segunda-feira, 6 de abril de 2015

O covarde triângulo da paixão


Podia ser rico

Ter gajas boas

Mas gosto de livros

E de gajas

Podia ter

As gajas e os livros

E ser rico

Não

Assim não

Gosto do meu cão

Mas

Não

 

Os cães são um poço de tristeza

Um morre de nada

E o outro

Velho

Em fuga no dia do seu aniversário

Podia ter uma casa

Um carro

Mas

Não

Apenas uma cabana sustentava o meu desejo

Uma gaja boa

E dispensava o carro

 

Prefiro um burrinho

Calminho

Que seja poeta

E escreva palavras na nossa vidraça

Amo-te

Amei-te

Não

Sei

O burrinho dançando no quintal das palavras

E as palavras comidas

Pela minha gaja

Não

 

Tenho

Pressa do teu sorriso

Mas vejo nos teus olhos

As searas húmidas do desejo

O poeta

Burrinho

Acariciando a tua mão

Tão querido

Eu?

O burrinho?

Não parvalhão…

Tu

 

Meu

Amor

A viagem de fim-de-semana

As casas ruidosas na penumbra madrugada

A vaidade de uma rosa

Masturbando-se nas salinas do cansaço

Troce-se

Verga-se sobre as almofadas do desenhado orgasmo

E

Aiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii…

Chove lá fora

Imagino-me vestido de poema

 

Nos lábios do burrinho

Fiel amigo

Companheiro

Podia ser rico

Ter gajas boas

Mas gosto de livros

E de gajas

Podia ter

As gajas e os livros

E ser rico

Não

Assim não…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 6 de Abril de 2015

domingo, 5 de abril de 2015

Onze horas


Onze horas

Na terra nocturna da solidão

Recordo o perfume das tuas palavras

Escondidas num subscrito

Desenhos

Os corações

Amo-te

Nunca te esquecerei…

E todos nós somos esquecidos

Quando acorda o dia

Quando se extingue a luz do sofrimento

Onze horas

 

Na terra

Nocturna

Em solidão

Voo sobre as árvores

Os pássaros

E os peixes

Da tua cidade

Os corações de luz

Sorriam

No subscrito perfumado

Parvoíces

Nocturnas

 

Entre lençóis

E pedaços de medo

A infidelidade

À janela

O Tejo mergulhado numa fina cortina de prata

Onze horas

Partem os barcos para os teus lábios

Os marinheiros

Onze horas

Embriagados nas tuas coxas

Como aranhas

Numa caixa em vidro

 

Sinto

Entre os lençóis

Os tentáculos corpos das pálpebras de linho

O amargo fim

O abraço

Em laço

A Torre de Belém

Sem ninguém

Eu

E só

Trazia-te na algibeira do Adeus

Como trazia um molho de chaves

 

Sem fechadura

A porta do teu peito

Com grades de incenso

Dormindo numa caixinha em madeira

O cheiro

Perfumado

Das tuas cartas

A Torre e a ponte

Camufladas pelas carícias do medo

A mão

Na tua mão

O poema

 

No teu poema

A rosa

Dentro do livro


Ansiosa

Que seja dia

Nesta casa

Às onze horas

Da noite

Da manhã

De ontem

De hoje…de.. de amanhã.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 5 de Abril de 2015

O triste silêncio das âncoras de prata…


Não sei a quem pertencem os teus olhos

Esboçando sombreadas canções nos meus braços

A luz incendeia a noite em despedida

Não sei a quem pertencem

Os olhos

As cidades

E os distantes lugares

Dos teus lábios

Lábios

Em chamas

Sinto as nuvens nos meus ombros

E tenho nas pálpebras

As húmidas manhãs de Primavera

Os olhos

Não sei

Como às palavras roubadas

Enquanto os pigmentos da paixão

Alicerçavam as cordas da prisão

O cais

O teu corpo fundeado em mim

Respirando as sílabas do primeiro encontro

O cruzamento

A estrada da vida congestionada

E os olhos

E as palavras

Lábios

Em chamas

Esboçando…

Clarabóias de medo

Nas frestas do silêncio

O amor

A solidão vestida de amor

Lá fora

Os olhos

Numa fotografia de família

Os pais

Os irmãos

E

E os olhos

Lá fora

Nas palavras

Sempre as palavras dos teus seios

Nas rodas dentadas do desejo

A claridade das tuas coxas

Os olhos

A boca

O sémen estampado numa tela

Branca

Negra

A noite

Vens

Desces os socalcos do prazer

Despes-te e danças para o espelho da melancolia

E o amor

Vens

Despes-te

Nos olhos

Dos olhos

O poema brincando na tua pele de madrugada

Acabada de nascer

Apagam-se as personagens dos versos

Ficam na tua roupa

Como cadáveres de espuma

Fingindo orgasmos

E Domingos num parque infantil

Brincando

Nos olhos

Os olhos

Nas palavras

E nos destinos mais escondidos da tua mão…

As cidades respiram

Meu amor?

As cidades sentem no corpo

As melódicas canções do poema

Meu amor?

O papel inanimado sobre a secretária do pensamento

Os fósforos pontapeando pedaços de lágrimas

Contra o copo de uísque

Sem nome

O corpo da cidade

Dói-lhe

Menina?

Os livros acorrentados ao teu cabelo

E as serpentes do luar

Dentro de quatro paredes

As janelas onde poisas o queixo

No meu colo

A tua cabeça de diamante

Não lapidado

O sorriso

O sorriso apaixonado de uma vogal

E da cidade

As tristes âncoras da morte

És

Meu amor…

O triste silêncio das âncoras de prata…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 5 de Abril de 2015