foto de:A&M ART and Photos
|
Sei que me esperam a cada esquina da cidade, existem
placas sinaléticas com o meu nome espalhadas pelas imensas ruas da
cidade, obedeço e descubro que sou filho da cidade, obedeço e
descubro que vivo clandestinamente na cidade, oiço-os, sinto-os
galgarem os gradeamentos dos quintais de arame, sei que são eles
porque o cheiro que chega a mim diz-me que são ele e pergunto-me
Que fazem os lobos na minha cidade?
Espero impacientemente o eléctrico para Belém,
entre o vir e o desistir, eu ganho-lhe e antes que ele venha...
desisto, começo trôpegamente e arrefeço e começo a extinguir-me
conforme as sombras que a cidade constrói nas janelas envidraçadas
dos táxis embriagados quando saem dos bares de Cais do Sodré,
sinto-me não sentir as mãos que me acompanham, sinto-me vaguear
como um louco nas cânforas lâmpadas dos candeeiros cintilantes da
noite sem sucesso, oiço-os e tenho-lhes medo
Pergunto-lhe e ela responde-me que
Os lobos são filhos da cidade...
Eu paro e repentinamente imagino-me também um lobo,
pois sou filho da cidade, pois... logo sou um lobo, solitário,
vegetariano procurando os velhos quintais que aos poucos vão
morrendo nos arredores da cidade, sinto-me voar sobre os meninos e
meninas que brincam nos parques infantis, sinto-me voar sobre os
lobos que fazem amor nas fina areia da praia, também ela
Filha da cidade,
Mãe dos lobos, minha mãe, sinto-me perdido dentro
de um fino buraco que uma dessas crianças que brincava na areia fez,
começo a descer, começo a acariciar-lhe as coxas encostas dos
socalcos mergulhados no Douro, sinto-me a entranhar-me nos seios do
pôr-do-sol quando há muito partiram as crianças que fizeram o
buraco onde me encontro aprisionado, grito pelos lábios do desejo, e
sinto a minha mão abraçada à cannabis língua dos soluços depois
de acordarem os orgasmos do fumo transversal que também como eu,
voam sobre a cidade, que tal como eu
Filhos da cidade,
Sinto os lobos vergarem-se quando o vento sussurra
ao ouvido do púbis em cio, a cidade embrulha-se no clitóris da
saudade, há momentos de silêncio, há solidões disfarçadas de
insónia e mesmo assim, eles, dizem, que,
Ele... filho da cidade
Ele... irmão dos lobos e filho da praia,
Desisto do eléctrico, vou dançando pelas pedras
das calçadas e eu descalço, e oiço-os, e oiço-os como martelos
pneumático salpicando carne em sexo nas ruelas mal iluminadas,
finjo-me de morto, finjo-me de sonâmbulo e eles abandonam-me dentro
do cobertor dos sonhos, desisto do eléctrico, desisto dos corpos
graníticos dos jardins de pedra, e sobrevoo como uma gaivota
desnorteada o teu cabelo de papel com bolinhas encarnadas,
Ele... filho da cidade
Ele... irmão dos lobos e filho da praia, e sei que
me esperam a cada esquina da cidade...
(não revisto – ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 11 de Novembro de 2013