sábado, 16 de novembro de 2013

“o livrinho dos sonhos”

foto de: A&M ART and Photos

Desiludido com o amor,
“o que é que eu faço?”
Ele vivia preocupado com as cavernas que o tempo tecia no seu corpo transparente de pedra invisível, tinha sempre na algibeira o livrinho e que apelidava
“o livrinho dos sonhos”
Um dia, sem razão explicável, ele, o abstracto homem dos passos trocados, perdeu “o livrinho dos sonhos” e desde então, nunca mais houve sonhos nele, tinha terminado a vida cansada da cartilha encarnada, vivia o dia acreditando que não regressaria no final da tarde, depois acordava a noite, depois a noite comia-o e ele continuava vagueando como uma gaivota sem sexo nas avenidas dos tristes corações de areia,
“o livrinho dos sonhos”
A lareira incendiava-se como dois clandestinos corpos em combustão periódica dentro do cobertor do desejo, havia bandidos solitários que chegavam até nós do rádio esquecido sobre a cómoda, o bandido tresloucado que tinha uma bala no canhão, oiço
“o diabo”
“o bandido solitário só faz folga para foder”
Havia bandidos solitários que chegavam até nós do rádio esquecido sobre a cómoda, “o bandido tresloucado que tinha uma bala no canhão”, oiço os gemidos da prisão do amor, oiço o teu colorido corpo embainhado nas árvores apodrecidas das madrugadas em marés flutuantes na cumplicidade dos lençóis às riscas amarelas com pontinhos brancos, os bandidos solitários
“o bandido solitário só faz folga para foder”
Desiludido com o amor,
“o que é que eu faço?”
Ele vivia preocupado com as cavernas que o tempo tecia no seu corpo transparente de pedra invisível, tinha sempre na algibeira o livrinho e que apelidava “ o livrinho dos sonhos”, e dizia-me constantemente entre dentes que me amava e era louco por mim, e percebi que o amor é uma rosa que depois murcha, as pétalas secam, e a “tu cuerpo me llama” e sou absorvido pelos teus doces olhos, e eu
Desiludido com o amor,
“o que é que eu faço?”
Os bandidos solitários comem-se como salteadores dos bares nocturnos de uma Lisboa envenenada pela solidão das ruas e dos imperfeitos candeeiros que escondem sonâmbulas Margaridas com pálpebras em papel, sou uma destemida ponte com saia aos quadrados, sou uma mão que acaricia os teus seios de Luar e acabas de sair do “livrinho dos sonhos”, doce e linda como as manhãs de orvalho entranhadas na neblina lareira do desejo, como quem sai de um livro, a personagem eterna das noites em combustão,
“o que é que eu faço?”
Acaricia-lhe os cabelos ondulados de montanha endiabrada... o interior, claro. não vivo de aparências. que me interessa ter a casa mais bela da cidade. se no seu interior nem divisões tem?
E tu, personagem acabada de nascer?
Eu, eu o quê?
Eu, eu disfarço-me de cidade e morro nas tuas mãos de poeira.


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 16 de Novembro de 2013

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