domingo, 8 de setembro de 2013

gritos de revolta

foto de: A&M ART and Photos

sinto-o correr nos poços escuros do meu corpo
quando escarpas e ventos se alicerçam nas minhas tristes mãos de areia
sinto-o como se ele fosse uma lâmpada de cristal vomitando palavras
tracejados traços no sorriso de uma abelha
e sinto-o e sinto-a
em mim depois de adormecer a solidão
sinto-o correr nos poços escuros... do corpo
e há uma corda invisível em cada esquina do sofrimento
que as cidades descobrem depois de acordar a manhã
e as ruas absorvem as lágrimas tuas
que correm nos poços...
escuros nus dormentes ausentes das sílabas de prata

vazios como o silêncio desgovernado
dos teus íngremes cabelos com sabor a naftalina
e de uma gaveta fechada
uma sombra disfarçada de imagem
emerge no espelho da dor
estás triste
como se o teu barco naufragasse no profundo Oceano mar...
e no entanto
sem o perceberes
uma jangada voa nos teus olhos magoados
como uma gaivota de oiro envenenada pela insónia de uma velha estória...
e sinto-o e sinto-a... dentro de mim em gritos de revolta


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 8 de Setembro de 2013

sábado, 7 de setembro de 2013

e eu e eu acreditei

foto de: A&M ART and Photos

não sei como são as tuas manhãs de solidão
quando acordam os vidros embalsamados pela escuridão do corpo suspenso no tecto da paixão
não sei como és quando descem sobre ti as mandíbulas ensanguentadas do orgulho
quando o mar entra na tua mão
e no peito
uma âncora de prata alicerça-se como um cogumelo encarnado
voando sobre os cinzentos teus seios de flor apaixonada
não sei como são as tuas tristes manhãs de solidão
se és branca
escura
alegre abelha de silício
procurando a colmeia do púbis em madrugadas embriagadas

não sei como são os barcos onde nasceste
viveste
brincaste com os meus olhos debaixo das mangueiras de papel
e tínhamos dentro de nós
o frio congelado dos beijos nunca dados
inventávamos tardes numa sanzala de cartão
e chapinhávamos nos charcos de incenso
as doces pernas da infância
brincávamos
e em beijos
ouvíamos os meninos que dormiam sobre um colchão de palha castanha...
e chovia e dormiam e choviam coloridas imagens de triângulos equiláteros

eu procurava nos teus seios ainda por descobrir o cosseno dos teus abraços
e tu
calculavas a tangente do sémen que um dia apareceria nas equações húmidas diferencias
que de um caderno quadriculado saltitavam como pigmentos de resina depois da despedida noite em lençóis de Aspirina derretida
éramos tontos vagabundos de areia
apaixonados loucamente e literáriamente vestíamos personagens magoadas pela ausência do Pôr-do-Sol...
não sei como são as tuas manhãs de solidão
porque a noite rende-se à porta de entrada
onde moram as tuas loucuras fantasias dos telhados em zinco
uma sanzala chorava
eu chorava...
e tu dizias-me que o cacimbo tinha levado o meu triciclo e eu e eu acreditei


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 7 de Setembro de 2013

Esqueleto de aço com mãos de seda

foto de: Francisco Luís Fontinha

(dedicado ao amigo Zeca Gaspar)


Se sentes a pulsação do sol não digas que estás triste, inventa riscos traçados nas paredes das nuvens envergonhadas, inventa desassossegos nos cansaços das caravelas teus olhos, hoje, encerrados como quatro paredes de uma cela com meia dúzia de grades em papel colorido, inventavas traços nas costas dos morcegos, inventavas sílabas na língua dos socalcos inclinados descendo o Tua... e ao longe, o verdadeiro apito da vida, as tuas mãos que seguravam as escadas em direcção ao Céu, as tuas mãos, iguais às minhas, iguais às de tantos outros camaradas... acreditávamos que era possível vencer a insónia, o cansaço e a fome, como tantos outros, tudo demos, e tufo fizemos, se sentes a pulsação do sol, tu, amigo, não fiques triste pela ausência da luz vestida de marinheiro, não fique triste amigo
(prisões de chocolate com sabor a melancolia)
E no entanto, tu, eu, acreditávamos no sonho, na saudade, na literatura e nos automóveis com nomes esquisitos
Dizias-me... Isto é um Lada... e
E nas árvores com pássaros coloridos por diversos artistas, por diversas mãos, como as de há pouco, pequenas, silenciosas, e meigas, em chocolate, em porcelana, em...
E subíamos e descíamos, ruas e becos e montanhas, e nunca, e nunca
Adormecíamos, e nunca, e nunca
Éramos vencidos pelo cansaço, pela vergonha, ou
Dizias-me... Isto é um Lada... e ao longe, o comboio subindo o Douro, ofegante, na mala do carros a propaganda misturada com inocência, misturada com a saudade, misturada com os sonhos, os mesmos sonhos que ainda hoje, uns mais do que outros, acreditam, acreditamos, e tu? Onde estarás agora, logo, e pela madrugada? Andarás a segurar as escadas sonâmbulas onde eu timidamente, como medo de tombar sobre as pedras íngremes do medo... eu... subia, subia
Não tenhas medo pá, ninguém nos bate!
Claro que não, claro que não, respondia-te sempre com todo o respeito que merecias, mereces... e continuarás a merecer, como continuará suspenso na parede da minha biblioteca o quadro que me ofereceste, autografaste... e quando te encontrar, talvez
(prisões de chocolate com sabor a melancolia)
Se sentes a pulsação do sol não digas que estás triste, inventa riscos traçados nas paredes das nuvens envergonhadas, inventa desassossegos nos cansaços das caravelas teus olhos, hoje, encerrados como quatro paredes de uma cela com meia dúzia de grades em papel colorido, inventavas traços nas costas dos morcegos, inventavas sílabas na língua dos socalcos inclinados descendo o Tua... e ao longe, o verdadeiro apito da vida, as tuas mãos que seguravam as escadas em direcção ao Céu, as tuas mãos, iguais às minhas, iguais às de tantos outros camaradas.. porque a vida é isto, entramos uns dentro dos outros... e depois...
Depois...
Simplesmente... partimos.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 7 de Setembro de 2013

Texto em destaque - Blogue Cachimbo de Água - Sapo Angola


Texto em destaque - Blogue Cachimbo de Água - Sapo Angola

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

então um dia

foto de: A&M ART and Photos

então um dia vou cobrir o teu corpo de rosas...
inventar o sono que dormirá sobre os teus seios em pedaços de pétala
então um dia vou saborear os teus lábios como se fossem pequenos favos de mel
como se fossem Primaveras embebidas em silêncios
mergulhadas
como se a luz fosse uma janela
e o mar
a jangada por onde foges
corres
invisível no corredor da solidão
então um dia voarás nos meus braços
e do teu sorriso uma fina lâmina de madrugada embriagar-se-á com o teu corpo salgado


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sexta-feira, 6 de Setembro de 2013

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Assim seja, assim seja, amigo fiel...

foto de: Francisco Luís Fontinha (Noqui)

Será que me vais perdoar? Os dias terminavam em canseiras brincadeiras e ao longe submergia o cheiro do rio encurvado, um barco flutuava sobre o teu peito com asas fungiformes, acendiam-se as lâmpadas da dor, olhavas-me, eu olhava-te, trocávamos silêncios por pedaços de solidão, depois chegava o perfume de embriaguez que servia de esconderijo das mulheres que te absorviam como as moscas embebidas nos cortinados de areia, eu percebia a tua dor, eu sentia o teu sofrimento, eu
Adormecia envenenado pela tua tristeza vagabunda que circulava pelas ruas da velha cidade, pegávamos numa pistola, brincávamos com balas de borracha e teias de aranha magoadas pelos tornozelos das sombras das estrelas em papel crepe, solitáriamente correndo becos, encostando-se a esquinas invisíveis, e inventando mares de prazer entre lençóis de espuma, eu
Adormecia,
Pensava em ti, recordar-te como criança saltitando os socalcos dos íngremes vómitos do comboio em direcção ao Porto, curva, curva, montanha, montanha, e nada mais
Xisto?
Quanto houver, venha ele, se for preciso... comemos-o como se comem os mabecos que o inferno tece, vulcões com sorrisos de marfim, tabique em solstícios envergonhados, e havia janelas com larvas suspensas nas persianas da lareira do incenso, adormecia, adormecia, adormecia... até que o vento nos separava, até que a tempestade nos transportava para
Onde?
Xisto, voávamos sobre as circunferências tracejadas dos olhos castanhos que viviam na página trinta e cinco do livro das noites sem dormir, tínhamos vergonha de sonhar, tínhamos vontade de comer
Os mabecos?
Tristes, alegres, cansados folgados, meninos e meninas, soldados
Todos temos o direito de amar...
Guerreiros, canhões de guerra barcos e petroleiros
Todos temos o direito de amar...
Xisto? Quanto houver, venha ele, se for preciso... comemos-o como se comem os mabecos que o inferno tece, vulcões com sorrisos de marfim, tabique em solstícios envergonhados, e havia janelas com larvas suspensas nas persianas da lareira do incenso, adormecia, adormecia, adormecia... até que o vento nos separava, até que a tempestade nos transportava para
Os socalcos?
Para, para depois de amanhecer descermos as escadas do poço da morte...
Assim seja, assim seja, amigo fiel.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 5 de Setembro de 2013

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

um dia

foto de: A&M ART and Photos

um dia serei eu
um dia acordará a madrugada vestida de branco
com uma pétala de rosa em cada estrela suicidada
um dia vestir-me-ei de amanhecer
como as páginas de um livro perdido na livrarias em poeira...

um dia acordarei e tu és uma pausa
como as sombras do musseque
depois da chuva se entranhar na terra ressequida
um dia
um dia ausentar-me-ei... como as bananeiras do teu sobrolho

como as sílabas dos teus lábios
e um dia saberás quem sou porque morri
partirei para a terra de ninguém
não estarás certamente à minha espera... porque tu não existes
porque tu és uma feiticeira com asas de carvão e boca de crocodilo


(n ã o r e v i s t o)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 4 de Setembro de 2013