segunda-feira, 19 de agosto de 2013

O encontro – A chuva e o nu corpo dela

foto de: A&M ART and Photos

Eu deixo a conversa fluir... como a água da chuva a cair sobre o teu nu corpo, saboreando as partículas de desejo que descem das nuvens..., ouvem-se as bolhas de sabão a cair nas tuas costas, ouvem-se as sílabas mergulhadas nos teus lábios coloridos, e aos poucos desces pelas minhas mãos como sandálias envenenadas por uma calçada íngreme, e ao fundo, o rio, o Tejo, ele que te espera, e te acaricia entre as medusas de olhos castanhos, sinto-te dentro de mim, e sei, sei que amanhã não estarás na minha cama...
Vamos juntos... enrolados como duas serpentes envenenadas pelo sémen do amanhecer... e lá fora uma maçã acaba de tombar sobre os teus seios, afago-os e mordo-os com os meus finos dedos, e sabes que penetrarei em ti como se fosses um livro de poemas dentro da algibeira do espelho encarnado que acorda antes de acordar o teu orgasmo, é tarde, o relógio da sala cansou-se de ouvir-nos em latidos estranhos que atravessam as paredes de gesso e ripa, o tecto olha-nos, e inveja-te, porque permanecerás eternamente nas suas mãos, como um candeeiro suspenso e que ilumina a noite derretida em pura seda como lençóis sobre o teu corpo de areia, é tarde, lá fora dormem os homens e as mulheres, nós, nós permanecemos eternamente acordados, e procuramos entre os estilhaços dos líquidos sobejantes e adormecidos sobre a cama a saudade, e os beijos,
É tarde, para ti, quase que dormes, olho-te como se fosse o tecto, e vista de cima, tu, pareces um jardim com flores em papel... que voam quando tocas no meu peito, e fincas os lábios ficando entre eles... uma pétala de orvalho,
Estás loucos, oiço-te,
Louco porque a poesia derrete-se como a manteiga sobre os teus seios, louco porque mergulhas na chuva diluída em pequenas lâminas de fogo, tu, tu ardes como um livro depois de lido, folheado, manuseado cuidadosamente, e o papel da tua pele cola-se-me como uma borboleta desesperada depois da tempestade, oiço-te
Estás louco,
Louco porque inventaram o amor, louco porque inventaram o desejo e os jardins junto ao Tejo, e louco, louco porque oiço os uivos teus beijos de encontro à prateleira onde moram os livros de António Lobo Antunes, e louco
Estás louco,
E loucos, loucos barcos em gaivotas saciando o cio nas noites que atravessam o Tejo, e do outro lado, os edifícios em esqueletos vadios, que correm e comem,
Meninos, meninas,
Debaixo da tenda do circo que aportou por aquelas bandas, o vento dá-lhes força nas velas e começam em corridas vagarosas como palhaços velhos, e de bengala, e sorrisos nos seus rostos
Meninos, meninas,
Procurando a fome nos vultos zumbis da avenida adormecida, debaixo da tenda do circo, e todos os sonhos realizáveis... O encontro – A chuva e o nu corpo dela.

(não revisto - Ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 18 de Agosto de 2013 / Segunda-feira, 19 de Agosto de 2013

Texto em destaque no Sapo Angola - Blogue Cachimbo de Água.

domingo, 18 de agosto de 2013

dizer-te

foto de: A&M ART and Photos

dizer-te que as minhas ervas são felizes
como são felizes os sons melódicos das tempestades de areia
orgasmos invisíveis que as plantas constroem na penumbra ilha do amor
dizer-te que os barcos são cinzentos
lentos
como o coração apaixonado
como o corpo em desejo
perdidamente perdido
em ti
no teu beijo
dizer-te que as minhas ervas são tão felizes
que vivem no meu jardim sem o saberem

amam
sofrem
fazem amor no silêncio pôr-do-sol
e dizer-te que tal como as minhas ervas
que não o sabem
também tu
nunca saberás se amo
amei
porque também o teu jardim
é escuro
e tem muitas árvores vestida com sobretudos verdes
e sofrem e são felizes porque eu... dizer-te

tu
não acreditarás nas magnólias e sem o dizeres
dizes-me que amanhã haverá um barco em regresso
um piano vomitará sons como do terceiro andar descem pingos de sémen
que o vizinho deixa sobre as ervas da querida vizinha
tu
não acreditarás em mim
nem saberás que as minhas palavras
vivem
choram
e dormem no meio de nós
como se fossem um Deus à procura das almas perdidamente perdidas...


(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 18 de Agosto de 2013

A caverna da paixão

foto de: A&M ART and Photos

A voz mais bela, talvez, profundamente triste, há uma janela com línguas de fogo, e a voz, adormece, como vida vestida de vida, a voz, ela, deitada sobre o corpo circular da paixão, ouvem-se de dentro da caverna, as outras vozes, as outras palavras disfarçadas de vozes, mergulhávamos nos corredores de acesso a elas, às vozes e às cavernas, choravas pela partida do presente, pelo teu futuro incerto, choravas com o medo, de partires e deixares... a caverna e a paixão, que de dentro da caverna, vivem, comem, fazem amor ao final do dia, e no entanto, há uma janela, uma janela de onde se ouve o silêncio do mar a bater contra os rochedos do desejo, fervilhas como água em ebulição, pegas na minha mão, oiço os teus dedos longos e poéticos, de onde
Há sons melódicos em perfeita paixão,
Amam-se eles, e elas, digamos que, há uma paixão sem nome entre os sons melódicos e as palavras poéticas, fazíamos amor quando acordava o final do dia, sentavas-te em frente ao piano, esticavas os dedos no meu pescoço... e recomeçavas onde tínhamos ficados na noite anterior,
Dirias que eu
És louco, Francisco!
Dirias que... o piano do meu corpo está perro, velho, enferrujado... e brevemente
Dirias que eu
És louco, Francisco!
No fundo do mar, deitado sobre a areia húmida das tuas coxas, dirias que eu... e brevemente voávamos como pássaros sobre as tangerinas que dormiam na nossa caverna,
Conta-me uma estória, Francisco!
(Amam-se eles, e elas, digamos que, há uma paixão sem nome entre os sons melódicos e as palavras poéticas, fazíamos amor quando acordava o final do dia, sentavas-te em frente ao piano, esticavas os dedos no meu pescoço... e recomeçavas onde tínhamos ficados na noite anterior,
Dirias que eu
És louco, Francisco!)
A de um piano enferrujado com a mais bela voz da caverna da paixão, um piano disfarçado de piano, com braços, pernas, cabeça, um esqueleto com duzentos e seis ossos, um velho como eu, vivendo que faz de conta viver, sinto-te mergulhada em mim, sinto-te dentro de mim, como quando as tuas mãos se entranham no teclado do meu corpo... e tocas-me, e ouvem-se as vozes, os sons, e todas as palavras que a paixão alimenta,
És..., és louco, és louco Francisco Luís!
A voz mais bela, talvez, profundamente triste, há uma janela com línguas de fogo, e a voz, adormece, como vida vestida de vida, a voz, ela, deitada sobre o corpo circular da paixão, ouvem-se de dentro da caverna, se me é permitido o fazer! Diz-me tu!
Que és louco, Francisco, que és simplesmente louco...
E não o sou, Francisco, e não o sou...
Porque és tão querida, porque és tão desejável e desejada, porque há uma janela em nós de onde podemos ouvir o mar, e os sons do meu corpo... quando entranhas os teus dedos nele, e tocas, e tocas... os mais belos solos de piano, o meu corpo, ele, vestido de piano...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 18 de Agosto de 2013

Poço da morte

foto de: A&M ART and Photos

Como será o poço da morte
vestido de madrugada
sem flores
sem... sem quase nada,

Como será o teu olhar
entre horas e desgovernados ponteiros de papel
como habitas tu em mim...
como? Se eu para ti sou uma gaivota suspensa por um cordel,

Como será o teu cabelo
embrulhado no vento
como? Diz-me tu? Se o amor é uma árvore
adormecida no jardim do sofrimento...

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 18 de Agosto de 2013

sábado, 17 de agosto de 2013

Os travestidos bares do amor

foto de: A&M ART and Photos

Faltam-me as drageias comestíveis da paixão
reescritas no corpo incenso que a tempestade leva
longe chegam as nuvens tristes
silenciosas
tâmaras teus olhos prisioneiros de mim
tuas mãos de porcelana
amam
fazem sexo com as minhas mãos de areia
inventas-te como inventaste a chuva
como inventaste as janelas viradas para o mar
transgénicos barcos navegando em teus seios de prata
com velas de púbis desgovernados dentro do fumo incandescente do amanhecer,

Amávamos-nos como duas árvores de papel
aprisionadas a um cordel...

Faltam-me as drageias comestíveis da paixão
como uma cidade que arde dentro de ti
incendeias-te vomitando as palavras proibidas
gemidas da tua boca
em loucas avenidas
correndo subindo correndo e subindo...
como guindastes de ossos procurando o prazer nos sexos dos marinheiros
mórbidos entre o cais
e os travestidos bares do amor
cai o cortinado do teu peito
e encerra-se para sempre o desejo em ti
das tristes janelas viradas para o mar.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 17 de Agosto de 2013

Os calções brancos

foto de: A&M ART and Photos

As hormonas fervilham, cobre-se a lua com um fino manto de sémen, há delírios dentro dos calções brancos, tínhamos deixado na atmosfera um leve e intenso cheiro a sonho e a desilusão, ela diz que o dinheiro tudo compra, eu
Não o tenho,
Ela diz que eu
Tu nada podes comprar,
Vende-se, prostitui-se intelectualmente como se tratasse de um livro ainda por escrever, as hormonas
Fervilham,
Transparente como a chuva depois de se masturbar sobre os zinco telhados das sanzalas, a sombra desce da cidade, cobre os ombros da mulher emagrecida, triste, como o tecido depois de molhado, depois
Fervilham,
Diz ela,
Porque para mim, um simples aldeão esquecido no musseque da escuridão, não fervilham hormonas, nunca existiram os calções brancos, nunca... como o sabor da manga depois de dissipado o Cacimbo das margens íngremes do rio, mabecos, girafas, zonzos, todos os bichos da selva, lá fora fumava-se erva e outras raízes, que só
Diz ela
Fervilham as hormonas,
Ai se não fervilham, que só em África existem, que só em África fervilham, e diz ela, que a cidade dorme, extingue-se no silêncio vestido de cansaço, acabam-se as realidades virtuais, e começam verdadeiramente os
(nem uma foto de calções brancos encontro, coloco a mulher onde quando em criança rabisquei todo o seu corpo, tinha... cerca de cinco anos, pobre, sem dinheiro, e ela, ela deixou-o fazer, por caridade, por nada)
Textos infestados por pequenos insectos, os calções, os calções brancos dançam no interior do ânus ao som de Pink Floyd, o escritor lê poemas de AL Berto e alguns textos de Luiz Pacheco, cobre-se a lua com um fino manto de sémen, há delírios dentro dos calções brancos, tínhamos deixado na atmosfera um leve e intenso cheiro a sonho e a desilusão, ela diz que o dinheiro tudo compra, eu
Não o tenho,
Ela diz que eu sou um sonhador perpétuo, difícil de construir, fui feito a partir do barro e dizem elas, lá do velho musseque, que,
Tu nada podes comprar,
Oiço-o dizer (“tão triste mário sobre o tejo um apito” - de AL Berto) e dos calções brancos, nada, nem barcos, âncoras, fins de tarde no Rossio, nada, nem o pobre cimento que segura as asas do vento, e tu
Diz ela
Nada podes comprar,
Não o tenho,
Ela diz que eu sou um sonhador perpétuo, difícil de construir, fui feito a partir do barro e dizem elas, lá do velho musseque, que, o barro é como o cristal, lindo e belo, só que... muito mais barato, ele diz-me que eu com cinco anos escrevi todo o corpo das películas em desejo que chegavam até mim, bebíamos, e comestíveis cinzentas neblinas junto ao porto camuflavam todos os barcos em regresso, e ficávamos
A ouvir o mar,
E ficávamos...
Simplesmente a ouvi-lo,
(“tão triste mário sobre o tejo um apito” - de AL Berto)
Fervilham as hormonas dentro dos finos calções brancos, (nem uma foto de calções brancos encontro, coloco a mulher onde quando em criança rabisquei todo o seu corpo, tinha... cerca de cinco anos, pobre, sem dinheiro, e ela, ela deixou-o fazer, por caridade, por nada), e uma nuvem de gelo entra porta adentro da miséria cubata invisível...
Uma placa sobre a porta de entrada,
“Há caracóis”, e vivíamos felizes como serpentes no interior do ânus abraçados à fina réstia em tecido dos calções brancos,
Definitivamente,
Hoje, Hoje há caracóis...
(“tão triste mário sobre o tejo um apito” - de AL Berto).

(não revisto – texto de ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Sábado, 17 de Agosto de 2013