domingo, 3 de março de 2013

As paixões de areia

E sonhas com quê, tu?
Visivelmente cansada, sentia dentro de mim, as pedras e os riachos, e ouvia canções poéticas dos lábios sonolentos dos pássaros amaldiçoados, tristes às vezes, alegres poucas, doía-me o peito e trazia qualquer coisa estranha na respiração ofegante dos meus silêncios, acordava as rosas e os pontos cardeais, pegava no Norte e caminhava até que o tempo se perdia em mim, entranhava-se-me como se entranhou a tua boca
(E não sonhava, mas via uma menina vestida de mar com cabelos de vento, mas via um jardim com um banco de madeira, e imaginava, olhava-te dentro de mim e sabia que te sentavas lá, em todas as minhas ausências, loucuras, birras de criança, de menina mimada, sabia-o, sentia-o, ouviam-se-lhes as masmorras apaixonadas e que o tempo come como se de uma simples sandes de presunto se tratasse, ouvia o chamamento do sol e das nuvens embebidas na vodka made em Sacavém, e comias-me como comias os cigarros e os versos desgovernados das mãos do velho com braços de maré, e depois, uma chuva finíssima de vodka sobre os telhados cinzentos da cidade de marfim),
No meu púbis,
E sonhava com círios de desejo quando se disfarçavam de Primavera, e sonhava com gaivotas enroladas nas velas entre mastros de veleiros e o fim de tarde, despedíamos-nos das descalças horas insignificantes, oferecias-me um beijo na face obscura da minha pele, e
E eu desaparecia entre a neblina de espuma que as aranhas deixavam ficar junto ao rodapé, o pavimento pintava-mo-lo de encarnado, como os vestidos da tia Margarida sobre o palco da danceteria libertina, anárquica, como todas as flores que conhecemos, havia sempre um perfume de solidão nas tuas mãos, havia qualquer coisa de estranha nas tuas mãos, meu querido
No teu púbis mergulhavam os poemas das madrugadas convulsas e engasgadas nas lâmpadas da danceteria e ouviam-se-lhes, às mesas de cartão, os suspiros embriagados das meninas em flor, descia o rio, e mergulhávamos na lareira dos pedacinhos de sílabas com pequenas asas de açúcar, e meu querido, meu querido poeta vadio, um dia transformado de noite
Desapareceste como desaparecem todas as paixões,
(pelo buraco da fechadura)
E ninguém percebeu que eu, vestida de doce Catarina, docemente iluminada pela claridade das palavras revoltosas, contra ele, no caderno dele, da sebenta dele, eu construí a cidade dos sonhos com todos os pedacinhos de desejo que adormeceram em todos os bancos de jardim, com ripas alguns, de cimento outros, e assim nasceram os peixes e as algas e a trovoada, e a chuva, e a madrugada, e também, eu
Criei a saudade,
E a dor,
E sonhas com quê, tu? Não sonho, diz-me tu, também não sonho, também deixei de sonhar, também eu tal como tu, desistir de rir, da saudade, e do prazer de escrever, e principalmente
Deixei de me sentar no banco de jardim com ripas de madeira, puxar de um cigarro e imaginar-te deitada sobre os lençóis da minha pele esbranquiçada, polida, magra, emagrecida pela dor e pela doçura das noites envenenadas com cianeto e sonhos de anda,
E a dor, e criei a saudade
(pelo buraco da fechadura)
E agora desculpa-me, mas vou vestir as asas e voar, se voltarei? Não sei, não... sei, E sonhas com quê, tu?

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

sábado, 2 de março de 2013

Palavras de sofrer


Poucas palavras despedaçadas que o vento alimentava
tantas linhas transversais encalhadas entre pontes
em ti mergulhadas
tantos barcos afundados
nos mares sofrendo as grandezas do Oceano
tantos e tantos corações aflitos e amargurados
e tantas e tantas mãos amarradas
e sem palavras

Tantos portos de embarque cobertos por um pano
e tantos e tantas pedras perdias nos montes
como os versos sem nome
com fome
uma pobre criança que chorava
corria entre veredas e janelas
como as tuas lágrimas de giz
voando e voando sobre as flores belas

Tantos e tantos voos de perdiz
saltitando dos alicerces nas montanhas ribeira
tantos meus Deus tantos orgasmos de uma só videira
derramando o líquido pelos socalcos do prazer
tantos e tantos versos com amor
e de tantas coisas para dizer
nem dinheiro tenho para uma flor
e escrever

(Deixei de o fazer
deixei de o amar como deixei de dormir e como deixarei de sonhar
tantas tantos e tantas pedras para atirar
contra o poder)

Tantos versos para escrever e chorar
porque tenho noites de sofrer
e dias e dias e dias... sem o saber
que as pontes mergulham nos rios apaixonados
e os mares morrem como os cães acorrentados
às palavras que a tua boca dissimilam e desistem de brincar
na corda bamba ou sobre o tédio de amar
ou debaixo de um barco a apitar.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

Sábado de Março

Enquanto ouvir os pássaros, percebo que estou vivo, sentindo os barcos em círculos no rio dos sonhos, sim, percebo que estou a sonhar, e enquanto olho, uma cidade em voos silenciosos debaixo das pontes que ligam o amor e a paixão, sim, percebo que estou “fodido”, porque a paixão mata, mói, corrompe as mandíbulas das asas de papel, e oiço-as, a elas, e percebo, porque oiço os malditos pássaros, que estou vivo, sou um espelho insignificante, com luzes e brilhantina na cabeça, um palhaço de circo ambulante, um zumbi com cabelos soltos e mergulhados nas espinhas do amanhecer, e sim, que percebo, a paixão emagrece o céu, alimenta-se dos corpos em desejo, e depois, depois de mastigar os ossos e a carne, foge, e esconde-se no monte mais secreto do abismo; e começo a não ouvir os pássaros, e percebo que os barcos em círculos no rio dos sonhos, sim, percebo que a paixão mata, como matam as balas da solidão, quando embatem contra o peito da paixão...
Para que servem os meus poemas se as tua mãos de papiro ardem no silêncio da noite recheada por uma longínqua, fria, inteligente, capaz de absorver-te como as tuas algas que utilizavas nas tuas débeis pesquisas, acabavas de te apaixonar pelo mar, e já trazias os rios num dos bolsos do teu bibe, e dançavas, quando o vento soprava do Sul, uma bandeira flutuava, dizia-se livre, liberta-me
E tu
Que fizeste concretamente?
Deixaste-me acorrentado a um cais mórbido, ensanguentado por palavras que ninguém percebia, porque era a nossa linguagem, eram as nossas palavras, como o fumo
E
E tu
Lembravas-me o vento quando eu sobrevoava as tendas de lona das casas sem literatura, e que fizeste concretamente? Nada,
Nada,
Como sempre, eu, tu, dois veleiros num cais de cimento com luzinhas que ao longe se transformavam em pontinhos, em círculos, em
Em
E tu
Que fizeste concretamente?
Enquanto ouvir os pássaros, percebo que estou vivo, sentindo os barcos em círculos no rio dos sonhos, sim, percebo que estou a sonhar, e enquanto olho, uma cidade em voos silenciosos debaixo das pontes que ligam o amor e a paixão, sim, percebo que estou “fodido”, porque a paixão mata, mói, corrompe as mandíbulas das asas de papel, e oiço-as, a elas, e percebo, porque oiço os malditos pássaros, que estou vivo, que precisamos de gritar, amar, morrer, que enquanto ouvirmos os pássaros, percebemos que estamos vivos, sentindo os barcos em círculos no rio dos sonhos, sim, percebemos que estamos a sonhar, e enquanto olhemos, uma cidade em voos silenciosos debaixo das pontes que ligam o amor e a paixão, sim, percebemos que estamos “fodidos”, porque
A paixão matou-nos, porque o amor, também ele, numa noite de inverno, assassinou-nos, e ficamos sós, abraçados, como duas gotas de água suspensas num arame de vidro..., e no entanto
Em
E tu
Que fizeste concretamente?
As tuas tristes algas sobreviveram à tempestade de areia, talvez, hoje, Sábado de Março, vivam dentro de uma parede de xisto, com janelas para o rio Douro, talvez, hoje, Sábado de Março, as tuas tristes algas, algumas, não todas, mortas, como nós, como eles, e todas as palavras que escrevemos sentados num triste banco de jardim com ripas de madeira e mãos de alecrim, o cheiro, sentíamos o cheiro das palavras que deixamos morrer, e matamos
As palavras;
(amor, amo-te, paixão, desejo, beijos, carícia, abraço)
E tantas outras que matamos, como matamos os pássaros,
Enquanto ouvir os pássaros, percebo que estou vivo, e como não os oiço, percebo, entendo, pressinto
Que morri,
Ou
Que as tuas tristes algas... mentiam-nos, quando acordávamos pela manhã e depois de abrirmos a janela, ao longe, ao longe uma ponte de aço acenava-nos, ao longe, uma ponte de aço gritava-nos
Amava-vos, mas deixei de olhar o sol e o mar transformou-se na face de um cubo pintada de azul, e quase sempre estávamos de olhos vendados, como todas as rochas dos rios com algas mentirosas...
(Lembravas-me o vento quando eu sobrevoava as tendas de lona das casas sem literatura, e que fizeste concretamente? Nada,
Nada,
Como sempre, eu, tu, dois veleiros num cais de cimento com luzinhas que ao longe se transformavam em pontinhos, em círculos, em
Em
E tu
Que fizeste concretamente?)
E nunca mais tivemos sossego como o homem com cabeça de palha.

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

P.S.
Tinhas nos seios as sílabas que construíam as palavras mais belas do planalto onde habitávamos e nos escondíamos, tinhas no peito uma janela onde vivia um coração, e dessa janela, víamos os triângulos de areia que Deus deixava sobre as plantas carnívoras que brincavam no nosso quintal de cartolina e lápis de cor, e mesmo assim, que tudo tínhamos, deixamos morrer as palavras mais importantes de nós; E hoje, Sábado de Março, apenas comunicamos através de números e equações matemáticas complexas, feias e distantes...

sexta-feira, 1 de março de 2013

E quando terminarem os meus braços?

Liberta-me, desamarra-me deste sufocado porto de embarque, desembarque, ancoragem, liberta-me das árvores doentes e cansadas e das rochas amarguradas, por favor
Oiço-os dentro dos pedaços de luz,
Por favor, ouve-me, assombra-me como assombras-te-me quando torrencialmente desceram as lágrimas do sono, deitávamos-nos sobre a pelugem escura das amendoeiras em flor, acordavas-me depois de mergulharmos nas tempestuosas buracos de areia
Gigi dorme, observa-me de cima de uma simples tábua de madeira, flutua, voa entre paredes e taludes desgovernados, um barco, ele chora, e depois
Buracos de areia com pocinhas de água, límpida, outra
Salgada
E às vezes,
Delicio-me com as paredes finas das gotas de orvalho do vidro facial que as mascaras de madeira transpiram quando o mar avança terra adentro, e oiço-os dentro dos pedaços de luz, frios, longínquos, sem estrada, vila, casas, telhados de colmo, e oiço-os como ouvia na Primavera o rosnar das caravelas à deriva sobre a mesa de um bar, sem nome entre outros, com nome abraçado a outras, pedia laranjas e traziam-nos garrafas de cerveja, copos invisíveis embebidos em vodka, as velas e os mastros, cá fora, esperavam-nos
Sós, embriagadamente
Como as estátuas de pedras dos jardins desenhados no muro da escola, e infelizmente
Ela chorava como choram as cobras antes de morrerem,
Entre nós um losango em betão com armadura de ferro de vinte milímetros, e com uma janela circular, como elas
Depois saíamos do bar e vestíamos os mastros e as velas, e começávamos a navegar calçada abaixo até desejarmos não encontrar o vulto humano do homem de gabardine que todas as noites se passeava em redor de árvores e candeeiros de cartolina
Desviavas-te dele e do cão dele,
Embriagadamente sós, entrava a noite pela porta das traseiras, uma rapariga com tranças estava mergulhada no croché, um maço de linha escoria-lhe pelos cantos da boca, e no pavimento, junto aos pés descalços, nascia ela
Uma enorme colcha de renda e pacientemente sós, embriagadamente sós, como as aranhas que debaixo do xisto (Por favor, ouve-me, assombra-me como assombras-te-me quando torrencialmente desceram as lágrimas do sono, deitávamos-nos sobre a pelugem escura das amendoeiras em flor, acordavas-me depois de mergulharmos nas tempestuosas buracos de areia), uma conversa de poucas palavras, a colcha cresce, alimenta-se dela, e come-a como comeu todas as estrelas o mar na madrugada da tua partida, em
Desviavas-te dos grãos de areia, deitavas-te nos meus braços de papel onde hoje passo as noites a escrever, pergunto-te
E depois? E quando terminarem os meus braços?
E pergunto-me
(Gigi dorme, observa-me de cima de uma simples tábua de madeira, flutua, voa entre paredes e taludes desgovernados, um barco, ele chora, e depois)
E quando ela acordar? Abrir os olhos e olhar-me pela primeira vez? Que dirá? Escreverá algo sobre mim, como eu escrevo dela nela,
E às vezes
Poucas,
… Delicio-me com as paredes finas das gotas de orvalho do vidro facial que as mascaras de madeira transpiram quando o mar avança terra adentro, e oiço-os dentro dos pedaços de luz, frios, longínquos, sem estrada, vila, casas, telhados de colmo, e oiço-os como ouvia na Primavera o rosnar das caravelas à deriva sobre a mesa de um bar, sem nome entre outros, com nome abraçado a outras, pedia laranjas e traziam-nos garrafas de cerveja, copos invisíveis embebidos em vodka, as velas e os mastros, cá fora, esperavam-nos...
Depois derrubaste os muros pintados de branco, tiraste todos os bancos de madeira, escondeste as árvores acabadas de regressar, e deixaste-me sobre pequenas pedras, pontiagudas, deitado, sombriamente como as algas depois da tempestade, deitado e apaixonado pela trigonometria e coisas para ti, insignificantes,
Desenhavas-me como palavras eu sobre ervas condenadas,
E para ti, eu
Um enorme rochedo com asas de coloridas pétalas de ardósia, e tu
Uma casa disfarçada de abraço,
E quando regressava-mos
E quando não regressava-mos
Tínhamos todas as luzes só nossas, e todas as claridades do universo, e quando não sabíamos o que fazer depois do jantar, inventávamos literatura com migalhas de pão,
(E para ti, eu
Um enorme rochedo com asas de coloridas pétalas de ardósia, e tu
Uma casa disfarçada de abraço,
E quando regressava-mos
E quando não regressava-mos)
Dentro do mar.

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

P.S.
Hoje apetecia-me decorar-me com morangos e pequenas cerejas sobre a minha cabeça de arame, de mim, tu, confecionares um bolo de aniversário, e apesar de ninguém conhecido fazer anos, apetecia-me ser um bolo, recheado, só, ou acompanhado, um bolo de chocolate com quatro pisos e uma cave, janelas com vidros de açúcar, e claro, muitas velas, com números, círculos, triângilos, quadrados, linhas rectas, não rectas e simplesmente, linhas, sem nome, desertas, abruptas, cinzentas ou
Linhas;
E ainda nem te perguntei se tu, sim tu, aí
Sabes confecionar bolos?

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Teresa (sem nome, idade ou sexo)

Supostamente, nada o fazia prever, e no entanto, misteriosamente, aconteceu, como uma mácula cinzenta de penumbra debaixo de um céu reconstruído de resíduos esféricos que sobraram das brincadeiras infantis em frente à velha escola, quatro paredes, telhado em zinco, e casa de banho completa com cerca de um hectare bordada a capim húmido e algumas pedras cansadas de sobreviverem à escuridão das noites quando os cortinados se enrolam no pescoço esguio do teu vestido encarnado, adoras o vermelho, o sangue, a gravida quando deixa de ser aproximadamente nove vírgula oito metro por segundo quadrado, e talvez por desorientação, é de doze vírgula cinco metro por segundo quadrado,
(acreditei que o seno ao quadrado de alfa mais o co-seno ao quadrado de alfa o resultado é um, incrível, como se a tangente de trinta graus não fosse raiz de três sobre dois),
Dir-me-ás que o triângulo isósceles do segundo esquerdo é loucamente apaixonado pelo triângulo equilátero do rés-do-chão frente, e que são felizes, diria até
Muito,
E tal como o triângulo rectângulo do quinto direito ama loucamente o triângulo isósceles do quatro esquerdo, a hipotenusa ao quadrado é igual à soma dos quadrados dos catetos, e também eles, apaixonados pelo perímetro do círculo com o raio igual à paixão, e se
A paixão ao quadrado é igual ao amor, logo
Qual será a raiz quadrada da paixão?
Não sei nada dessas coisas, tal como nunca percebi o silêncio dos nossos vizinhos que se amam loucamente e têm medo de o assumir, palhaços e palhaços, dentro de um circo denominado tesouro absorto das palavras proíbas, custava-lhes dizerem ou escreverem ou simplesmente no átrio da escola com um ripa de madeira, desenharem na terra húmida
Amo-te Teresa,
(o autor deste texto não ama e tão pouco conhece fisicamente uma Teresa, e é apaixonado por triângulos rectângulos e círculos de luz)
Amo-te Teresa, e enquanto ele escrevia na parede lateral esquerda do átrio da Igreja Matriz, não sendo ela, a matriz, nem quadrada, nem diagonal, nem outra coisa alguma
(apenas o devaneio de um louco que julga ter piada com as porcarias que escreve)
Apareceram treze linda flores de nome Teresa,
Nunca acreditei que no jardim do amor existissem tantas e lindas
Figuras geométricas,
Complexas coxas, finíssimas fronteiras de carne e osso, da pele, escurecida como a água depois de cair a noite sobre o mar, libertava-se um distinto livro de poemas com pétalas vestidas de cubos e hipercubos
(E se eu em vez de amar uma Teresa amasse um hipercubo?)
Com madeixas triangulares, e percebi que ele resolvia as equações do terceiro grau como se elas fossem simples flores, pertences ao jardim do amor, e mesmo assim, elas, elas acreditavam que
(Supostamente, nada o fazia prever, e no entanto, misteriosamente, aconteceu, como uma mácula cinzenta de penumbra debaixo de um céu reconstruído de resíduos esféricos que sobraram das brincadeiras infantis em frente à velha escola, quatro paredes, telhado em zinco, e casa de banho completa com cerca de um hectare bordada a capim húmido e algumas pedras cansadas de sobreviverem à escuridão das noites quando os cortinados se enrolam no pescoço esguio do teu vestido encarnado, adoras o vermelho, o sangue, a gravida quando deixa de ser aproximadamente nove vírgula oito metro por segundo quadrado, e talvez por desorientação, é de doze vírgula cinco metro por segundo quadrado,)
Quando se cai nos braços de uma Teresa qualquer; Cravo, Rosa, Crisântemo ou outra qualquer figura geométrica.

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

A montanha dos sonhos

Uma rua fina e escura levar-me-á até ti, acredito eu, depois a manhã clareá e iluminar-se-á de gotinhas de orvalho, bolas de fogo e réstias de plantas carnívoras como antes de chegarem as palavras do livro destinado ao empobrecimento da floresta, por cada árvore uma andorinha, uma andorinha dorme ao som dos enclaves solstícios que da parede em gesso da sala de jantar sorriem, como sorriam, antes de partires, as poucas lâmpadas que sobraram do naufrágio nosso querido corredor de arreia, foi-se a maré sabática como os perfumes das outras rosas, as falsas, de papel, e depois
Embalsamadas e exportadas para dentro do teu peito,
É isto o amor cansado nas tardes de Inverno, de uma lareira vêem-se os olhos teus comestíveis como os grãos de pólen dos doces lábios da poesia, e se eu te pedisse
Escrevias-me um poema?
Não, claro que não, nunca, nunca escrevi poemas, nem palavras, nada, rigorosamente
Nada,
Muitas
Nada debaixo da tua saia de chita com borboletas azuis,
Muitas outras e algumas são mulheres, entre pilares de sémen e vigas encastradas nos púbis dilacerados das noites vagabundas, descobri, e talvez já o soubesse, que a nossa lareira apaixonou-se pelas chamas incandescentes dos pedaços de oliveira que iluminam as nossas, e sabíamos
Nada,
Que iluminam as nossas mãos quando os pedestais dos arbustos complexos e outras vezes, maldosos nos pensamentos, uma rua fina e escura, levar-me-á até às encostas latejantes do xisto metafisico, só, completamente só, como as tuas pernas antes de eu as acariciar invisivelmente dentro das sombras do néon com sabor a morango, e lá fora
Gemes,
Gritas como os fios de arame que suspendem a velha videira do extinto orgasmo literário,
Sou assim, dizes-me enquanto te dispo no silêncio dos poemas de AL Berto, e detesta-lo, como eu odeio os pinheiros ranhosos dos montes vadios, como as pedras, o sol que mergulhará nos seixos onde poisam os teus seios de espuma, e acredita
Nada,
Me excita como as luzes submersas de uma tenda de circo,
Nada,
Como procurar-te nos cubos de gelo estacionados ao fundo da rua fina e escura, como os lençóis com que te cobres nos infinitos sótãos de chuva, odeio-te escrevias-me nos braços também eles finos, e tal como a rua, escuros, sombrios, distantes, adormecidos, mortos, malvados ruídos das ranhuras que as livrarias provocam nas ocas cabeças de gesso onde está suspenso um crucifixo de madeira banhado a oiro, e sorris-me pela vigésima vez, como a primeira, fotocópias e fotocópias e fotocópias, eu
Tento parar os ruidosos sussurros das Madames em Flor, e não admira que o autoclismo tenha deixado de funcionar, o autocarro engasgou-se num buraco rendado no pavimento atropelado pelas rimas dos versos quando lá dentro, da casa voadora, uma laranja sobrevoa as teias de aranha dos aclamados uivos que os vidros e os cortinados desenham na cidade do lixo, e dançavas embrulhada nos braços de aço do comboio enferrujado entre sílabas clandestinas, de rio em rio, pela primeira vez sorrias-me dançando sobre nós uma penumbra acetinada de papeis diversificados, nas cores, nos sexos, nas bocas antes de entrarem nelas as grandessíssimas aldrabices do cigano com estabelecimento comercial num dos arruamentos transversais da rua fina e escura,
E nada,
Muitas
Nada debaixo da tua saia de chita com borboletas azuis, e ouvíamos o mar nas distantes laranjeiras dos montes solidificados pela bruma, pela espuma, pela
Nada em ti que me sirva, a não ser, os malditos telhados com estrelas cinzentas que os cigarros multiplicavam na ardósia pendurada na mangueira abandonada, lá fora, no velho quintal da casa em ruínas, só, só como eu
Como tu,
Sentados sobre esqueletos de livros, e saliva dissipada pelas tristes palavras de ontem, só como eu, como tu, sem sabermos como explicar aos transeuntes da rua fina e escura, que o amor, entre nós, sempre
Muitas,
Existiu como existem as noites de chuva, de frio, neve, e calor chamado prazer, ou
Húmidas estátuas de arame,
Na tua cama acorrentada aos grandes blocos de granito da montanha dos sonhos...
Pela tua fina mão em anéis de prata.

(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha

2 anos de blogue Cachimbo de Água






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terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Cabelos de vento

Não saberia esquecer-te se eu pudesse recordar-te, saciar-me com a tua boca quando nada alimenta as manhãs de Inverno, eu, invento o tempo, o dia, desenhando a noite no teu corpo ensonado, procuro-me misturando a insónia com os delírios das palavras incandescentes, húmidas quando derretidas nas planas pistas de veludo onde dormes eternamente, e esperas-me, e escreves-me livremente nas paredes da solidão liquefeita, e uma asa de papel vai esconder-se dentro de uma nuvem de prazer,
(começo a não perceber o que escrevi apressadamente num pedaço de papel sobre os joelhos),
Esqueço o orgulho, escondo a tristeza, pego no telemóvel e marco o teu número, uma voz de chocolate diz-me que...
O número que marcou não se encontra atribuído,
E eu, começo, a cada milímetro que me aproximo do rio, a acreditar, a acreditar que afinal
Nunca exististe, tal como eu, que pertenço aos assombrados murmúrios das distantes letras de sabão, inventaste-me louco para te distanciares de mim, inventaste-me a miserabilidade pela mesma razão da loucura, e depois queres fazer-me acreditar
Que a lua é quadrada, que as pedras são as lágrimas das estrelas, e que o mar, e que o mar vive num buraco com grandessíssimas hélices de vidro, como o amor, clandestino, debaixo de uma árvore, ao lado da árvore vive uma casa, dentro da casa uma mulher com cabelos de vento, e dentro dos cabelos de vento
(começo a não perceber o que escrevi apressadamente num pedaço de papel sobre os joelhos), o número que marcou não se encontra atribuído, e depois querem fazer-me acreditar que a noite é negra, que as cidades têm ruas sem saída, e que nas calçadas habitam pedaços de cartão onde se embrulham homens, mulheres, crianças
Pode lá ser possível,
E dentro dos cabelos de vento uma gaivota com lágrimas de Primavera traz-nos livros que o cacilheiro náufrago derramou sobre o Tejo, poemas, frases, palavras sem nexo como as árvores do quintal de Carvalhais, coisas, poucas, algumas, o sangue derramado na secretária imaginária que a mulher com cabelos de vento
Dentro da casa, uma cadeira, duas mesas de madeira, dois tristes corações com lâmpadas de halogéneo, do electrocardiograma nada a salientar, normalíssimo, o RX pulmonar apenas algumas sombras, provavelmente devido ao dia com alguma nebulosidade, como as janelas quando vêm as marés de azoto e roubam do parapeito os discretos vasos de cerâmica, (Nunca exististe, tal como eu, que pertenço aos assombrados murmúrios das distantes letras de sabão, inventaste-me louco para te distanciares de mim, inventaste-me a miserabilidade pela mesma razão da loucura), e hoje apetecia-me um Sábado louco sobre a mesa de uma cave no interior de uma ruela escura, suja e imunda, como os navios regressados de ontem,
Perdi-me nas clareiras tuas faces pontiagudas, e dos alicerces teus lábios, uma corrente de aço não me deixa aproximar, e quando me perguntam o que tenho a declarar, respondo
Nada, Excelência, apenas que se faça justiça,
E assim foi,
(Não saberia esquecer-te se eu pudesse recordar-te, saciar-me com a tua boca quando nada alimenta as manhãs de Inverno, eu, invento o tempo, o dia, desenhando a noite no teu corpo ensonado, procuro-me misturando a insónia com os delírios das palavras incandescentes, húmidas quando derretidas nas planas pistas de veludo onde dormes eternamente, e esperas-me, e escreves-me livremente nas paredes da solidão liquefeita, e uma asa de papel vai esconder-se dentro de uma nuvem de prazer),
Qual será a raiz quadrada do AMOR?

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(Sapo Angola)

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Os nossos delírios anseios

Das raízes dos teus olhos, há o vento campestre, triste, e ausente, há as campânulas de silêncio embainhadas nos sabres lentos da insónia, há, havia ontem palavras por escrever, escritas depois da montanha em sonolência começar a descer, a descer, a descer como descem os corpos embalsamados que poisam nos jardins sem secretismos lábios em beijos, ou
Os nossos delírios anseios,
Os bolos de chocolate sobre a mesa na sala, deixamos de ter iluminação artificial, por opção própria, a mesa espera pacientemente pelo regresso dos convidados ossos com chapéus de pólen, uma criança, a filha da Alice, insignificante sorriso com espinhas e restos de morango, ela dança, ela está alegre, e porquê?
Apenas
Talvez
Ainda não percebi se o faz por ser louca, indesejada, ou, ou porque amanhã vai receber das mãos do tio Augusto um livro de COLETTE “GIGI”, está lindíssima a mulher da capa a olhar para as janelas? Da cidade em desalinho, a elegância das palavras, dos sons, dos automóveis camuflados de ervas daninhas,
(não sei se conseguirei sorrir depois de ler o jornal)
Uma tristeza em desenhos alicerça-se no meu peito, uma mulher com cabelo preto e lábios elegantes, lança-me um corda com inúmeros nós, muitos, infinitos, como os anzóis que o rio come e depois acordam debaixo das pedras pintadas de fresco
“CUIDADO – PINTADO DE FRESCO”
Distraidamente, sempre eu distraidamente, sento-me no alegre banco de jardim acabo de nascer, as ripas de madeira como se existisse entre eu e elas um pedaço papel-químico, transportam-se para as minhas agastadas calças de ganga, velhíssimas, e robustas, como os petroleiros que atravessam o Tejo e depois acabam por se esconder num qualquer bar de uma ruela inconsciente da Lisboa perdida numa simplificada folha de papel, queixavas-te dos sons nocturnos das asas em voos rasantes das gaivotas embrulhadas em fome, sede, e falta de dinheiro,
Ouviam-se os sucessivos suicídios dos cigarros de enrolar contra os rochedos,
Como as árvores quando desistem de viver,
“CUIDADO – PINTADO DE FRESCO”, (NÃO SEI SE CONSEGUIREI SORRIR DEPOIS DE LER O JORNAL), e ela acredita na ressurreição,
GIGI olha-nos, GIGI grita-nos, GIGI deita a cabeça no teu colo construído de verdes e iluminados pensamentos como uma candeia a petróleo que encontramos dentro da parede da cozinha, quando, alguns meses antes da nossa partida, no interior da espessa parede de xisto ela esperava pelo teu sorriso, e pergunto-me
Porque todos e todos necessitam do teu sorriso apenas meu? (saberá uma rosa o que é o amor e o quanto ele é fodido?), e
E,
(Das raízes dos teus olhos, há o vento campestre, triste, e ausente, há as campânulas de silêncio embainhadas nos sabres lentos da insónia, há, havia ontem palavras por escrever, escritas depois da montanha em sonolência começar a descer, a descer, a descer como descem os corpos embalsamados que poisam nos jardins sem secretismos lábios em beijos, ou), ou GIGI transformar-se-á em estrela de luz com olhos de papel de muitas cores, ou, eu, com mandíbulas de aço inoxidável roubo a lua
Ofereço-te-a,
Ou
E,
Peço aos trapezistas das noites ausente de ti, e procuro-me dentro do teu corpo liquefeito, que a fórmula da paixão escreve-se nos muros finos e altos entre os edifícios da cidade velha, há ruas com reumatismo e ensonadas com pingos de asma, há ruas com dores diversas nos diversos ossos em diversas noites, de diversos dias, quando as semanas se escoam como líquidos termodinâmicamente estáveis, e sinceros na esbelteza das asas de cartolina de uma mulher escondida numa das ruas anteriormente descritas, como as ratazanas, e há ruas como há pássaros, há crianças como há cadáveres, na minha nossa velha cidade com telhado de areia,
E procuro-me no interior de um círculo de coxas com cubos de púbis, geometricamente a manhã acorda só para nós, mas ambos sabemos que a falsidade habita no exterior de uma janela de vidro, sobre um telhado de zinco, no quinta juntamente com pedaços de capim, húmidas pedras em húmidos orgasmos entre as palavras e os desenhos pintados nos teus seios de amêndoa,
Ou
E,
“CUIDADO – PINTADO DE FRESCO”,
(E procuro-me dentro do teu corpo liquefeito, que a fórmula da paixão escreve-se nos muros finos e altos entre os edifícios da cidade velha, há ruas com reumatismo e ensonadas com pingos de asma, há ruas com dores diversas nos diversos ossos em diversas noites, de diversos dias)
Como o amor das rosas em papel.

(não revisto)
@Francisco Luís Fontinha