quarta-feira, 18 de junho de 2014

Dizem... dizem que este som... que este som me enlouquece


Este som enlouquece-me,
transforma-me em pássaro, transforma-me em vogal solitária,
este som que eu amo, é uma constante com vida,
é uma sebenta ordinária,
na noite perdida,
este som me ama, como mais ninguém me consegue amar,
Ai este som...! Este som pincelado de mar,
amargurado nas réplicas ondas sísmicas dos teus lábios,
este som me alimenta,
e é escrita envergonhada,
som, som que vem a mim através da madrugada,
é suor, é pedra de calçada,

(Bombino me encanta)

Este som mergulhado na neblina,
vestido de negro, vestido de andorinha,
e voa sobre os telhados loucos da tua boca,
este som..., este som me ama, este som é coisa pouca,

(dizem que sou sisudo e nunca sorri)

Este som enlouquece-me,
este som vive dentro de mim,
não é árvore, não é jardim...
aquele jardim onde tínhamos beijos e carícias como se fôssemos duas gaivotas apaixonadas,
este som habita nas palavras,
é poema, é cansaço... é amor,
este som é a tua eterna flor,
sem braços, sem... sem montanhas de algodão,
este som, este som é o teu corpo com comportamento de fluido,
é hidráulica, é equação...
este som,
este som é o desejo sem desejo, é um projecto em construção,

(dizem... dizem que este som... que este som me enlouquece).


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Quarta-feira, 18 de Junho de 2014

terça-feira, 17 de junho de 2014

Os sarcófagos semáforos de aço


A terra fértil arrebata-se nos meus ossos de vidro,
sou forçado a fugir deste esconderijo de granito, e vadio,
tratam-me como um esqueleto de adorno, à mercê dos olhares felinos da montanha escuridão,
à noite, poucas vezes, desce a mim o silêncio frio,
encurralado num velho muro em xisto laminado,
a terra... cobre-me,
ninguém me apanha, pensava eu, quando ainda havia estrelas no teu olhar...
mas... puro engano, o amor não se esconde, o amor liberta-se das profundas águas que tens nos teus lábios, um deserto utópico, infinito...
e cansado de viver nas imagens a preto-e-branco,
haverá vida nas tuas mãos?
E à terra o que pertence à terra,
os teus cíclicos beijos de amanhecer doentio, invisíveis... travestidos de cidade iluminada,

(às vezes, poucas, acredito que és a madrugada)

Um holofote de néon poisa nos teus seios de menina mimada,
pareces distante, enferma, pareces... as flores depois de lapidadas,
como os diamantes que escondem as tuas lágrimas...

(o papel-químico transforma-se em almoço, lanche e jantar...)

E vives,
e sonhas...
E... e morres nas almofadas da tempestade,

A terra fértil arrebata-se nos meus ossos de vidro,
dizem que sou o mendigo rico, dizem que sou o cadáver apetecido pelos bichos dos sarcófagos semáforos de aço,
(E vives,
e sonhas...
E... e morres nas almofadas da tempestade)
não existem palavras, frases, sons, em ti, em mim... no próximo luar,
e não existe um ontem que eu te possa recordar...
ninguém à minha espera quando regresso das tuas coxas,
solitário, amargurado... perdido... grito; FODA-SE O VERBO AMAR!



Francisco Luís Fontinha – Alijó
Terça-feira, 17 de Junho de 2014

Texto de Francisco Luís Fontinha – Divulga Escritor

Texto de Francisco Luís Fontinha – Divulga Escritor

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Lanternas cinzentas


Há silêncios que lutam enquanto dormes, e sonhas,
há mãos que se cruzam, mãos que rezam...
há silêncios que tu não entendes,
palavras escritas na escuridão,
há silêncios que labutam, que gritam... que morrem...

Há cabelos que se despedem do amanhecer,
cabelos brancos, cabelos frágeis, e mãos que rezam,
há silêncios que não te esquecem,
que nunca te ignoram,
cabelos loucos, cabelos que namoram,

Há...
talvez...
um poemário à tua espera,

Há silêncios dentro do teu armário,
e crucifixos embrulhados em cinzentas pálpebras,
há as tuas palavras,
que acredito, não acredito...

Mas que tento acreditar!
Há luzes que brilham, luzes que são engolidas por embarcações enjoadas,
lágrimas, e tristes madrugadas,
poesia, poesia... nos teus cabelos suicidados...
há silêncios...

E... e adormecidos soldados.


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Segunda-feira, 16 de Junho de 2014

domingo, 15 de junho de 2014

O vazio

foto de: Stéphane Spatafora Photographe

O vazio,
e falsas esperanças mergulhadas no buraco da solidão,
o vazio que se traveste de dor, o silêncio que embrulha o sofrimento,
este rio que são as tuas mãos, perdidas no musseque anónimo da paixão,
as crianças saltam até agarrarem as flores que habitam o tecto da noite,
vazio, sisudo... sentido proibido de amar,
o vazio imprevisto, descontínuo... o vazio agreste dos olhos da estátua de granito,
há sombras que embriagam os teus seios de porcelana e eles, eles a construir sorrisos desde...

(desde o último luar)

O amor,
também ele, vazio,
pobre,
ângulo obtuso quando alimentado pelo púbis da madrugada,

(hoje não corações, hoje não beijos – a esplanada recheada de vampiros)

O vazio,
homem rude, homem dos sete ofícios, o homem mendigo que descobriu a falsa esperança,
o fantasma,
o vazio dos telhados que a cidade ignora, despreza, que a cidade... não quer,

Que cidade é esta?

Vazia,
sem pessoas, sem imagens, sem..., sem nuvens,
o sombreiro carnívoro que devora todas as palavras que a tua pele transpira,
gotículas de poesia descendo o teu corpo, até que a falsa esperança ilumina o teu cabelo,
e sei que deixou de viver,
hoje... nada, a cidade provocadora, a cidade dos teus suspiros,
uma porta que se encerra, e morre, e levita,
a lanterna do Adeus, sempre acesa, sempre pronta a suicidar-te com os beijos de alvenaria cansada,

(hoje, hoje não)

Que cidade é esta?

(desde o último luar)

Que deixei de amar a espuma dos espelhos de amanhecer,
e sem o perceber,
descobri que a falsa esperança... que deixei de amar, não existe mais,
o vazio, o vazio corpo da sílaba encarnada...


Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 15 de Junho de 2014