sábado, 4 de junho de 2016

todas as noites


todas as noites

entre segundos de espera e minutos de silêncio

o derradeiro sofrimento do relógio de pulso

sem tempo

imenso longínquo abstracto do corpo submerso no vazio

a alma desesperada suspensa num cabide de prata

e nas mãos sangrentas poisa o amor…

todas as noites

ossos em fotografias esquecidas no sótão da saudade

todas as noites

perdido na idade

a palpitação sonolenta do cansaço

quando os astros se sobrepõem aos anéis geométricos do beijo

infinito secreto amar

que deambula nas metáforas da montanha desesperada

pela infinita solidão

o sentir não tocando a tua mão

todas as noites

vagabundas auréolas de açúcar

sobrevoando o teu sorriso…

no pulso

um relógio enlouquecido pela tempestade das palavras

todas as noites

o medo

a palavra da palavra

brincando num caderno de nata…

e todas as noites

a lata

o zinco telhado da casa húmida

no triciclo de chapa…

morre lentamente

sufoca na janela sem vista para o mar

todas as noites

os barcos na algibeira da vaidade

prisioneiros do meu perfume

entre segundos de espera e minutos de silêncio

 

Francisco Luís Fontinha

sábado, 4 de Junho de 2016

quinta-feira, 2 de junho de 2016

Sou tão feliz… sou tão feliz meu amor…


Sem tempo. Morro acreditando na serpente do movimento,

Que invade o silêncio do corpo.

Esqueço-me de mim,

Esqueço-me de ti…

E das tardes junto ao rio,

Sou o profeta do abismo,

O cansaço da tristeza…

Sem tempo.

Sem tempo alicerço-me à tua mão

Regressando de um outro poema não escrito por mim,

A tarde rompe a poeira do teu olhar,

Poisa cuidadosamente no teu peito…

E eu,

E eu fico sem saber se amanhã haverá estrelas no teu sorriso,

Porque o Universo cessa de chorar,

E dentro de ti,

Profundamente no poço da amargura,

As lágrimas do mar.

Cerro os olhos e finjo a morte do poeta sem ninguém…

Aflito enquanto a noite se aconchega na parede do amor,

Como uma tela aprisionada à manhã sem nome.

O eco dos teus anseios perfilados na escuridão,

Uma palavra em transe,

Senta-se no limite da paixão…

Sou tão feliz… sou tão feliz meu amor…

 

Francisco Luís Fontinha

quinta-feira, 2 de Junho de 2016

Apresentação da obra poética de Francisco Luís Fontinha





Ao Município de Alijó.
À Professora Clara.
Biblioteca Municipal de Alijó e toda a sua equipa.
Aos presentes e aos ausentes; os amigos. (AL Berto)
 
Obrigado a todos.
 
Francisco




quarta-feira, 1 de junho de 2016

o ausentado


a metrópole sofre

chora e engana

todos aqueles que partem

a gente acostuma-se à ausência do corpo

na neblina incendiada pela escuridão

um vulto de luz…

caminha na minha direcção

pergunta-me pelo ausentado

o coitado

que partiu…

que partiu sem deixar rasto

ou migalhas no silêncio

e eu

preocupado

respondo-lhe…

não sei do coitado

ausentado

mas sei que ele partiu

numa noite embriagada de palavras

ruídos alguns…

e a madrugada sem a ver

a metrópole sofre

chora e engana

resigna-se apenas a um simples bilhete abandonado na porta de entrada

esqueço-me

perco-me

e eu

preocupado

sangrando sílabas

porque um dia

o coitado

do ausentado

partiu… e nunca mais foi encontrado

 

Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 1 de Junho de 2016

sexta-feira, 27 de maio de 2016

Gaivota junto ao Tejo


Imagino-te arrastando os suspensórios do cansaço,

O cigarro suspenso na boca,

E nas mãos as minhas mãos,

Trémulas como a tempestade…

Apareces,

Desapareces,

E ausentas-te durante o sono,

Entras nos meus sonhos,

Escreves no meu corpo com a caneta da saudade,

O rebelde menino,

Sentado à janela a olhar o mar…

Sinto-te dentro de mim,

 

Alimentas-te do meu sofrimento,

E pertences às flores do meu jardim,

Imagino-te arrastando os suspensórios do cansaço…

Enquanto lá fora alguém chora a tua partida,

Apátrida memória que se alicerça aos meus braços,

E tens no olhar um triciclo, um velho triciclo moribundo,

Doente,

Sem nome…

 

Imagino-te, meu amor,

Deambulando pela casa embriagada de dor,

Os cinzeiros cessam o sorriso dos teus lábios,

Há no teu corpo uma barcaça desnorteada,

E que se afunda no meu Oceano…

Fico com medo de perder-te…

E perdi-te sem o saber…

Foste, foste sem dizer Adeus,

E nem coragem tiveste de escrever-me…

Abraçar-me,

Dizer-me que partias e um dia aparecias no meu peito,

Como se fosses uma gaivota junto ao Tejo.

 

Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 27 de Maio de 2016

terça-feira, 24 de maio de 2016

rabiscos de prazer


todos as noites me sento nesta cadeira sem dono

enquanto não regressa o sono

vou rabiscando qualquer coisa na mão

uma leve brisa guia os barcos até aos meus sonhos

onde poisam lentamente noite adentro

hoje sei que não vou sair daqui

hoje… hoje vou dançar ao som das tormentas

e dos castiçais de prata

que brincam dentro deste velho casebre

iluminado pela paixão

incendiado pelo teu perfume invisível

que a madrugada há-de comer

o derradeiro pequeno-almoço do amanhecer

até que vem o sono

me deito sobre a cama

e invento apitos

e invento gaivotas em papel…

aos gritos

 

Francisco Luís Fontinha

terça-feira, 24 de Maio de 2016

domingo, 22 de maio de 2016

estrelas da manhã


caem sobre ti as estrelas da manhã

o sonífero desejo dos meus braços

encalhado no teu olhar

como a pérola adormecida da paixão

rompendo a montanha do Adeus…

subindo lentamente as escadas do mar

até ao sótão do coração…

a esfinge aventura do terno menino

sobrevoando os cadeados de prata

que aprisionam os barcos de madeira

caem sobre ti as estrelas da manhã

nas sofridas avenidas do prazer

que as cidades imaginadas

comem ao pequeno-almoço

sem o saber…

o mendigo das vestes negras

tropeçando na tristeza

senta-se no almoço sem riqueza…

e reza…

e chora…

porque caem sobre ti as estrelas da manhã.

 

Francisco Luís Fontinha

domingo, 22 de Maio de 2016

sábado, 21 de maio de 2016

Estátuas sonâmbulas


imagina que as cidades são estátuas sonâmbulas

sons íngremes voando sobre o mar

que a alma absorve na escuridão

imagina que o amor é a floresta virgem

perdida nas mãos de uma criança

no seu sorriso uma bandeira

sem esperança

imagina que há na saudade um esqueleto de vidro

com cortinados de paixão…

perdido…

agachado no chão ténue do sofrido

imagina… meu amor

imagina as gaivotas poisadas no teu olhar

esperando o meu regresso

sempre

sempre ao madrugar…

imagina…

imagina o meu coração deixado numa loja de penhores

numa tarde de inferno

imagina…

imagina o cansaço da abelha no final do dia

embriagada de pólen

e de barriga vazia…

imagina… meu amor

esta carta sem remetente

esta carta sem destinatário…

imagina

imagina

meu amor

imagina que as cidades são palavras a arder

nos lábios do operário

sempre

meu amor

sempre sem vontade de escrever…

 

Francisco Luís Fontinha

sábado, 21 de Maio de 2016

sexta-feira, 20 de maio de 2016

Ausência


Cessou a saudade. Sinto o peso da noite sobre os ombros,

Uma coisa inexplicável,

Sofrível,

Cessou a saudade repentinamente,

Como o calafrio do desejo…

Na incandescente manhã desassossegada,

O término.

Segundo as previsões astrológicas…

Nunca deveria ter nascido,

Mas quis um Domingo que eu olhasse pela primeira vez o mar…

Distante, mas enraizado nos meus braços,

Como a barcaça do sofrimento,

Anos mais tarde,

Encalhada nos rochedos da montanha,

E sentia no corpo a ausência,

Tão pobre este destino…

De ser criança…

De ser menino.

 

Francisco Luís Fontinha

sexta-feira, 20 de Maio de 2016