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terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Voos nocturnos

foto de: A&M ART and Photos

Voo entre as espadas de sombra das paredes de gesso
oiço do vão de escada os uivos do lobo cinzento
talvez se sente
talvez... me espere
oiço-lhe na voz os silêncios do medo
os arrufos da solidão
do vão de escada... alcança-se o sótão das palavras
onde habita uma folha rasgada,

Uma frase suspensa no arame da paixão...
uma moeda de prata que roda sobre a mesa-de-cabeceira
voo e não dou conta dos ponteiros do velho relógio em direcção ao abismo
uma trégua... preciso urgentemente da trégua do sossego
uma amiga palavra
uma toalha envenenada
encharcada... como o éter embriagado depois das pétalas caírem sobre o mar
e a gaivota dos teus lábios acordar das marés esverdeadas,

Voo... entre as espadas... gesso
sinto-o como lâminas de espuma sobre o meu pescoço à deriva no Oceano do amor
voo e não voo.. vou depois de partir conhecer os túmulos secretos dos esqueletos em desejo
voo como uma gaivota sem asas
estonteante
doente...
fugindo da doce guilhotina dos dias sem Primavera
voo e voo até tombar como uma árvore sobre o jardim das despedidas...

Fingidas
sinto-o como sentia o sal dentro das minhas veias
cordas de nylon voavam como eu sobre a cidade dos delírios
despedidas...
porquê?
aceites somos palhaços de palha seca dormindo no centro da eira com vista para a torre da Igreja
e de fingidas
às... prometidas... prometidas espadas de sombra das paredes de gesso.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 31 de Dezembro de 2013

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Que fazem os lobos na minha cidade?

foto de:A&M ART and Photos

Sei que me esperam a cada esquina da cidade, existem placas sinaléticas com o meu nome espalhadas pelas imensas ruas da cidade, obedeço e descubro que sou filho da cidade, obedeço e descubro que vivo clandestinamente na cidade, oiço-os, sinto-os galgarem os gradeamentos dos quintais de arame, sei que são eles porque o cheiro que chega a mim diz-me que são ele e pergunto-me
Que fazem os lobos na minha cidade?
Espero impacientemente o eléctrico para Belém, entre o vir e o desistir, eu ganho-lhe e antes que ele venha... desisto, começo trôpegamente e arrefeço e começo a extinguir-me conforme as sombras que a cidade constrói nas janelas envidraçadas dos táxis embriagados quando saem dos bares de Cais do Sodré, sinto-me não sentir as mãos que me acompanham, sinto-me vaguear como um louco nas cânforas lâmpadas dos candeeiros cintilantes da noite sem sucesso, oiço-os e tenho-lhes medo
Pergunto-lhe e ela responde-me que
Os lobos são filhos da cidade...
Eu paro e repentinamente imagino-me também um lobo, pois sou filho da cidade, pois... logo sou um lobo, solitário, vegetariano procurando os velhos quintais que aos poucos vão morrendo nos arredores da cidade, sinto-me voar sobre os meninos e meninas que brincam nos parques infantis, sinto-me voar sobre os lobos que fazem amor nas fina areia da praia, também ela
Filha da cidade,
Mãe dos lobos, minha mãe, sinto-me perdido dentro de um fino buraco que uma dessas crianças que brincava na areia fez, começo a descer, começo a acariciar-lhe as coxas encostas dos socalcos mergulhados no Douro, sinto-me a entranhar-me nos seios do pôr-do-sol quando há muito partiram as crianças que fizeram o buraco onde me encontro aprisionado, grito pelos lábios do desejo, e sinto a minha mão abraçada à cannabis língua dos soluços depois de acordarem os orgasmos do fumo transversal que também como eu, voam sobre a cidade, que tal como eu
Filhos da cidade,
Sinto os lobos vergarem-se quando o vento sussurra ao ouvido do púbis em cio, a cidade embrulha-se no clitóris da saudade, há momentos de silêncio, há solidões disfarçadas de insónia e mesmo assim, eles, dizem, que,
Ele... filho da cidade
Ele... irmão dos lobos e filho da praia,
Desisto do eléctrico, vou dançando pelas pedras das calçadas e eu descalço, e oiço-os, e oiço-os como martelos pneumático salpicando carne em sexo nas ruelas mal iluminadas, finjo-me de morto, finjo-me de sonâmbulo e eles abandonam-me dentro do cobertor dos sonhos, desisto do eléctrico, desisto dos corpos graníticos dos jardins de pedra, e sobrevoo como uma gaivota desnorteada o teu cabelo de papel com bolinhas encarnadas,
Ele... filho da cidade
Ele... irmão dos lobos e filho da praia, e sei que me esperam a cada esquina da cidade...


(não revisto – ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 11 de Novembro de 2013