sábado, 24 de outubro de 2015

Palavras semeadas


Tenho no peito o cansaço da manhã ensanguentada,

Semeio as palavras como se elas fossem sementes,

Cubro-as para as proteger da geada,

Falo-lhes, acaricio-lhes o cabelo com desenhos de serpentes…

Sento-me, e espero que acorde a madrugada,

Amanhã crescerão e nascerá um louco livro de poemas,

O meu livro, o meu filho, a minha alegria,

Fumo-as enquanto crescem,

Fumo-as enquanto ejaculam a triste poesia,

Ai… ai como eu queria…

Abraça-las como se fosse o amor da minha tarde junto ao rio,

E só de pensar que elas me esquecem,

Como me esqueceram todas as palavras que semeei…

Desenhei nos teus lábios,

Cantei nos teus beijos,

Entre gemidos e desejos,

Entre silêncios e sábios…

E perplexos adágios.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 24 de Outubro de 2015

Frágeis corpos

Todos os corpos são frágeis quando a mendicidade do desejo assombra a melancolia, nunca consegui perceber a loucura da paixão, o silêncio, a acto de permanecer suspenso nas tuas palavras, os teus beijos aprisionados, a tua boca penhorada aos meus lábios, quando percebo que na tua mão habita a saudade, o perfume da esperança e a liberdade,
Comes-me, meu amor,
Carnívoro sonho, peneirento abismo nas carcaças devoradas pelos abutres, obrigado, de nada, sempre às ordens do cansaço, meu amor, reconhecer a saudade do Inverno de ontem, à noite, meu amor, um pilar se sémen conquistando o embuste magnético da madrugada,
Todos os corpos, meu amor,
Ossos, envenenados orgasmos entre palavras e palavras não palavras, escondo-me, meu amor, escondo-me no teu púbis de granito, desapareço na tua vagina, abro a janela… olá, bom dia hoje dormi mal, quase
Todos os corpos,
Quase mergulhei no texto da infância, e pergunto-me… quem vai ler esta “merda” ou gostar desta “merda”, ninguém, claro, meu amor…
 
(ficção)
Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 24 de Outubro de 2015

sexta-feira, 23 de outubro de 2015


Fontinha - Outubro/2015

A espada da paixão


Tínhamos no peito a espada da paixão,

Este corpo dilacerado nas cosmopolitas manhãs de incerteza,

O medo de acreditar no amor, quando o amor morreu nos teus braços,

O significado da palavra envenenada,

O silêncio em viagem,

Sem destino,

Correndo para ao mar,

Peço um desejo…

Amar-te sem preconceito,

Não o consigo, só, eu, absorvido na neblina da manhã,

Escrevendo no capim as palavras proibidas,

Que só o teu corpo sabe distinguir do sonho,

Tínhamos no peito…

Os gemidos dos Oceanos entre orgasmos e desenhos,

As palavras de ninguém,

O homem de vidro sobrevoando as mangueiras de um quintal imaginário,

E hoje, e amanhã…

Somos engolidos pelo desejado beijo.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 23 de Outubro de 2015

quinta-feira, 22 de outubro de 2015


Sonhos de cordel


Se o cubo de vidro se partir

Deixo de ter Pátria (já não a tenho)

Identidade

Nome

Idade,

Se o cubo de vidro se partir

Deixo de ser eu

O menino dos papagaios em papel

O menino dos musseques

E dos sonhos de cordel,

O machimbombo apeado no meu peito

Sem saber que o amor não pertence a este horário

Cidade

Sonho

Balneário deserto recheado de corpos perfumados

E plantas amarguradas,

Se o cubo de vidro se partir

Deixo de pertencer a ti

Montanha enamorada

Planície das sanzalas

Noite sem madrugada…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 22 de Outubro de 2015

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Sonhar


Perdido neste sótão da saudade

Misturado nos sonhos que fervilham nas palavras inventadas

Perdido neste cubículo sonolento

Das catacumbas madrugadas

Abraçado ao vento

Sem lamento

Quando lá fora há um rio em lágrimas

Que me procura

Com ternura

E esquecendo a vaidade

Perdido neste inferno sem morada

Este sótão… este sótão que se esconde na alvorada,

 

Este sótão cansado

Como um esqueleto de húmus invisível na tempestade

Perdido, eu, nesse teu coração de migalhas

Sofrendo porque vivendo sofrendo

Não sei viver

Sofrendo porque vivendo sofrendo

Não sei amar

Escrever

Desenhar

Ser o mar

Dançando ao pôr-do-sol

Sem perceber que estou a sonhar…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 21 de Outubro de 2015