segunda-feira, 1 de abril de 2019

As palavras que nunca te vou escrever


Tenho palavras na algibeira,

São tantas,

Que parecem os peixes voando debaixo do mar,

Por medo,

Por vergonha,

Estas palavras, as minhas palavras,

Nunca chegarão a ti,

Como a chuva invisível,

Que cai sobre o teu cabelo,

E, ele, sempre seco,

Esbelto como as estrelas.

Estas palavras adivinham, morte,

Tempestades,

E tormentas…

Que só o meu veleiro sabe desbravar,

Como uma floresta doente,

Como os pássaros, também eles, recheados de palavras…

Mas…

São palavras que nunca te vou escrever,

Podia dizer-te que és um amor,

Um bombom,

Ou o luar quando a noite se vai banhar no Oceano…

 

Tenho palavras na algibeira…

Que não me servem de nada,

De palavras está a cidade infestada,

Como ratos,

Sem-abrigo,

Ou eu, um falido comerciante de palavras.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

01/04/2019

domingo, 31 de março de 2019

O fogo


A morte do fogo, quando a água das palavras, caem sobre o meu corpo,

Em chamas, em brasas.

 

E sobra nada.

 

Simplicidade, risadas…

 

O pó.

 

A madrugada.

 

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

31/03/2019

sábado, 30 de março de 2019

Os teus olhos


Os teus olhos são as cataratas do Niágara,

O cansaço do povo,

Os teus olhos são a luminosidade da saudade,

O silêncio prometido,

Alto,

Esguio…

 

Das parais encantadas.

 

Os teus olhos são a Primavera,

A mudança da hora,

Deste velho relógio,

Que adormece no meu pulso,

 

Quebrado,

Triste,

Cansado.

 

Difuso.

 

Os teus olhos, meu amor,

São a tempestade nocturna,

A cidade em chamas,

 

E das aldeias perdidas,

 

Nos teus olhos, meu amor.

 

Os teus olhos são o sorriso da madrugada,

A velha jangada,

Poisado na mão do rio…

 

Quando regressa a tarde,

Chorando,

Sem querer…

Chorando.

 

Meu amor.

 

Os teus olhos.

Saudade,

Dos beijos,

Na claridade,

Dos teus olhos,

Quando logo, mais tarde,

Eu, pegar nos teus olhos…

 

E dormir,

Com a saudade.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

30-03-2019

sexta-feira, 29 de março de 2019

O fogo do prazer


Não posso, desisto.

Não posso, finjo, caminhar em tua direcção,

Descalço,

Não posso,

Fingir que te amo.

Se te amasse, amava-te,

Se te escreve, escrevia-te,

Mas, não, não posso,

Fingir,

Escrever,

Se pudesse, lia-te, todas as palavras começadas por A…

Não posso,

Fingir,

Que te lia todas as palavras começadas por A.

Amar.

Começar,

Caminhar,

Não posso.

Fingir.

Que sou o mar.

Lanço no poço da saudade o beijo desenhado,

Na alvorada,

Na eira,

O beijo embalsamado,

Fingido,

Doente,

Caminhando, caminhar,

O fogo do prazer,

Quando o teu corpo adormece,

Arde,

Tudo arde,

Mesmo o entardecer.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

29/03/2019

quinta-feira, 28 de março de 2019

A menina das palavras


O que é hoje o jantar?

Talvez nada,

Livros,

Ou,

Palavras,

Natas,

Cegonhas recheadas,

Poesia, hoje o jantar é poesia,

Não sei se gosto,

Não desgosto,

Talvez adore,

Olhe, menina…

Nunca experimentei.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

28/03/2019

terça-feira, 26 de março de 2019

Oiço-te


Oiço-te.

Penso nas tuas sílabas quando poisam nos meus lábios,

Oiço-te, a cada madrugada, a cada hora passada,

Quando eu deitado, na esplanada encerrada,

Descanso de pessoal,

E, no final do dia, as palavras embriagadas,

Quebram o teu silêncio,

Como uma fechadura,

Pobre,

Nua,

Oiço-te.

Na vanguarda da noite,

Carregado de cartazes,

Lutando contigo,

Lutando…

Até que um dia, novamente,

Perderemos a guerra,

Já o senti,

Já o vivi,

Mas hoje,

Hoje tenho o prazer de te ouvir.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

26/03/2019

segunda-feira, 25 de março de 2019


Partiram, levaram o miúdo dos calões e o caixote em madeira,

Alguns tarecos, pouca coisa e fotocópias de fotografias envenenadas pelo silêncio, na algibeira, o amor, o desejo do mar, dos barcos e das coisas

Simples?

Os livros,

E das coisas sem nome,

Sombras de mangueira?

E beijos, das coisas travestidas de saudade, dos livros lidos nas entranhas do desejo, caminhávamos entre quatro círculos de luz, abraçavas-me como se abraçam os pássaros, as acácias e os pindéricos cabelos de nata,

Amanhã amo-te...

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

In “Amargos lábios do poema”