domingo, 13 de julho de 2014

Páginas sem nome


Que faço a estas páginas sem nome,
que digo às palavras escritas nestas páginas sem nome...!

Triste, a mão que se recusa a escrever,
a mão trémula que inventa cigarros de arder...
que faço a estas páginas de escrever,
anónimas, desorganizadas... páginas mortas, páginas amarguradas,
triste, a mão que acaricia o rosto da madrugada,
e não se cansa de amar,

Que faço... ao cabelo sem vento!

Sem nome, prontas a escrever,
que faço eu mergulhado no teu corpo de neblina...
triste, a mão que não se cansa de sombrear o amanhecer,

Que faço, eu!

Que faço eu nesta tela envergonhada,
onde moram os teus seios de menina...
que triste..., que triste as páginas deste livro quase a morrer,
que faço eu, às palavras não escritas,
aos beijos desenhados na mesa-de-cabeceira,
sem saber o que fazer...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 13 de Julho de 2014

sábado, 12 de julho de 2014

Fogo


Fogo,
o teu corpo em liberdade,
suspenso nos braços do desejo,
o fogo que não arde,
o teu corpo quando mergulhado nas asas da madrugada,
o fogo, o fogo em teus cabelos que gritam o silêncio,
o teu corpo evapora-se e dele nasce o beijo,
o fogo... o fogo húmido da tua pele,
adormecida nas mãos cansadas,
tristes, tristes... porque o amor alicerça-se à alvorada,
e o fogo, o fogo que invade o verbo amar,
o fogo extingue-se e tu... e tu és um cubo de vidro com janelas para o mar...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 12 de Julho de 2014

Viver


Vivíamos encaixotados numa lâmina de silêncio,
tínhamos dentro de nós o sonho, tínhamos a transparência do amanhecer,
vivíamos sem saber que vivíamos...
viver,

Vivíamos dentro do espelho de uma folha por escrever,
vivíamos como se amanhã fosse o dia mais belo do luar,
tínhamos as palavras em gritos, e vivíamos acreditando que havia uma árvore nua, em despedida...
sentada na alvorada... esperando o regresso do mar,

Vivíamos no centro do círculo de vidro,
tínhamos no olhar a distância transatlântica do desespero..., havia em nós o medo, a solidão,
vivíamos não vivendo,
… porque tínhamos um beijo em nossa mão.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 12 de Julho de 2014

sexta-feira, 11 de julho de 2014

Mãos de papel...


Não estavas,
levemente desapareceste nos panos húmidos da manhã,
sentia-se a brisa que regressava da montanha,
peguei na tua mão,
percebi que era de papel, percebi que era impossível segurá-la...
hesitei,
voltei a pegar,
a tua mão ardeu, e vi a cinza madrugada rolando calçada abaixo,

O rio absorveu-a, o rio absorve todos os corações sem nome,
levemente... deixou de haver manhã,
perdi a noção do meu corpo, perdi nas pálpebras da tua dor o meu sorriso...
fiquei carrancudo, absorto, como o granito esquecido numa rua sem janelas,
a pedra, e as flores...
absorvidas pelo mesmo rio que hoje alimenta o meu desejo,
não estavas,
e hoje tenho medo a todas as mãos de papel...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 11 de Julho de 2014

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Não, não me obrigues a voar!


Não alimentes a minha fome,
porque eu não quero comer,
não, não grites o meu nome...
… porque sem a tua mão sou capaz de viver,

Escrever,
e... e sonhar,

Não alimentes a minha fome,
não cerres toas as janelas do meu olhar,
não me peças para chorar,
não, não sei chorar...

(escrever,
e... e sonhar),

Não alimentes a minha fome,
não quero os teus lábios de ciclone,
vagueando no meu peito, sobrevoando os meus cabelos tristes,
não,
porque insistes?
que eu seja o que nunca quis ser,
não,
não quero comer,
não,
não quero correr...
apenas quero ser o mar,
com lençóis de amanhecer,

(escrever,
e... e sonhar),

Não, não me obrigues a voar!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 10 de Julho de 2014

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Pedra de sentar


Esta pedra de sentar,
o sonho quando se apaga e voa sem que ninguém o consiga alcançar,
esta poeira cristalina sem encontrar o mar,
este verso prisioneiro da maré, pontapeando a sombra do sono,
uma cama me grita, e eu, eu obedeço,
me deito, adormeço,
esta pedra de sentar,
alucinada como os botões de rosa de odor a madrugada,
este meu corpo acorrentado ao velho Cacilheiro,
correndo, andando, estropiando o Tejo envergonhado,
este meu olhar cerrado,
como nuvens de papel, como algodão doce na mão de uma criança...

Pedra de sentar,

Esta pedra de sentar,
disfarçada...
disfarçada de amar,

A morte alicerça-se-lhe e ele acredita na pedra de sentar,
vai à janela... sem se levantar,
das árvores que observa, há uma que lhe acena, e o cumprimenta,
come uma sopa, e... e ela, o alimenta,
ele acredita que no próximo amanhecer, uma gaivota o vai visitar,
então, ele, fica esperando na pedra de sentar,
como um rio, ou... ou como um mendigo saboreando a noite,
vai às putas, e esquece-se de regressar...

Esta pedra de sentar...
deprimente sobre a pele encaracolada da tempestade,
ele, ele não sabe que do outro lado do rio, há uma cidade,
ele, ele não sabe que do outro lado da cidade, há um esconderijo,
um jardim empedrado, e que na lapela usa um lenço colorido,
detesta todas as gravatas,
detesta todos os lençóis com o aroma a cansaço,
detesta um simples abraço,
esta pedra de sentar,
irrita-me, e até parece um esqueleto com pernas de chocolate,
com olhos de solidão...
esperando, esperando... esperando a alegria acordar.



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 9 de Julho de 2014

terça-feira, 8 de julho de 2014

A clarabóia das lágrimas


Esta tenaz vagarosa mergulhada nas minhas palavras,
da lareira do silêncio, oiço as moléculas transparentes do amor,
sufocam-me, alimentam-se do meu cansaço,
o cansaço de escrever,
o cansaço das palavras,

A lanterna do teu olhar, cega-me, transforma os meus olhos em pedaços de papel,
e nele... escrevo as palavras que ninguém... que ninguém lê...

Não sou capaz de desistir,
partir para outros Oceanos, mais calmos, tranquilos... como os teus braços,
há sempre um espelho que transporta o meu rosto para o futuro...
envelheço, e sento-me num abandonado banco de jardim com uma concertina na mão,
e dela sinto em mim as recordações das tempestades voluptuosas...

Não há um fim, apenas o passar de uma parede negra... para uma outra, a curta distância...
uma parede castanha, alvenaria com cicatrizes comestíveis,
flores,
tenho as flores que sobejaram do jardim ardido na lareira do silêncio...
e deixei de ter o pavimento térreo que me acompanhava nas horas indolores do meu pulso,

A lanterna do teu olhar, cega-me, transforma os meus olhos em pedaços de papel,
e nele... escrevo as palavras que ninguém... que ninguém lê...

E ninguém quer...

Esta tenaz vestida de forca,
embrulhada numa túnica branca,
há uma porta dos fundo que me serve de escapatória...
um ponto de fuga, um simples ponto triste, um ponto tridimensional esquecido na solidão,
e ninguém quer...

Que... que a clarabóia das lágrimas ressuscite da montanha!


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 8 de Julho de 2014