domingo, 27 de março de 2016

o silêncio suor na penumbra palavra em destruição


a destruição da alma

na abóboda silenciosa da manhã

um suspiro

a ausência do teu corpo

neste manchado lençol de prata

a ausência do teu corpo

neste imensurável destino menino

a sinfonia da saudade

encastrada nos ossos da alvorada

sinto-me um cadáver inventado pelo sonho

sussurro-te as palavras mágicas da sombra

sussurro-te as palavras mágicas do Adeus

e desapareço na ténue lentidão do sorriso

amo-te destruição da alma

conflito íngreme da solidão

estou só

muito só

que nem tempo tenho para abraçar os barcos em regresso

que trazem promessas

riquezas

brincadeiras de criança

a bandeira do amanhecer

hasteada nos teus braços

a insónia amestrada no palco do circo

o frágil miúdo

inacabado

ausente

e apaixonado pela cidade

inventei amores

inventei desamores

inventei milhões de iões

beijando electrões

inacessível inculto dos comboios da noite

vou com o circo

amo o circo

e as montanhas de Lisboa

amo o circo

e as montanhas de Luanda

barcos

o engate do miúdo numa noite de copos

invade-me o sono

o silêncio suor na penumbra palavra em destruição

não tenho ossos

sonhos

noite

não tenho nada

meu amor

nada

 

 

Francisco Luís Fontinha

domingo, 27 de Março de 2016

sábado, 26 de março de 2016

os meus livros


(com amor para a minha mãe um feliz aniversário)

 

amo os meus livros

e os teus olhos de madrugada mimada

amo a vida construída de janelas

e de portas de entrada

amo o teu corpo camuflado pelas ervas daninhas do amanhecer

amo as palavras de escrever

e os versos de chorar

amo os barcos

os rochedos vestidos de barcos

amo o mar

e as planícies do sofrimento

amo o vento

que não quer regressar

amo os meus livros

e os teus olhos

e os livros dos teus olhos

e os olhos dos teus lábios

amo

amo sem ser amado

pelas palavras

e pelos teus olhos de madrugada mimada

 

Francisco Luís Fontinha

sábado, 26 de Março de 2016

sexta-feira, 25 de março de 2016

remetente ausentado


a felugem do corpo

no alfabeto secreto da paixão

as múltiplas palavras ensanguentadas

no deserto coração

as madrugadas invisíveis

estas que o são

e não regressam à minha mão

nunca mais

a felugem do corpo

descendo as ruas íngremes da cidade

o feitio estranho da cegonha vaidade

quando a saudade

poisa no ombro do beijo

os lábios amargos do musseque no abismo desejo

sem destino

este menino

sem cartas de amor

este remetente ausentado

 

Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 25 de Março de 2016

quarta-feira, 23 de março de 2016

janela amar


o relógio nunca cessa de chorar

as lágrimas do mar parecem pálpebras envenenadas

nos socalcos da saudade

o rio esconde-se nas umbreiras do silêncio

como se fosse a fera amestrada do vento

sem sorrisos de vida

nas espalmadas marés do sono

o relógio vive

escuta os meus lamentos

enquanto lá fora alguém sofre

levemente andando pela cidade de algodão

e inventa sonhos

e pede-me pão

nunca se cansa de chorar

este triste relógio de corda

não sente a dor

não sente a morte

daqueles que partem e deixam de ouvir a Primavera…

e levam no coração uma pedra

do infinito abismo de habitar uma calçada

um corpo estranho

imbecil

e velho

o relógio nunca cessa de chorar

alegre

nas noites sem dormir

abre a janela amar

toca no cortinado amor

e envelhece esperando que o tempo o venha buscar

até que uma qualquer tempestade o obriga a parar…

 

Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 23 de Março de 2016

segunda-feira, 21 de março de 2016

O fulgor da noite


Sentia a tua mão no fulgor da noite,

Cansei-me do teu silêncio

Quando acorda a manhã,

E lá fora a viagem espera-me

Sem destino nem lugar para aportar,

Sentia a tua mão

No meu indesejado destino,

Sem palavras,

Sem rios para navegar…

Um sonâmbulo indiscreto

Sobrevoando as gaivotas

E palmilhando um corpo vazio…

Tenho pena dos teus ossos transformados em poeira,

Pedaços de nada

Alicerçados ao cais da despedida,

Cansei-me das tuas mãos,

Cansei-me de mim e do teu sorriso,

Cansei-me dos teus olhos

Que ofuscam o luar,

O sonho da solidão

Nas raízes da paixão…

Estar só

E sentir a tua mão no fulgor da noite.

 

Francisco Luís Fontinha

segunda-feira, 21 de Março de 2016

domingo, 20 de março de 2016

Os dias...

Os dias encostados à maré, um sorriso de sémen aprisionado na garganta, sinto o peso do corpo sentado no esplendor da noite, entrelaço as mãos, começo a rezar…, esqueço-me de mim, de ti, dela, e dele, nunca percebi o silêncio das aves, dos pinheiros abandonados entre os rochedos do desejo, abro as pernas, sinto-te em mim, sorris
Amanhã um jazigo de sol entranhar-se-á em ti, à noite regressavam com os guizos da paixão, a borboleta poisada no teu ombro, meu amor, as imagens do nosso sofrimento suspenso nas sombras do esquecimento, estou só, sem o teu peso no meu peso, um dia voltarás a mim,
Sorris, fugimos do caos como fugiram todas as paixões deste areal, um barco morrerá nas tuas mãos, um marinheiro morrerá na minha mão, ele sofre, ele sente… o meu peso?
As ruas desertas, o sexo misturado no luar, os dedos meus encarnados no teu peto, e sorris…
Partir, os dias encostados aos meus dias, imaginas-me dentro de ti, eu, e eu… tão longe da tua palavra, do teu silêncio quando o meu arde na fogueira do adeus, estou só, sozinho neste inferno de morte, a vida desgraçada descendo a calçada, o corpo amarrado aos cortinados do medo, o jazigo da paixão encolhe-se no seu esqueleto, hesito, tenho medo, e volto a fugir, amo-te, amo-te como jangada do poema deambulando os alicerces cromados do circo da alegria, hoje tiraram-me um retracto, ficou mal, estou velho
Velha, cansada deste inferno encostado aos estilhaços da saudade, encosto-me a ti, meu amor, encosto-me a ti sabendo que nunca mais voltarás a minha noite,
Cansado,
Estou velho. Pareço um farrapo engatando gajos antes de cair a noite, sonho, sonho com as viagens ao escuro, a fome, lá fora, vive, mora e morre a fome, meu amor, lá fora as esquinas do sofrimento, as velhas nuas avenidas das orgias em papel, a tinta desta caneta, só, sozinho, esquecido nesta alucinada grandeza dos povoados beijos do Além…
Amanhã, Francisco, amanhã…
Sinto-te, sento-me no teu corpo de velhice, sempre o sono, a amargura, e nada de beijos, meu amor, e nada de beijos, meu amor…
 
Francisco Luís Fontinha
domingo, 20 de Março de 2016

sábado, 19 de março de 2016

Tristes dias


São tristes os dias sem ti

Que a noite alimenta

Sem saber que a solidão existe

E mente como mentem todos os relógios…

Que o meu pulso abraçou,

São tristes as madrugadas

Sem os teus gemidos

E sofrimento,

São tristes os dias sem ti

Que a noite lamenta

E descobre em cada sombra

O abraço passageiro da melancolia…

São tristes

Os dias…

Sem ti

Enquanto dormem as tuas mãos no meu rosto…

 

Francisco Luís Fontinha

sábado, 19 de Março de 2016