quinta-feira, 15 de junho de 2023


 De um pequenino nada,

Quando esse nada…

Quando esse nada é tão pequenino…

De um pequenino nada,

Acorda o mar,

E o mar…

Transporta nos seus lábios

Todo o silêncio em pequenos círculos de luz…

 

 

 

Francisco

Labirinto de insónia

 Procuro nas minhas mãos

O sono e o silêncio das primeiras lágrimas da madrugada.

Procuro nas minhas mãos

Vazias

Distantes…

Procuro nas minhas mãos

A luz diáfana das marés de engano

E todas as tristezas da alvorada,

 

Visto-me de zé-ninguém

Sabendo que um outro alguém

Também vestido de uma outra coisa qualquer…

Me persegue neste labirinto de insónia

Devoluto

Frio…

E escuro como os túneis de vento,

 

Procuro

Procuro nas minhas mãos…

A sombra

E o além,

 

Procuro nestas mãos inventadas

Por alguém que não conheço

Que nunca vi

Mas que existe

E está lá

De lá

Onde este navio apodrecido

Ainda resiste

Ainda procura nas minhas mãos…

Um pedacinho de mar

Antes que o mar…

Antes que o mar morra

E este pobre barquinho…

Adormeça

E das minhas mãos…

Um sorriso de alguma coisa…

Cresça.

 

 

 

Alijó, 15/06/2023

Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 14 de junho de 2023

Gemido-uivo

 

Há um gemido-uivo

Em cada olhar do teu cabelo

Em cada silêncio dos teus lábios.

Há um gemido-uivo

Que pertence à noite

Que é construído em aço laminado

E no peito

No peito brincam os meninos da sua infância…

 

Há um gemido-uivo

Triste

E coitado

Um gemido-uivo em cada parêntesis da tua mão

Depois da tempestade zarpar.

 

Há um gemido-uivo

Em uivos-gemidos de medo

Quando o tédio desce à cidade…

E a cidade

Entre outros gemidos de medo…

Come o gemido-uivo

Que existe em cada olhar do teu cabelo.

 

Há um gemido-uivo

No Oceano do teu sorriso

Um gemido sem Pátria

Que fez o serviço militar em algures por aí…

E crucificaram-no num belo dia de silêncio

Junto ao peito da saudade.

 

Há um gemido-uivo

Um pequenino gemido-uivo

Com medo

Com fome

Que grita

Que chora

Que não come…

Um gemido-uivo do além-mar

Deste mar que não morre.

 

 

 

Francisco

14/06/2023

Acácias

 

Podia apelidar-te de nada

Simplesmente de nada.

Olho este pedaço de papel…

E vejo os traços que semeiam em mim

Estes traços que são meus e que só a mim pertencem…

Enquanto a noite em sofrimento

Se esconde num qualquer olhar de espuma do teu corpo.

 

Olho este pedaço de papel

Que era branco

Que não tinha nome

Agora deixou de ser branco porque tem os meus traços…

Mas continua a não ter nome.

 

Também eu

Também eu gostaria de não ter nome

Mas os meus pais

Teimosos

Apelidaram-me de (nada ou de tolo)

Tal como este pedaço de papel…

 

Durante a noite

Durante a noite visto-me de marinheiro

Saio de casa

Entro no teu Oceano…

E por lá ando

Em busca de crocodilos amansados.

Na adolescência apaixonei-me por uma trapezista

Sei lá…

Eu ficava horas a olhá-la em pequenos círculos de desejo… sobre o mar

E depois

Depois escrevia-lhe poemas

E se eu tivesse fugido com ela

Como ela queria…

Hoje talvez fosse alguma coisa

Tudo trapezista

Menos ser nada.

 

Podia apelidar-te de nada

Simplesmente de nada.

Olho este pedaço de papel…

E vejo tanta coisa

Meu amor

Vejos estrelas

Vejo rostos que me solicitam…

AJUDA…

E eu

E eu não os posso ajudar

(tal como não os pude ajudar).

Vejo animais

Muitos animais

E vejo uma coisa curiosa… meu amor…

Vejo a equação do sono

Poisada nas tuas mãos…

Das tuas que rezam…

Nas tuas mãos onde choram…

As acácias da minha infância.

 

 

 

Luís

14/06/2023

O rio luz

 

Neste pedacinho de luz

Que às vezes se esconde

Se esconde no teu olhar…

Que às vezes brinca

E alimenta o meu olhar…

Neste pedacinho de luz

Onde escrevo o teu nome…

Vêm a mim

(Quando cai a noite sobre a sombra das minhas mãos…)

Vêm a mim

Todas as estrelas do silêncio.

 

Neste pedacinho de luz

Que é ausente

Que é carente

Que ainda não tem nome…

Neste pedacinho de luz

Escondo o teu olhar…

E a paixão em fome.

 

Neste pedacinho de luz

Deste pequenino pedacinho de luz

Que sofre quando a madrugada se abraça à insónia

Quando a insónia me abraça

E me beija

Neste pedacinho de luz

Ao cair da tarde

Junto ao rio…

A este pequenino pedacinho de rio…

Que tem nome

Que ama

Que deseja…

E apenas o conheço…

Como o rio luz.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

14/06/2023


 Não confundas A com B, quando o B pode ser igual ao A…, mas o A é diferente de B.

 

Um dia serei marinheiro, e todos os peixes serão meus amigos…

domingo, 11 de junho de 2023

O livro do porquê

 

Sabe-se lá porquê,

O porquê de tudo,

Quando tudo…

Quando tudo é quase nada.

 

Sabe-se lá porquê,

Da noite escura, porque é triste a noite…

Na tristeza do porquê,

 

Sabe-se lá porquê…

Porque morrem as estrelas,

Porque nascem cada vez mais imbecis…

E cada vez mais tolos,

Sabe-se lá porquê…

Porque tanto tolo há,

No Reino do porquê…

 

Sabe-se lá porquê,

Sabe-se lá de quê…

Quando do porquê…

Um livro se lê,

Do livro do porquê.

 

 

Francisco Luís Fontinha