Descem sobre mim as
lágrimas do Céu; percebo que transporto no olhar o pequeno silêncio da manhã e
sempre que me descuido, um pedacinho de tristeza se alicerça ao meu peito. E as
palavras parecem balas disparadas pela espingarda do desejo.
O que tem paixão em comum
com as lágrimas do Céu, meu querido?
Talvez tudo. Talvez nada.
Sabias que dentro da paixão existe uma equação sem resolução?
Não. Não sabia, meu
querido.
E que a paixão tem vida,
tem nome, tem sexo, idade, religião…
És parvo, meu querido.
E que Deus não sabe
matemática?
Parvo, parvo, parvo…
Tenho medo da tua mão
silenciosa, tenho medo dos teus olhos em profunda tristeza, quando ambos
sabemos que dentro de ti habitam as mais lindas recordações de uma infância
pincelada pelas marés em cio. Onde anda aquele menino dos calções que se deliciava
a olhar o mar e os barcos e a areia branca do Mussulo?
Vive dentro de um álbum de
fotografias a preto e branco… e dizem que voa sobre um rio curvilíneo embrulhado
em socalcos de medo.
A paixão, meu querido, é
o silêncio entre dois olhares e separados por duas rectas paralelas…
Mas duas rectas paralelas
encontram-se no infinito, minha querida…
Pois… não sei o que diga.
Imagina dois olhares
suspensos na manhã
Sim, estou a imaginar.
Imagina que sobre esses
dois olhares, em pedacinhos de mel, descem as lágrimas do Céu
Sim, consigo imaginar.
Imagina agora, meu
querido, que esses dois olhares têm um corpo, têm desejos, têm mãos que se entrelaçam
nos lábios do mar
Sim, minha querida.
E esses olhares e esses
corpos e essas mãos e esses desejos… voam sobre o mar pincelado de beijos,
enquanto no peito desses dois olhares, sem que alguém perceba, há um triângulo rectângulo
em que o quadrado da hipotenusa é igual à soma do quadrado dos catetos e
Não percebo, minha
querida.
E descem as lágrimas do
Céu sobre mim…
Não. Não sabia, meu
querido.
E que a paixão tem vida,
tem nome, tem sexo, idade, religião…
És parvo, meu querido.
E que Deus não sabe
matemática?
Francisco Luís Fontinha
Alijó, 15/09/2022
(Ficção)