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sábado, 16 de setembro de 2023

Tempestade

 Das sete espadas do inferno

Recebo as cabeças dilaceradas pelo poema em veneno,

Depois, pego em todas as palavras e semeio-as na sombra desenhada pela noite,

Mausoléu do silêncio, vírgula suspensa na tarde,

Das sete espadas, recebo o primeiro beijo da madrugada,

Vestido de negro,

E pincelado de medo.

 

Do rio sonolento, as vozes do inferno, chamam-me e apelam-me…

“que o dia se transforme em noite,

E as estrelas,

Em beijos croché com pedacinhos de sonho…”

Nunca terás as chaves do céu, dizia-me ele antes das sete espadas…

Partirem em direcção ao nada,

Quando o dia se cansa da tarde,

E velozmente,

Suicida-se na mão do Magala que está sentado na Torre de Belém.

 

Das sete espadas do inferno

Recebo as cabeças dilaceradas pelo poema em veneno,

Recebo o livro, recebo a morte,

Depois,

Sento-me e olho pelas janelas do inferno…

A planície vestida de branco,

Com árvores em papel,

Depois,

Sento-me e olho pelo tecto do inferno…

As estrelas vestidas de silêncio

E o sol,

E o sol olha-me,

Puxa-me…

E abraça-me como quem abraça a tempestade.

 

 

 

16/09/2023

Francisco

domingo, 5 de abril de 2015

Onze horas


Onze horas

Na terra nocturna da solidão

Recordo o perfume das tuas palavras

Escondidas num subscrito

Desenhos

Os corações

Amo-te

Nunca te esquecerei…

E todos nós somos esquecidos

Quando acorda o dia

Quando se extingue a luz do sofrimento

Onze horas

 

Na terra

Nocturna

Em solidão

Voo sobre as árvores

Os pássaros

E os peixes

Da tua cidade

Os corações de luz

Sorriam

No subscrito perfumado

Parvoíces

Nocturnas

 

Entre lençóis

E pedaços de medo

A infidelidade

À janela

O Tejo mergulhado numa fina cortina de prata

Onze horas

Partem os barcos para os teus lábios

Os marinheiros

Onze horas

Embriagados nas tuas coxas

Como aranhas

Numa caixa em vidro

 

Sinto

Entre os lençóis

Os tentáculos corpos das pálpebras de linho

O amargo fim

O abraço

Em laço

A Torre de Belém

Sem ninguém

Eu

E só

Trazia-te na algibeira do Adeus

Como trazia um molho de chaves

 

Sem fechadura

A porta do teu peito

Com grades de incenso

Dormindo numa caixinha em madeira

O cheiro

Perfumado

Das tuas cartas

A Torre e a ponte

Camufladas pelas carícias do medo

A mão

Na tua mão

O poema

 

No teu poema

A rosa

Dentro do livro


Ansiosa

Que seja dia

Nesta casa

Às onze horas

Da noite

Da manhã

De ontem

De hoje…de.. de amanhã.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 5 de Abril de 2015

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Fugitivo nocturno


Quando as algemas do silêncio poisam no meu finíssimo pulso de fugitivo,
ando em viagem há quarenta e dois anos,
sonhei dentro de um paquete,
que hoje...
hoje apenas sucata,
voei sobre a cidade do beijo,
e...
e do Tejo,
cansei-me dos apeadeiros sem transeuntes,
desertos,
sós... como os pedintes,
só... como o desejo,

Fui vagabundo nocturno,
magala desalinhado,
obstruído nas catacumbas da solidão,
drogado de profissão...
embriagado das sanzalas de granito,
com fotografias para o obscuro corpo de uma bailarina,
quando as algemas do silêncio poisam...
e eu, e eu longínquo como os pássaros em cartão,
dormi na rua,
vagueei pela cidade à procura de nada,
apenas caminhava...
e não acreditava,

E não acreditava na ausência,
e...
e no amor eterno,
amor de “merda”
só a cidade me alimentava...
e acolhia,
apaixonei-me por cacilheiros e marinheiros invisíveis,
fui trapezista junto à Torre de Belém...
e sentava-me no pavimento cansado dos fins de tarde,
imaginava-te num caderno de desenho Cavalinho,
escrevia nas páginas adormecidas do “Doutor Jivago”...
e hoje pertenço às “Almas Mortas” do Nikolai Gogol.




Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quinta-feira, 6 de Novembro de 2014

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

A morte do teu cabelo

foto de: A&M ART and Photos

O meu cabelo absorve a cidade, vive debaixo dele a manhã dilacerante, há um perfume desconhecido que vai subindo até aos meus cabelos, encosto a cabeça ao espelho da manhã, trinco os lábios e sinto as madeixas das árvores engomadas por um velho ferro de engomar, não me sinto bem, estou estonteante, estou... em desequilíbrio, e oiço as finas gotas que o horário suspenso na parede da sala de jantar, essas... em pequenas lágrimas pergaminho, como húmus derretido sobre a terra árida das velhas mãos que serviram para alimentar o calendário nocturno
O meu cabelo morre,
E a tua boca silencia-se como se vivêssemos em permanente ditadura, como se vivêssemos... sem sairmos de casa, à varanda do silêncio, choras-me porque perdeste os cigarros, porque perdeste o emprego, porque perdeste... a vida
O meu cadáver de costas sobre a cidade, de um salto em falso... voo sobre a calçada camuflada com pequenas pedras de chocolate, alguém grita o meu nome,
O meu cabelo morre,
A minha pobre vida, aos poucos... também ela morre, como o meu loiro cabelo, como o sombreado vento, como a grade da varanda que me aprisiona e não me deixa ser livre, livre como as gaivotas de Belém, ir a bares, beber em esplanadas a vodka que sobeja dos veleiros acabados de regressar da Rússia, e
O meu cabelo morre, e a minha vida morre, e tu, e tu morres-me... porque a água salgada do mar começou a subir pelo ascensor, entrou no terceiro esquerdo, entro no terceiro direito,
Nós
E o teu cabelo quase em chamas,
E nós quase, porque habitamos o sexto frente, e daqui a pouco, a tua cabeça, encostas-a à grade enferrujada e lanças-te em
Queda livre,
O meu cabelo morrer,
Nós, nós quase engolidos pelas caravelas que a noite lança pelas ruas para nos aprisionarem, como acontece com o teu cabelo, como acontece com o teu corpo...
Ambos prisioneiros, vagabundos, quase em
Queda livre,
A cidade,
Morre,
O meu cabelo morre,
E o teu cabelo quase em chamas,
E nós quase, porque habitamos o sexto frente, e daqui a pouco, a tua cabeça, encostas-a à grade enferrujada e lanças-te em granito polido, cubos em gelo, pregos de madeira rompem os sargaços dos teus beijos, e nós, porque habitamos o sexto frente
Morre, morre o teu cabelo quando te lanças sobre os veleiros desgovernados das Clarissas abandonadas, ouvi-o, ouvi-lhe os cabelos agarrarem-se à velhíssima grade e voavas, e dançavas, e
E o teu cabelo quase em chamas,
E os meus braços enrolados no teu pescoço, a cidade, a cidade com o teu corpo como húmus, sobre a terra ressequida, feia, dilacerante...
E morre,
E desce... até encontrar a lápide cinzenta onde está escrito o seu nome,
A criança rodopia,
E a vida, a vida também morre, e a vida espera por um digno salto, e ela
Ela morre,
O meu cabelo morre, o meu cabelo... em flor, sobre as árvores dos teus seios, transparentes, como as velas do veleiro estacionado junto à Torre de Belém,
E ela?
Ela... ela morre, morre, até encontrar a lápide cinzenta onde está escrito o seu nome,
A criança rodopia.

(não revisto – Ficção)
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
quarta-feira, 21 de Agosto de 2013