Uma rua fina e escura levar-me-á até ti, acredito
eu, depois a manhã clareá e iluminar-se-á de gotinhas de orvalho,
bolas de fogo e réstias de plantas carnívoras como antes de
chegarem as palavras do livro destinado ao empobrecimento da
floresta, por cada árvore uma andorinha, uma andorinha dorme ao som
dos enclaves solstícios que da parede em gesso da sala de jantar
sorriem, como sorriam, antes de partires, as poucas lâmpadas que
sobraram do naufrágio nosso querido corredor de arreia, foi-se a
maré sabática como os perfumes das outras rosas, as falsas, de
papel, e depois
Embalsamadas e exportadas para dentro do teu peito,
É isto o amor cansado nas tardes de Inverno, de uma
lareira vêem-se os olhos teus comestíveis como os grãos de pólen
dos doces lábios da poesia, e se eu te pedisse
Escrevias-me um poema?
Não, claro que não, nunca, nunca escrevi poemas,
nem palavras, nada, rigorosamente
Nada,
Muitas
Nada debaixo da tua saia de chita com borboletas
azuis,
Muitas outras e algumas são mulheres, entre pilares
de sémen e vigas encastradas nos púbis dilacerados das noites
vagabundas, descobri, e talvez já o soubesse, que a nossa lareira
apaixonou-se pelas chamas incandescentes dos pedaços de oliveira que
iluminam as nossas, e sabíamos
Nada,
Que iluminam as nossas mãos quando os pedestais dos
arbustos complexos e outras vezes, maldosos nos pensamentos, uma rua
fina e escura, levar-me-á até às encostas latejantes do xisto
metafisico, só, completamente só, como as tuas pernas antes de eu
as acariciar invisivelmente dentro das sombras do néon com sabor a
morango, e lá fora
Gemes,
Gritas como os fios de arame que suspendem a velha
videira do extinto orgasmo literário,
Sou assim, dizes-me enquanto te dispo no silêncio
dos poemas de AL Berto, e detesta-lo, como eu odeio os pinheiros
ranhosos dos montes vadios, como as pedras, o sol que mergulhará nos
seixos onde poisam os teus seios de espuma, e acredita
Nada,
Me excita como as luzes submersas de uma tenda de
circo,
Nada,
Como procurar-te nos cubos de gelo estacionados ao
fundo da rua fina e escura, como os lençóis com que te cobres nos
infinitos sótãos de chuva, odeio-te escrevias-me nos braços também
eles finos, e tal como a rua, escuros, sombrios, distantes,
adormecidos, mortos, malvados ruídos das ranhuras que as livrarias
provocam nas ocas cabeças de gesso onde está suspenso um crucifixo
de madeira banhado a oiro, e sorris-me pela vigésima vez, como a
primeira, fotocópias e fotocópias e fotocópias, eu
Tento parar os ruidosos sussurros das Madames em
Flor, e não admira que o autoclismo tenha deixado de funcionar, o
autocarro engasgou-se num buraco rendado no pavimento atropelado
pelas rimas dos versos quando lá dentro, da casa voadora, uma
laranja sobrevoa as teias de aranha dos aclamados uivos que os vidros
e os cortinados desenham na cidade do lixo, e dançavas embrulhada
nos braços de aço do comboio enferrujado entre sílabas
clandestinas, de rio em rio, pela primeira vez sorrias-me dançando
sobre nós uma penumbra acetinada de papeis diversificados, nas
cores, nos sexos, nas bocas antes de entrarem nelas as
grandessíssimas aldrabices do cigano com estabelecimento comercial
num dos arruamentos transversais da rua fina e escura,
E nada,
Muitas
Nada debaixo da tua saia de chita com borboletas
azuis, e ouvíamos o mar nas distantes laranjeiras dos montes
solidificados pela bruma, pela espuma, pela
Nada em ti que me sirva, a não ser, os malditos
telhados com estrelas cinzentas que os cigarros multiplicavam na
ardósia pendurada na mangueira abandonada, lá fora, no velho
quintal da casa em ruínas, só, só como eu
Como tu,
Sentados sobre esqueletos de livros, e saliva
dissipada pelas tristes palavras de ontem, só como eu, como tu, sem
sabermos como explicar aos transeuntes da rua fina e escura, que o
amor, entre nós, sempre
Muitas,
Existiu como existem as noites de chuva, de frio,
neve, e calor chamado prazer, ou
Húmidas estátuas de arame,
Na tua cama acorrentada aos grandes blocos de
granito da montanha dos sonhos...
Pela tua fina mão em anéis de prata.
(ficção não revisto)
@Francisco Luís Fontinha
Sem comentários:
Enviar um comentário