segunda-feira, 4 de dezembro de 2017
THE END
Fumo este pobre cigarro que me há-de matar,
Mas a morte é apenas o THE END do filme da minha vida,
Alguns farrapos, um par de sapatos e uma caixa em madeira,
Sempre adorei o cheiro da madeira, logo pela manhã, ao acordar,
Fumo este pobre cigarro porque me dá prazer, e me alimenta de madrugada,
Não, não penso na morte, porque no fundo, ela é bela, como as palavras que não consigo escrever,
Fumo este pobre cigarro sabendo que vou morrer…
Mas quem não morre?
Todos morremos, até o próprio saber, até as cidades a arder e o prazer.
Francisco Luís Fontinha
domingo, 3 de dezembro de 2017
A saliva do desejo
Tens
nas veias a saliva do desejo,
O
cansaço disperso, quando a alvorada se despede de ti,
Os
Oceanos infinitos entre quatro paredes de vidro,
O
sangue das palavras embriagadas pela insónia,
Depois
acordam as estrelas,
É
dia,
Encostas-te
a mim, dormes, sonhas, escreves no meu olhar as palavras proibidas,
É
dia,
Pegas
na minha mão, levas-me para os jardins longínquos da memória,
Ouvíamos
música, líamos os limos da madrugada, na serpente, a maçã envenenada,
E
outras coisas mais…
Vivíamos
sonhando com livros em xisto, descendo os socalcos da miséria,
O
poço da aldeia, a água límpida da manhã,
Que
absorve toda a porcaria das tuas veias,
Está
frio, ranges os dentes e entrelaças as mãos,
Desprega-se
do teu cabelo, finíssimos pingos de geada,
Até
que seja noite na nossa cidade,
Recordas-me
as árvores no Outono, aos poucos despidas, sombrias…
Porque
a noite é vadia, porque a noite traz recordações de outros tempos,
Relógios
ensanguentados de saliva, do desejo, que alimentam as tuas veias.
Francisco
Luís Fontinha
Alijó,
3 de Dezembro de 2017
sábado, 2 de dezembro de 2017
A espuma que embrulha o teu jardim
O
silêncio de espuma que embrulha o teu jardim, o banho imaginário nas traseiras
da casa onde habita o teu jardim, o teu corpo é um esqueleto de veludo, fossilizado
nos fantasmas da noite, regressa o mar, traz na algibeira as flores da
madrugada, simples, magoadas, como as sentinelas da morte,
O
ausentado menino dos socalcos de xisto, que brinca nas margens do rio
envenenado pelas enxadas da insónia, tenho medo, tenho medo dos alicerces da
dor quando do teu corpo apenas consigo observar estrelas e fumo…
Ao
amanhecer,
A
trovoada que abraça a parede granítica do sonho, o miúdo complexo em círculos
no quintal infestado de Mangueiras e Mangas, e quando ele percebe, tem um
papagaio em papel brincando entre os finos dedos, não chove, deixou de chover
nesta terra, deixei de ouvir o cheiro da terra queimada, e o poço é cada vez
mais fundo, observo-o, alimento-o, e sinto o peso das plumas nocturnas dos
bares de Lisboa,
Ao
amanhecer, os vidros das janelas rangem de frio, a lareira morta na esperança
de acordar de madrugada, e o silêncio de espuma que embrulha o teu jardim, o
banho imaginário nas traseiras da casa onde habita o teu jardim, cobertos por
um finíssimo cobertor de geada.
Francisco
Luís Fontinha
Alijó,
2 de Dezembro de 2017
domingo, 26 de novembro de 2017
Nas palavras, o silêncio.
Nas
palavras, o silêncio.
Da
noite camuflada pelos Oceanos perdidos, os pindéricos sorrisos da alma,
Os
esqueletos de luz que vagueiam na triste Avenida, sem palavras, a distância dos
osos na escuridão do mar,
Recordo
o teu olhar de pálpebras silenciadas pelo vento. Os rochedos onde me deito.
A
madrugada. Acordar em ti os sonhos de ontem, a difícil caminhada em direcção ao
mar, dois corpos saturados da neblina, dois corpos misturados nas ínfimas luzes
da cidade. Não durmo. Finjo brincar numa praia em papel, desenhada por uma
criança, triste, como as estátuas de sal,
Os
meus dedos na tua boca, quando libertas os livros aprisionados pelo tempo,
liberta-te também de mim; desacorrenta-te, e desiste de lutar.
Amanhã
lá estarei, desintegrado nas salas exíguas dos mortos jardins, pequenas
árvores, pequenos arbustos no teu peito, esperando o veneno, escondo-me.
Nas
palavras, o silêncio.
A
solidão da manhã quando trazes nas mãos a chuva miudinha, pesadíssima, e,
travestida de soldado, brinco em ti, comigo sentado numa pedra adormecida, à
deriva na rua deserta da tua sombra…
Palavras,
nas palavras, o silêncio, o prateado desassossego que a vida constrói no
amanhecer, como os poemas, entre morto e mortos; o fim.
Ai
que a vida parece um círculo, cada vez mais longínquo da cidade,
Como
todos os sons da tarde, ao cair a noite,
Os
sonhos, vagueiam no teu solstício medo de me deixar junto ao rio,
Felizes,
aqueles que acreditam em Deus…
Porque
os que não acreditam, morrem, e nunca compreenderão o silêncio.
Francisco
Luís Fontinha
Alijó,
26 de Novembro de 2017
sábado, 25 de novembro de 2017
Entre quatro paredes
Entre
quatro paredes, tenho o meu esqueleto de granito infestado de lágrimas, e,
quando o meu pobre relógio acorda, todas as noites, fujo para as sombreadas
ruas da Avenida, pinto as árvores no meu olhar, semeio na lapela as frágeis
sementes da morte, sempre que o vento regressa do mar,
A
janela do sofrimento rasgada na penumbra madrugada, o silêncio das acácias
misturado com os soníferos orgasmos de prata, e esta terra me alimenta das
esmolas não recebidas, tenho medo, medo de perder-te no infinito amanhecer,
porque nas tuas mãos habitam as flores da despedida, lamento, fico cansado de
olhar-te no espelho caduco do meu quatro, e, os livros empilhados junto à
madrugada, lamento, que todas as tardes sejam em pedaços de sofrimento, como as
jangadas dos pilares de areia da tua voz,
Entre
quatro paredes, de vidro, o silêncio amanha, dorme… e morre na alvorada.
Francisco
Luís Fontinha
Alijó,
25 de Novembro de 2017
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