sábado, 16 de novembro de 2013

as incendiadas sanzalas do prazer

foto de: A&M ART and Photos

porque me procuram nas incendiadas sanzalas do prazer
não sendo eu um homem como os homens das bandeiras embriagadas
porque me procuram nas entranhas manhãs de cacimbo
eu escondido no zinco telhado do musseque alvorado
porque sou assim
um casebre sem esqueleto e ignorado
um imbecil que em tudo acredita
e que procuram como se fosse um objecto para reciclagem
usa-se
deita-se fora
e nasce em ti o dia ensanguentado das tristezas noites junto ao Mussulo
porque sou um um monstro vestido de negro

(como o dizem quando me chamam
e acordam
em todos os silêncios do medo...)

porque finjo que sou amado
porque acredito eu no amor
quando o amor é uma caravela à deriva no triste Oceano
porque me procuram nas incendiadas sanzalas do prazer
porque sou um canino disfarçado de desenho animado
porque me dizem que sou um poema odiado
palavras da merda escritas por um gajo de merda
porque acredito
se nunca deveria acreditar nas manhãs sem nuvens
porque são falsas
e logo em seguida
ejaculam as gotinhas amargas da chuvinha colorida...

(como o dizem quando me chamam
e acordam
em todos os silêncios do medo...)

sou um gajo porreiro como o são todos os cadáveres da morgue do púbis amanhecer
porque sou um imbecil sentado num banco de jardim
espero as ripas madres em madeira apodrecida
finjo que sou amado
e todos o sabemos que não o sou
porque apenas pertenço aos corpos dilacerados
dos musseques adormecidos
doridos
mórbidos entre as espadas dos livros em poesia
e as palavras semeadas nas tuas coxas de terra fértil...
esperam as sementes da alegria
como se fossemos apenas vozes entrelaçadas como dedos em vaginas acorrentadas às sílabas inanimadas...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 16 de Novembro de 2013

“o livrinho dos sonhos”

foto de: A&M ART and Photos

Desiludido com o amor,
“o que é que eu faço?”
Ele vivia preocupado com as cavernas que o tempo tecia no seu corpo transparente de pedra invisível, tinha sempre na algibeira o livrinho e que apelidava
“o livrinho dos sonhos”
Um dia, sem razão explicável, ele, o abstracto homem dos passos trocados, perdeu “o livrinho dos sonhos” e desde então, nunca mais houve sonhos nele, tinha terminado a vida cansada da cartilha encarnada, vivia o dia acreditando que não regressaria no final da tarde, depois acordava a noite, depois a noite comia-o e ele continuava vagueando como uma gaivota sem sexo nas avenidas dos tristes corações de areia,
“o livrinho dos sonhos”
A lareira incendiava-se como dois clandestinos corpos em combustão periódica dentro do cobertor do desejo, havia bandidos solitários que chegavam até nós do rádio esquecido sobre a cómoda, o bandido tresloucado que tinha uma bala no canhão, oiço
“o diabo”
“o bandido solitário só faz folga para foder”
Havia bandidos solitários que chegavam até nós do rádio esquecido sobre a cómoda, “o bandido tresloucado que tinha uma bala no canhão”, oiço os gemidos da prisão do amor, oiço o teu colorido corpo embainhado nas árvores apodrecidas das madrugadas em marés flutuantes na cumplicidade dos lençóis às riscas amarelas com pontinhos brancos, os bandidos solitários
“o bandido solitário só faz folga para foder”
Desiludido com o amor,
“o que é que eu faço?”
Ele vivia preocupado com as cavernas que o tempo tecia no seu corpo transparente de pedra invisível, tinha sempre na algibeira o livrinho e que apelidava “ o livrinho dos sonhos”, e dizia-me constantemente entre dentes que me amava e era louco por mim, e percebi que o amor é uma rosa que depois murcha, as pétalas secam, e a “tu cuerpo me llama” e sou absorvido pelos teus doces olhos, e eu
Desiludido com o amor,
“o que é que eu faço?”
Os bandidos solitários comem-se como salteadores dos bares nocturnos de uma Lisboa envenenada pela solidão das ruas e dos imperfeitos candeeiros que escondem sonâmbulas Margaridas com pálpebras em papel, sou uma destemida ponte com saia aos quadrados, sou uma mão que acaricia os teus seios de Luar e acabas de sair do “livrinho dos sonhos”, doce e linda como as manhãs de orvalho entranhadas na neblina lareira do desejo, como quem sai de um livro, a personagem eterna das noites em combustão,
“o que é que eu faço?”
Acaricia-lhe os cabelos ondulados de montanha endiabrada... o interior, claro. não vivo de aparências. que me interessa ter a casa mais bela da cidade. se no seu interior nem divisões tem?
E tu, personagem acabada de nascer?
Eu, eu o quê?
Eu, eu disfarço-me de cidade e morro nas tuas mãos de poeira.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 16 de Novembro de 2013

cidade adormecida

foto de: A&M ART and Photos

me irritam as palavras vagabundas dos teus lábios marginais
me irritam as tuas mãos em profunda pedra adormecida
como vaginais noites de geada
no centro da cidade
procuro o barco da saudade
procuro o livro do esquecimento
sou a Rainha das montanhas em sofrimento
sou... a tua gaivota moribunda das tempestades em teias silêncio
me irritam as lâmpadas dos teus cabelos
quando poisam no meu difícil peito de porcelana
como amarras de madeira
no cais das tormentas...

(me irritam as tuas bocas loucas das tardes em mergulhos flácidos
dos músculos embebidos em papeis de parede)

me irritam as palavras tuas minhas inconstantes migalhas de sémen
quando descem sobre nós os cortinados do tédio
me irritam as sílabas embriagadas
escorrendo nádegas adversas nos cobertores da inocência
me irritam as imagens sem imagens
as sombras
as viagens
me irritam... me irritam as cadeiras onde se sentas
e me observas
e te alimentas...
do meu corpo
um corpo mórbido com sabor a cadáver anónimo


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 16 de Novembro de 2013

e correntes em aço

foto de: A&M ART and Photos

coisas impossíveis que me fazes sentir quando te toco
beijos doirados em lábios despedidos da imensidão do silêncio
não sei quem sou e de onde venho
não percebo onde habito e porque tenho em mim abraços
e correntes em aço
coisas impossíveis...
coisas sem nexo que os olhos absorvem das pálpebras quebradas à dor
e o meu corpo sente
e o meu corpo morre,,,
às palavras cansadas da vida de viver...
sinto-te embrionária nos colchões da insónia
e percebo que és de porcelana amanhecer...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha . Alijó
Sábado, 16 de Novembro de 2013

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

coxas de orvalho

foto de : A&M ART and Photos

sinto-me pincelado com pedaços de solidão
e do meu corpo-tela uma fina imagem encosta-se aos filamentos incandescentes de uma lâmpada de halogéneo
não sou eterno
amado
sou um electrão mergulhado no espelho do nada
sifilítico magala apodrecido na doce paixão das árvores do silêncio
sinto-me uma locomotiva denunciando carris e curvas de nível
sinto-me um bufo engolindo sombras que a noite magoa depois do sexo alimentar a tua boca de sofrimento que as rosas poisaram em ti entes de acordar a poesia
sinto-me um vadio inconfortável
ignorante como pequenas conversas de tic-tac
nos alicerces das mãos de cereja que o papel amarrotado embrulha entes da morte
sinto-me um cadáver profanado
mal-vestido
sinto-me um jardim sem nome procurando as estrelas de cartão
sinto-me um barco fundeado no teu púbis de areia
quando os petroleiros da desgraça se fazem à costa pedinchando pequenas folhas de plátano
embebidas em cerveja de lata
sinto-me sobre ti ficticiamente falando como quando éramos dois bancos de jardim
em busca de ripas em madeira
e madeixas coloridas dos triângulos embriagados
sinto-me um falhado diplomado
um triste vagabundo sentado
nas tuas coxas de orvalho...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 15 de Novembro de 2013

margaridas amanhecer

foto de: A&M ART and Photos

porque são os teu olhos margaridas amanhecer
e escondes nas pálpebras a palavras de escrever?
um poeta louco não ama não é amado
não percebe que as madrugadas são em papel crepe
e que há livros de poesia perdidos numa mesa-de-cabeceira
há uma cama onde te despes e deitas
há uma mão que te acaricia e deseja travestis orgasmos invisíveis
a miséria urbana
o sexo pelo sexo
a mente desvairada numa feira inventada
porque são
os teus olhos olhos margaridas amanhecer?


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 15 de Novembro de 2013

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

equações de prata

foto de: A&M ART and Photos

prometidas equações de prata nos olhos da cidade agoniada
da boca os sinceros mergulhos de solidão
como simples quadrados traçados no térreo pavimento do desejo
há nela uma janela com vidros de sémen
que caminham
e vivem no Mosteiro da insónia
prometidas coisas
sem sentido sem sentido...
simples
simples anexos de chita
sobre o nu travesti que as coxas do silêncio absorvem antes de terminar o dia
e prometidas linhas de fino ouro que atravessam as ruelas dos sonhos
e infestam de palavras as mãos ensanguentadas das mulheres-sombra
alimentam-se de pedaços papel e singelas migalhas de areia da algibeira da agonia
sentíamos os velozes corpos transatlânticos vestidos de aço como líquido esquelético dos alicerces de vidro
e amávamos-nos quando nos embrulhávamos nas montanhas das gaivotas em cio
prometidas equações que o teu corpo seduz como a Professora quando do aluno fantasma
ossos e pregos e madeira ressequida saltitam no recreio da escola
há árvores sobre os diques do prazer quando ejaculam as searas os palhaços de trapos de cetim
e amávamos-nos sobre quatro rodas em movimento curvilíneo
um pêndulo e um cordel
e tudo o que nos restou da tempestade de zinco aos telhados engrenados no teu ventre
chovia enquanto desenhávamos sexo nas frestas do gesso
às paredes argamassadas das esquinas iluminadas pelo teu olhar de manteiga...



(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 14 de Novembro de 2013

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

canções do prazer

foto de: A&M ART and Photos

percebo quando as tuas mãos de papiro invisível
encontram as minhas flácidas coxas de argamassa clandestina
percebo que em ti vivem as canções do prazer
e as gaivotas dos moinhos de vento
percebo que és a montanha
e a tempestade que castiga o meu corpo entre os teus dedos
percebo que me absorves como uma semente abandonada
que o teu corpo acolhe
cuida
e do salivar poema de xisto carcomido pelo teu sémen sabático
dormem
e fogem as andorinhas de olhar esverdeado...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 13 de Novembro de 2013

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Barcos em flores acreditando nas gaivotas de porcelana

foto de: A&M ART and Photos

Éramos dois barcos dentro da mão da tempestade, vivíamos sonhando como sonhavam os nossos antepassados, tínhamos luas sem luar, ouvíamos as lágrimas da noite e dormíamos acreditando que a noite era mãe das amendoeiras em flor, tínhamos sidos enganos, só não éramos nada, tu e eu, como a noite nunca existiu, só não éramos nada, como tu e eu, como os sonhos são uma mentira inventada pelas nuvens de prata, só não éramos anda, tu e eu, como a noite, sim, essa mesmo, como a noite nunca foi a mãe das amendoeiras em flor, porque estas
Nunca existiram?
Existiram, e existem, mas... deixaram de habitar a nossa aldeia depois dos incêndios que fizeram de nós, num verão incandescente, como uma lareira enfeitada com papel florido e pequenos desenhos em acrílico sobre tela, quanto vale
Nada,
Não vendo desenhos, não vendo vidas habitadas em telas sem sentido, nuas, escuras, telas minhas que acreditava serem também tuas, telas dela que eu acreditava serem dele... e nada lhes pertencia, a manhã, o frio, as flores dos vasos que quando o vento era mais forte os fazia estilhaçar na calçada, da varanda em queda livre
Ajuda!,
E AJUDA nenhuma, apenas paralelepípedos de tristeza mergulhados nas línguas dos magalas com gravatas em tecido desbravado das costureiras envelhecidas, ela trôpegamente subia as escadas, abria a porta de entrada e logo de seguida um velho gato infestado de reumático lhe poisava não mão esquerda, enquanto com a mãos direita afagava os colarinhos de uma gaivota tresmalhada, envenenada pelas insónias vodkas dos bares em Cais do Sodré, e putas de perfume inocência vagueavam a rua saboreando sexos murchos dos candeeiros ancorados aos pinheiros de Trás-os-Montes acabados de nascer, e cresciam, e cresciam
E AJUDA nada,
Descíamos pensando que subíamos,
Os braços da sombra Inglesa com rissóis de maré grelhada e molho de pôr-do-sol, éramos quatro barcos, éramos quatro vadios guindastes de marfim na boca de um crocodilo em pau-preto, e se a princípio éramos apenas dois barcos
Como quatro hoje?
Barcos em flores acreditando nas gaivotas de porcelana, como dois antes, os filhos dos filhos, e as putas de perfume inocência vagueavam a rua saboreando sexos murchos dos candeeiros ancorados aos pinheiros de Trás-os-Montes acabados de nascer, e cresciam, e cresciam
Até
E cresciam...
Até morrerem.


P.S.


o habitáculo do desejo


dentro do habitáculo do desejo
a bailarina Caliente voa sobre as gaivotas em flor
uma moeda insere-se na ranhura do piano embriagado
ouvem-se sons dispersos nas coxas dele
ele geme
ela sente cada milímetro quadrado dos gemidos dele
o piano enlouquece
o piano derrama a fina pauta de sémen sobre a geada da alvorada
sinto a lareira do ciume nas planícies do abismo coração solitário
e dentro do habitáculo
ela
ela ri-se e dos lábios sobejam as finas pétalas do prazer...




Percebes agora a razão da existência dos quatro barcos em vez de dois?
Não, não percebo,
Éramos dois barcos dentro da mão da tempestade, vivíamos sonhando como sonhavam os nossos antepassados, tínhamos luas sem luar, ouvíamos as lágrimas da noite e dormíamos acreditando que a noite era mãe das amendoeiras em flor, tínhamos sidos enganos pelo habitáculo do desejo, e dos vidros embaciados, nasceram mais dois barcos, filhos dos dos dois primeiros barcos,
Percebes agora a razão da existência dos quatro barcos em vez de dois?
Não, não percebo,
Tudo
Não percebes?
Tudo tão negro quando os gemidos da saudade se entranham nas frestas dos complexos números do quadriculado caderno, e de vez em quando
Poemas,
E de vez em quando
Percebes agora a razão da existência dos quatro barcos em vez de dois?
Não, não percebo,
Como nunca percebi porque chamam Calçada à AJUDA... quando ninguém é ajudado e o rio engole os sexos murchos dos candeeiros ancorados aos pinheiros de Trás-os-Montes acabados de nascer, e cresciam, e cresciam
E morriam.


(não revisto – ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 12 de Novembro de 2013
Barcos em flores acreditando nas gaivotas de porcelana

Robert Plant | Zirka Part 1 | Malian Journey to and from Festival in the Desert 2003