sábado, 4 de janeiro de 2014

enlouquecido acordado

foto de: A&M ART and Photos

enlouqueço como os ramos cansados da amoreira
evaporam-se no vento agreste que traz a tempestade de areia
vomita barcos e caravelas e mulheres de porcelana
belas às vezes... feias quando os charcos lamacentos do abismo estão sobre o mar...
mulheres que fogem das nuvens invisíveis dos doces torrões de açúcar
enlouqueço
vivo fingindo viver
e escrever fingindo que escrevo
não escrevendo...
… nada
absolutamente... nada
porque odeio as canetas de tinta permanente

porque deixei de guardar as velhas folhas em papel amarrotado...
velho
porque... queimei os dedos do teclado da máquina de escrever
ainda oiço os sons magoados das sílabas em sangue...
e enlouquecido... sinto-me um iceberg perdido na espuma tranquila do silêncio medo
procurando travessões longos de madeira firme
palavras
tristes palavras
das cadeiras da sala de jantar...
oiço e choro
perco-me não percebendo que do pavimento da paixão
acordam os laços de nylon dos mastros enferrujados.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 4 de Janeiro de 2014

Horácio Queiroz - paintings



sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Triste Inverno

foto de: A&M ART and Photos

Prefiro esquecer
não olhar o mar sobre as pedras cinzentas da dor...
não chorar porque nas lágrimas habitam os pássaros em papel
como palavras vivas
como... prefiro esquecer o sofrimento ensanguentado da noite
sentado
e adormecer
eu cansado... cansado de esperar que se ergam as flores do triste Inverno.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 3 de Janeiro de 2014

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Os barcos da minha infância

foto de: A&M ART and Photos

Sinto-me ausente como os barcos da minha infância
oiço os loucos apitos das orgias nocturnas dos pássaros anónimos em mim
finjo escrever no corpo da alma
acredito voar se saltar a varanda e passear sobre os telhados de Alfama
os bares em Cais do Sodré
o rio... o rio que me chama... e eu... e eu não vou
pronto
não quero
porque não me apetece olhar o mar
sinto-me transeunte como as formigas empanturradas em açúcar e compota de abóbora...
não quero conversar com ninguém
prefiro a ausência,

A minha santa ignorância... sou um Réu sentado em cima das rochas de espuma
sou um corpo deitado sobre outro corpo
mórbidos nós... até que a morte nos separe... penso em ti
e nunca sei quem és
como te devo apelidar...
se
ou
sinto-me ausente como as serpentes e os barcos da minha infância,

Além habitam os charcos lamacentos das bibliotecas em flor
aqui... nada que preste
aqui apenas a minha sombra espetada num farrapo junto a um espigueiro...
o telhado chora
e range
as ripas fazem amor com os pregos enferrujados...
gritam
uivam
e lá dentro
pedaços de nós em pequenas espigas de milho adormecidas no cansaço da morte
não sei... ainda não sei o teu nome
como te despes... como... qual é a tua relação com o espelho do desejo?


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 2 de Janeiro de 2014

Livro “Pintura e Texto”

Quadro de Horacio Febrero de Queiroz

É com enorme prazer e satisfação que um Texto meu vai integrar o livro “Pintura e Texto” sobre os quadros do pintor Horacio Febrero de Queiroz.
Obrigado à Pastelaria Estudios Editora, Teresa Maria Queiroz e ao pintor Horacio Febrero de Queiroz.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Os cinzentos beijos da madrugada

foto de: A&M ART and Photos

A flor do desassossego acorda-me com se eu fosse um metro quadrado de terra não fértil
como se eu fosse um pedaço de papel ainda não escrito
doente
debaixo da sombra dos embondeiros
oiço os mabecos vomitarem as sílabas de aço das poucas palavras pronunciadas
gordas... acabadas
tristes como eu porque o dia não cresce
porque a lareira do desejo afunda-se nos cinzentos beijos da madrugada
“a flor tu” que o calendário da paixão colocou na parede da minha mão...
“a flor tu” que eu recuso tocar
porque as nuvens prateadas são como as sandálias... esquecem-se de caminhar
e morrem no mar,

E eu toco-te sem perceber que os abraços são filhos do vento
e “a flor tu”
um fino esqueleto de luz voando sobre as montanhas do prazer
a flor
a flor do desassossego acorda-me
enoja-me
faz de mim um velho mendigo sem casa para habitar
sem palavras para escrever...
sem jardins
sem nada...
e eu toco-te e tu...
e tu... tocas-me pensando que sou uma pedra de xisto esquecida nos socalcos do destino.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
Quarta-feira, 1 de Janeiro de 2014

terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Voos nocturnos

foto de: A&M ART and Photos

Voo entre as espadas de sombra das paredes de gesso
oiço do vão de escada os uivos do lobo cinzento
talvez se sente
talvez... me espere
oiço-lhe na voz os silêncios do medo
os arrufos da solidão
do vão de escada... alcança-se o sótão das palavras
onde habita uma folha rasgada,

Uma frase suspensa no arame da paixão...
uma moeda de prata que roda sobre a mesa-de-cabeceira
voo e não dou conta dos ponteiros do velho relógio em direcção ao abismo
uma trégua... preciso urgentemente da trégua do sossego
uma amiga palavra
uma toalha envenenada
encharcada... como o éter embriagado depois das pétalas caírem sobre o mar
e a gaivota dos teus lábios acordar das marés esverdeadas,

Voo... entre as espadas... gesso
sinto-o como lâminas de espuma sobre o meu pescoço à deriva no Oceano do amor
voo e não voo.. vou depois de partir conhecer os túmulos secretos dos esqueletos em desejo
voo como uma gaivota sem asas
estonteante
doente...
fugindo da doce guilhotina dos dias sem Primavera
voo e voo até tombar como uma árvore sobre o jardim das despedidas...

Fingidas
sinto-o como sentia o sal dentro das minhas veias
cordas de nylon voavam como eu sobre a cidade dos delírios
despedidas...
porquê?
aceites somos palhaços de palha seca dormindo no centro da eira com vista para a torre da Igreja
e de fingidas
às... prometidas... prometidas espadas de sombra das paredes de gesso.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 31 de Dezembro de 2013