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quarta-feira, 18 de setembro de 2013

“Estou triste, meu amor, dizem que não vou ganhar a bicicleta...!”

foto de: A&M ART and Photos

Poderia perceber a tua ausência, e mesmo assim, acredito nas planícies do teu olhar mergulhado em espuma e corações amarrotados, que vivem, que fingem viver dentro de algibeiras com janelas de porcelana, opacas, tristes muralhas para que me seja proibido
Olhares-me,
Habito num castelo sem escadas, muros, flechas com ponta de aço, e nem gaivotas me visitam, amo e sei que sou amada, choro e percebo que sou chorada, desejo e sei que sou desejada, e das tristes muralhas para que me seja proibido sonhar, oiço as tuas palavras contra os cortinados de vento, rodopiando em redor do meu corpo, suspenso, levitando como uma espada de aço no peito de um soldado,
Olhar-te e perceber que já não és tu, olhar-te e perceber que deixaste de pertencer aos uivos gritos das sandália plastificadas, sonolentas, olhar-te e perceber que eu não sou eu
Deixas-te de existir, vives não sabendo viver, comes, bebes, e esperas o regresso do mar que nunca ninguém nos garantiu que existia, que ninguém dos nossos presente garante ter visto, e no entanto, esperamos, temos esperança que desçam das sílabas mórbidas das flores comestíveis...
Olhares-me
Apareçam os tão desejados muros com alicerces de prata, o xisto revestido e desenhado como se de um vestido se tratasse, e os pássaros, esses imbecis... comem às mãos das costureiras que travestem agulhas e dedais antes de cair a noite
Sobre mim?
Olhar-te... cansa-me!
Beijares-me?
“Estou triste, meu amor, dizem que não vou ganhar a bicicleta...!”, e precisava tanto dela, e precisava tanto
De mim?
Não, não... chegava-me apenas a tua sombras disforme, envenenada pelos espelhos das montanhas adormecidas, na tela misturam-se cores abstractas, imagens fotográficas voam sobre um velho rio com cabelo branco, um planeta poderia chamar-se de “Uva Moscatel” e o meu próximo negócio vai ser precisamente vender lotes de terreno na Lua, assim
De mim?
Ou então
Melhor ainda,
Melhor de que lotes de terreno na Lua? Não, Não consigo deslumbrar...
Podias vender garrafas com o ar de Trás-os-montes,
Melhor ainda,
Podias vender garrafas com o ar do Douro Vinhateiro,
“Estou triste, meu amor, dizem que não vou ganhar a bicicleta...!”, e precisava tanto dela, e precisava tanto
De mim?
De ti e das tintas acrílicas para preencher as imagens a preto-e-branco das fotografias que suicidam árvores antes de cair a noite e de se evaporar a tarde, na Feira da Ladra?
Saem três garrafas de ar de “Trás-os-Montes”,
Com certeza, minha adorada senhora, é para já... deseja factura?
Não?
Olhar-te e perceber que já não és tu, olhar-te e perceber que deixaste de pertencer aos uivos gritos das sandália plastificadas, sonolentas, olhar-te e perceber que eu não sou eu, olhares-me e entenderes que sou, fui, e serei
Esquelético?
Não, não minha querida,
Às vezes sinto-me uma mesa de uma sala de jantar, à minha volta, imensos parvalhões sentados em cadeiras forradas a pele de crocodilo, apetecia-me prender-lhes as pernas com uma corda e atirá-los pela janela, ouvia-os caírem sobre os rochedos da madrugada, partia-se uma das garrafas com ar do “Douro Vinhateiro” e
Quanto custa?
São vinte e cinco euros, vinte e cinco deslumbrantes euros, e se o desejarem
Autografadas?
Claro, não problema...
“Estou triste, meu amor, dizem que não vou ganhar a bicicleta...!”, e precisava tanto dela, e precisava tanto
De mim?
De ti?
Claro, não problema...


(Ficção – Não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 18 de Setembro de 2013

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

um dia

foto de: A&M ART and Photos

um dia serei eu
um dia acordará a madrugada vestida de branco
com uma pétala de rosa em cada estrela suicidada
um dia vestir-me-ei de amanhecer
como as páginas de um livro perdido na livrarias em poeira...

um dia acordarei e tu és uma pausa
como as sombras do musseque
depois da chuva se entranhar na terra ressequida
um dia
um dia ausentar-me-ei... como as bananeiras do teu sobrolho

como as sílabas dos teus lábios
e um dia saberás quem sou porque morri
partirei para a terra de ninguém
não estarás certamente à minha espera... porque tu não existes
porque tu és uma feiticeira com asas de carvão e boca de crocodilo


(n ã o r e v i s t o)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 4 de Setembro de 2013

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

As sílabas dos calendários falsificados

foto de: A&M ART and Photos

Não tenho dias de ti
em todos os horários mergulhados nas amoreiras cinzentas
não posso acreditar nas tuas tristes palavras
que alimentam a máquina dos sonhos
não
não tenho dias de ti
e em ti
as películas negras da paixão
desertaram
morreram
esgotaram-se como amêndoas de cartão
no amanhecer desconhecido,

Não
não tenho dias de ti,

Em ti
e em ti,

Não
não tenho dias em ti
e em ti,

Não tenho dias de ti
às conversas mórbidas das tardes poeirentas
há silêncios que demoram...
há em ti
momentos
desejos
circos ambulantes entre rosas e palavras sem sentido
tu
eu
perdidos dentro do mundo sem fechadura...
e sofremos
e sofremos as sílabas dos calendários falsificados.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
sexta-feira, 16 de Agosto de 2013

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Os textos loucos nas paredes de betão


Tínhamos uma árvore de papel
das palavras com sabor a prata
tínhamos uma sílaba de lata
com pingos de mel
e nas tardes em silêncio que brincávamos com o mar
tínhamos um punhado meigo de melancolia
e versos de amar
que cantávamos até nascer o dia,

Tínhamos que ainda não esqueci
a harmonia
que às vezes disfarçava-se de alegria
e outras tantas vezes inanimadas
vi
e senti
o sorriso das lindas madrugadas
que eu inventava nas planícies acorrentadas,

Às bocas submersas no cais das merendas (livro de Lídia Jorge, O cais das merendas)
e murmurávamos na língua escura da solidão
os sons do piano bar
com os poemas da paixão
antes do jantar
murchava o coração
e das mãos pegajosas os textos loucos que a luz escreve nas paredes de betão
que um louco aldrabão esqueceu na sombra de uma árvore de papel,

Tínhamos sabão
e óleo vegetal com sabor a pimenta
tínhamos o amor e os lábios pigmentados com sandes de salpicão
e mesmo assim
no jardim
tínhamos sexo dentro de uma caixa de cartão
comíamos sem sabermos que as viagens para Marte eram pingos de saliva da tua imaginação
antes de regressarmos à morte que adormece nas lamentações de uma triste sebenta.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
Alijó