não fazia isto ou aquilo porque era dispendioso.
Durante as sete semanas de Radioterapia ficou na Liga Portuguesa Contra o Cancro – Núcleo Regional do Norte sem qualquer custo para nós. Veio a falecer na Unidade de Cuidados Paliativos sita no edifício da Liga Portuguesa contra o Cancro.
Perdemos a guerra mas o nosso “General” tombou com toda a dignidade, nunca recusou nenhum tratamento, nunca nos falou que ia morrer… lutou até ao último segundo de vida.
 
Agradecemos:
 
IPO-Porto e todos os seus Profissionais. Foram fantásticos;
Liga Portuguesa contra o Cancro – Núcleo Regional do Norte e seus voluntários;
Unidade de Cuidados Paliativos do IPO-Porto e todos os seus Profissionais;
ECCI de Alijó;
Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Alijó (Direcção, Comando e Corpo Activo). Um grande obrigado por todo o apoio e amizade;
Aos nossos familiares e amigos;
 
Terminamos com a mensagem recebida de uma Profissional da Clinica da Pele, Tecidos Moles e Ossos, após o conhecimento do falecimento do nosso ente-querido:
 
Sinto muito, mesmo muito Sr Francisco! O Sr Fontinha foi um guerreiro, um lutador, Grande Homem! O senhor foi um filho exemplar, sempre presente e a acompanha-lo e a sua mãe uma grande mulher, uma verdadeira companheira! Partilhamos a vossa dor... vocês são o exemplo do que uma família "a sério" deve ser, muitos parabéns por isso! Um grande beijinho de toda a equipa.”
 
Obrigado a todos
 
Arminda Fontinha
Francisco Luís Fontinha


terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Momentos

(desenho de Francisco Luís Fontinha)


Momentâneas alegrias...
prolongadas tristezas,

momentos,

despedidas...

esta vida!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 6 de Janeiro de 2015

terça-feira, 11 de março de 2014

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Finjo que os bonecos são pessoas

foto de: A&M ART and Photos

Despeço-me da vida inventando uma outra forma de viver, despeço-me dos barcos reais e com âncoras e com correntes e com pulmões e com mãos e com lábios e com beijos, e no entanto a vida gira como uma roda dentada, fria, escura... despeço-me das árvores levando a saudade dos pássaros, despeço-me dos cigarros levando a saudade dos cigarros, despeço-me do amor levando na algibeira o verdadeiro amor,
O medo de dizer
Amo-te,
De dizer que dentro dos corações de xisto vivem mulheres que desejam palavras, beijos... carinhos... sombras e marés, cortinados, bebés, de dizer
Amo-te,
Palavra difícil, a palavra mais difícil de pronunciar, engasgo-me e não o consigo, escrevo-a como castigo cem vezes na ardósia da escuridão,
(Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te...)
E depois como o magala que não sabe qual é a sua mão direita
(o senhor trocou-mas)
Finjo que os bonecos são pessoas, finjo que as pessoas são corações apaixonados, finjo que sou feliz não sendo e nunca percebendo o que é a felicidade, o orgasmo literário das palavras em suspensão dilacerem-se nas cordas do estendal que habita no quintal, e alicerçam-se a mim mil e quinhentas garrafas de uísque reserva de quinze anos, apaixonei-me por uma trapezista pobre, quis fugir com ela e amava-a...
Os meus amigos desejam-me bom Natal, eu detesto o Natal e o Bom Natal, finjo que gosto e retribuo... mas confesso que não tenho alegria para pensar no Natal, no ano novo que se aproxima, um ano de merda como este final de ano, a vida de que me despeço deixa de fazer sentido, as palavras não existem, os desenhos são monstros comparados com a dor de quem sofre, chora e sinto lágrimas no quarto ao lado do meu, oiço-os cochicharem como gaivotas envenenadas, doces, medos despertam passados enterrados, lápides escondem-se na minha algibeira com três tristes chocolates... finjo fugir e covardemente... choro em silêncio,
(o senhor trocou-mas)
Sou transportado para o recreio da escola primária, desastradamente parto um dos vidro da janela da sala de aula com a bola de futebol do meu amigo que tem noção que eu sou um nabo em termos futebolísticos, nada percebo e tudo transformo em... cacos, pedaços de vidro...
(nos grupos de poesia onde publico dizem que os meus poemas são belos, tirando isso... acham-nos uma merda)
Troco de vida, de fingimento, de dor... agora... já consigo chorar, sofrer, sentir os pregos da desgraçada a penetrarem-se em mim...
(Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te...)
Troco de vida, de fingimento, de dor... agora... já consigo chorar, sofrer, sentir os pregos da desgraçada a penetrarem-se em mim... nos grupos de poesia onde publico os meus poemas... adoram-me, sinto-me um sobretudo pendurado num cabide dentro de um guarda-fato, oiço a minha sombra sobre a sombra dela, são apenas um corpo e deslizam como rolamentos calçada abaixo,
O Tejo,
Havia prostitutos à procura de engate, sentava-me numa esplanada, lia o “Doutor Jivago – Boris Pasternak”, e escrevia num caderno de capa dura e negra as palavras doces das bocas doiradas dos transeuntes e de vez em quando
O Alfredo colocava nos cornos da rena as lâmpadas de Natal, piscavam, alimentavam vozes embriagadas com o uísque de quinze anos, recordo-me hoje da morte dos livros que deixei ficar na prateleira por pobreza, insónia, toques de campainha a pedirem-me
O vizinho tem uma pitada de sal que me empreste?
E eu respondo-lhe
O vizinho nada tem,
O Tejo,
Tu toda nua, nos teus seios coloco os enfeites da árvore de Natal, danças, saltitas sobre os trapézios da infância, desejas-me boa noite e as melhoras do meu pai...
Não percebo a cor dos teus olhos,
(Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te...)
Despeço-me da vida inventando uma outra forma de viver, despeço-me dos barcos reais e com âncoras e com correntes e com pulmões e com mãos e com asas e com plumas e com mini-saia e com rímel e com... e com um metro de superfície a martelar-me no olhar as sílabas estonteantes dos dúcteis talheres de prata,
Covarde,
sinto-o quando a olho,
Neste momento bebo sem perceber que amanhã o livro pode arder na lareira do sofrimento, sem perceber
Porquê?
Despeço-me da vida inventando uma outra forma de viver, despeço-me dos barcos reais e com âncoras e com correntes e com pulmões e com mãos...
(Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te, Eu amo-te...)
Antes que seja noite e todos os que eu amo...
Morram.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 24 de Dezembro de 2013