quinta-feira, 16 de janeiro de 2020

As paredes de xisto


A fragilidade do corpo embrulhada no sono,
O cansaço das palavras, inertes, mortas,
Nas páginas sonâmbulas da tristeza,
O vento chora,
Traz a chuva,
Vai embora.

Todo o silêncio é pouco,
Quando os farrapos da saudade,
Envelhecem na escuridão,

A metáfora,
O sorriso das plantas,
Junto ao mar,

E inventam-se rosas em papel,
Comestíveis, às vezes, quando a fome é invisível,
Descendo o rio,
Saltando a ponte metálica,
Em direcção ao Sol,
Em direcção ao abismo.

Não quero pertencer a este conflito de interesses,
Caixas em cartão,
Revoltadas contra a geada,
A chuva, miudinha, perde-se na calçada.
E, no entanto,
Estou aqui,
Esperando o regresso das lâminas lágrimas,
Como se fossem balas de raiva, contra as paredes de xisto.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
16/01/2020

quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

As noites de mim


Não me digas as palavras que eu te prometi.
Ontem, reinava o silêncio, no interior do teu abraço,
As flores, cansadas de dormir, acordaram com o teu sorriso,
Dilacerado nas manhãs de Sábado.
Não gosto dos Sábados, meu amor.
Fico estúpido, burro,
Durmo na despedida do Adeus,
Às vezes, esqueço-me de almoçar,
Lanchar,
Ou… jantar,
Coisa pouca,
Ninguém morre por não comer.
Não me digas as palavras que eu te prometi,
Porque este livro em solidão,
Assusta-se com a minha voz,
Foge de mim,
Como um mendigo,
Ou… sem-abrigo.
Não,
Não me digas,
As palavras,
Em voz alta,
As palavras que eu te prometi,
E mesmo assim, hoje, escrevo-as no teu olhar.
Sinto-me cansado dos dias,
Das noites,
Sem dormir,
Vagueando num corredor escuro,
Sombrio,
Que me traz à lembrança, a morte.
Essa mesmo,
O final do dia,
O eterno desgosto,
Que abraçam os livros de poesia.
Oiço-te,
Lá longe,
Nas páginas esquecidas da sonolência das palavras,
E mesmo assim,
Grito,
Sufoco com os gritos das pedras,
Também elas, tristes, gastas, e, cansadas.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
15/01/2020

terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Os lábios da saudade


O silêncio apertado nos lábios da saudade.
O beijo suspenso na solidão nocturna do cansaço,
Há flores no meu jardim, envelhecidas,
Outras, cansadas,
Tristes rosas nas lágrimas da noite.
O pesadelo da infinita madrugada,
Quando traz a liberdade prometida,
Vaiada…
Garrida.
O texto que se escreve na penumbra,
Quando as palavras adormecem,
E, choram de alegria.
Regressa a morte,
Leva-o a passear,
Inventa amanheceres,
Como quando o poeta,
Derrama palavras emagrecidas,
A fome de viver,
A fome de caminhar junto ao rio,
E aquele silêncio,
Apertado,
Mergulha nos lábios da saudade.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
14/01/2020

domingo, 12 de janeiro de 2020

As cobras


(lavar a loiça, coisa e tal, arrumar a cozinha… decididamente, não tenho muito jeito para isto; sou melhor na poesia)


As cobras que habitam o meu jardim,
São silêncios de solidão,
São palavras suspensas na minha mão,
Dos livros absorvidos por mim.
As cobras que habitam o meu jardim,
São nuvens de espuma,
Brancura da vida,
No mar da despedida.
São transeuntes embriagados,
Ninhos de pássaro abandonados,
As cobras que habitam o meu jardim,
São a esperança de viver,
Estar calado,
Quando a Primavera acordar,
Sorrir,
E caminhar sobre os parêntesis do cansaço.
As cobras,
Que habitam o meu jardim,
São flores amestradas,
Papoilas envenenadas,
Pela geada,
Pela sombra da calçada.
As cobras,
Que habitam,
O meu jardim,
São lágrimas.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
12-01-2020

quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

O corpo


O corpo envergonhado pelo cansaço do amanhecer.
A tristeza das árvores que sombreiam o corpo envergonhado pelo cansaço do amanhecer.
As flores que atropelam o corpo envergonhado pelo cansaço do amanhecer.
As cinzentas cidades que abraçam o corpo envergonhado pelo cansaço do amanhecer.
O corpo envergonhado,
Atropelado,
Pelo cansaço do amanhecer.
O sangue que ilumina o corpo,
Circunflexa paixão,
Quando ardem as nuvens,
Cansadas do amanhecer.
O corpo vergado pela solidão,
No cansaço do amanhecer.
As mãos que sustentam o corpo,
Cansado pelo amanhecer.
O frio que beija o corpo,
O amanhecer cansado nas lâminas do corpo,
Que envergonhado pelo cansaço do amanhecer,
Chora,
Grita,
Morre,
Sem alma,
Sem vida,
Sem palavras,
O corpo uiva,
Levita…
No cansaço do amanhecer.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
09-01-2020

segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

O cansaço das palavras


A vida suspensa nas madrugadas de areia.
O cansaço das palavras na boca do Psicólogo, às vezes, tenho medo,
Da escuridão das personagens,
Quando o homem do chapéu negro,
Invade as paredes transparentes da saudade.
Está frio, meu amor.
O mar está longe,
Como as migalhas da solidão,
E este veleiro não pára,
Move-se,
Alimenta-se da minha pobre sombra.
Tenho medo, meu amor.
Tenho medo da saudade,
Quando inventada pela claridade dos dias tristes,
Cansados de viver.
Escrevo-te,
Desenho-te,
No caderno prateado que traz o silêncio da morte.
A verdade, custa.
O silêncio da verdade, custa mais…
Mas não interessa se as árvores vão sobreviver à saudade.
Porque dentro de mim, meu amor,
Só existe o cansaço das palavras.
Nada mais.
O cansaço das palavras.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
06/01/2020

sábado, 4 de janeiro de 2020


Eu sabia que era noite.
Percebia que as lâmpadas da saudade se acendiam pela primeira vez, e, no entanto, dentro de mim, uma simples constipação de palavras brincava num pequeno verso,
Triste, distante, eu sabia que era noite, e que os holofotes da desgraça vinham em minha direcção.
Esqueci-me de olhar o pôr-do-sol, não interessa, amanhã novo pôr-do-sol acordará, sem insónias, sem preguiça, como hoje, dentro dos lençóis iluminados pela tempestade de silêncio que se faz sentir dentro da casa, submersa em pequenos fios de nylon, e às vezes, não muitas, o poeta arrepende-se de ter escrito o poema; acontece quando o amanhecer é tardio, frio, ambíguo…


Francisco Luís Fontinha – Alijó
04/01/2020