domingo, 5 de dezembro de 2021

Lágrima de luz

 

Conheci uma lágrima de luz, de cor esverdeada,

Que brincava na minha mão,

Depois, regressava a madrugada,

E a lágrima de luz, partia e parecia um foguetão.

 

Subia no céu como uma flecha cansada,

Subia até desaparecer,

Subia no céu esta lágrima de luz amargurada,

Amargurada de viver.

 

Ela não sabia que existia a palavra amar.

Ela dizia que a lágrima de luz, de cor esverdeada,

Era a espuma do mar;

 

Era um barco desgovernado.

Conheci uma lágrima de luz, de tristeza regressada,

Uma lágrima de luz cansada, cansada do passado.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 05/12/2021

Rosas de amar

 

Senta-te aqui.

Escreve em mim

As palavras que não ousas escrever,

Silencia-me os números

Que jazem nas minhas mãos,

E

Apenas servem para comer,

Descendo a montanha,

Dormirem junto a ti,

Dentro do mar.

Senta-te e olha-me.

Desenha em mim

A fotografia prateada da saudade,

De cabelos soltos ao vento,

Desenha em mim a triste madrugada…

Deixa estar; fica, fica aqui sentada,

E,

Desenha em mim,

(com o lápis da verdade)

O doce alegre alento.

Senta-te aqui!

Declama as minhas palavras amargas e distantes,

Quando o meu corpo falecer,

Quando o meu corpo deixar de escrever,

Escrever cartas para amantes.

Senta-te e não me odeies pelas canções envenenadas,

Pelas palavras ensanguentadas,

Que deste livro emergem e acordam,

Acordam sem acordar, sentando-se nos olhos que não choram.

São as lágrimas do senhor,

São as rosas do teu olhar,

São saudade, são flor,

Flor silêncio de mar.

Senta-te aqui e divide este triângulo louco,

Divide-o em pedacinhos amanhecer,

E,

E de tudo um pouco,

Não te esqueças de me escrever.

Levanta-te corpo abandonado,

Palavra em delírio na madrugada,

Levanta-te, levanta-te poeta enforcado,

Enforcado na calçada.

Senta-te.

Escreve em mim

As palavras que não ousas escrever,

Desenha em mim as circunferências da dor,

Palavras, beijos de amor,

Que não sabem viver,

Que detestam brincar,

Traz-me as rosas, meu amor,

Traz-me as rosas de amar,

Aquelas que habitam o teu sorrir,

Traz-me as rosas, traz-me as rosas sem as partir,

Partir,

Partir junto ao mar.

Senta-te aqui,

Pequenina luz de saudade,

Cabelo branco, voz rouca e pálida, cabelo pouco,

Pouco como estas palavras de dizer,

Senta-te aqui, pequenina saudade,

Sem medo de viver,

Viver sentada,

Aqui sem dizer,

Dizer e querer,

Querer regressar,

Sem o saber,

Saber amar.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 05/12/2021

sábado, 4 de dezembro de 2021

Poema enforcado

 

O poema envenenado

Que dorme nesta mão calejada

Pela silenciosa triste enxada,

O poema cansado,

Cansado do nada,

Nada este poema envenenado.

 

Este poema enforcado,

Nas palavras sem madrugada,

É um poema falhado,

É um poema sem nada.

 

O poema envenenado,

Que eu escrevo em ti,

É um poema desgraçado,

 

Este poema enforcado,

Das palavras madrugada,

De tudo, tem nada,

De nada, é um verso cansado,

 

Cansaço que nunca senti.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 04/12/2021

Lágrima de fogo

 

Transporto

Esta triste lágrima de fogo,

Sentindo o que deixei de sentir,

Este cansaço de partir,

Partir sem sentir,

Sentir esta triste lágrima de fogo.

 

 

Francisco Luís Fontinha

04/12/2021

Mulher

 

Mulher,

Silêncio que se despe em mim,

E mergulha na noite em papel;

A ousadia de viver,

Vivendo neste jardim,

Jardim a crescer,

Junto a este hotel.

 

Mulher,

Canção envenenada, palavra em revolta.

Mulher, criança mimada,

Mimada à minha volta.

 

Mulher,

Flor silêncio que se despe em mim,

Da noite em combustão,

Mulher,

Mulher de mim,

De mim, corpo paixão.

 

Mulher,

Corpo vestido de morte,

Cansaço desta montanha apagada,

Morte de má sorte,

Sorte em ser geada.

 

Mulher,

Que te vestes de mulher,

E ousas ser outra mulher.

Não te vistas,

Nem te ouses.

Mulher é mulher,

É poema,

Verso enfeitado,

Mulher é flor;

Não o sejas porque alguém o quer,

Porque mulher

É chama,

É livro envenenado,

É palavra e é amor.

Mulher,

Mulher é mulher,

Mulher é flor,

Mulher é amor.

 

Mulher,

Silêncio que se despe em mim,

E mergulha na noite em papel;

Mulher,

Não queiras ver o meu jardim,

Jardim de mulher,

Mulher

É amor,

É flor;

Mulher

É mulher,

Mulher é palavra semeada,

Mulher,

Mulher é livro, mulher é batel,

Mulher é poesia encantada,

Mulher,

Mulher é mulher,

Mulher de geada.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 4/12/2021

sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

Amantes em construção

 

Olha para mim

Enquanto o sol brilha na tua mão.

Escreve em mim

As palavras estonteantes

Do desejo.

Olha para mim

Enquanto o meu pobre coração,

Em pedaços de beijo,

Voa em direcção às estrelas cadentes.

 

Suplico ao silêncio

Que se despeça do meu corpo,

Sabendo que lá fora,

Entre sombras e murmúrios,

As palavras estonteantes

Comem-me os duzentos e seis pobres ossos.

 

Duzentos e seis pedaços

De nada.

 

Olha para mim

Depois de acordares e abrires a janela,

Olha para mim

Enquanto o luar se deita na tua cama,

Olha, olha para mim

Sabendo que da tua voz tão bela,

Há um poema em chama,

 

Há um poema em trapos,

Com as palavras da alvorada.

 

Olha-me.

 

Olha para mim

Montanha esbelta da minha terra adormecida,

Com as árvores em papel colorido,

Olha para mim

Montanha minha amada querida,

Olha!

Olha para mim,

Corpo sofrido.

 

Olha para mim

Enquanto o sol brilha na tua mão.

Escreve em mim

As palavras estonteantes

Do desejo.

Olha para mim

E ouve esta pobre canção;

São palavras que não vejo,

São palavras que vão…

São as palavras dos amantes,

Dos amantes em construção.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 03/12/2021

quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

O poeta vagabundo

 

Dentro do sono,

Viaja a cansada noite sem despertador,

- há dias que não como,

Como uma flor.

 

Vive-se e morre-se de quê?

Não comendo flor,

Não bebendo água congelada,

Morrer-se porquê?

Sabendo que na triste madrugada,

Em plena união,

Habita uma flor,

Uma flor sem coração.

 

Dentro do sono amanhecer,

Quando alguém sem nome

Abre a cancela da alvorada;

É o poeta que não consegue escrever,

Escrever no papel da fome,

A fome envenenada.

 

E depois de morrer,

O desgraçado do poeta vagabundo

Deixou sob a ponte,

Um pedacinho de geada.

Não consegue correr,

Correr até ao cimo do monte,

Sentar-se e olhar a imensidão do mundo,

Do mundo que é uma maçada.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 02/12/2021