Deixei
de contemplar o teu perfume.
Ausento-me
desta cidade de espingardas envenenadas
Que
assombram o meu sorriso,
Procuro-te,
procuro-te na ânsia de encontrar a tua sombra
Nos
buracos da noite, procuro-te sem saber se existes nesta cidade de espingardas
envenenadas, mesmo assim, eu não me canso de te procurar,
Desenho-te.
Escrevo-te sabendo que não consegues ler as minhas palavras.
Amanhã
acordarei na preguiça do amanhecer, novamente te vou procurar, aqui, ali, em
qualquer lugar…
Não
sei, não sei se existes,
Não
sei se és real como as árvores no final do dia, encolhem os braços e dormem,
dormem acreditando, também elas, que existes algures nesta cidade,
Mas
não acredito na tua presença,
Imagino-te
sentada num qualquer jardim esperando por mim, imagino-te sentada junto ao rio
esperando por mim, mas enquanto vou ao rio e ao jardim, nada, nada da tua
presença,
Desisto?
Desisto.
Sigo
viagem, vou à procura do meu caderno preto, vou à procura da areia finíssima do
Mussulo onde brincava com os outros meninos, também eles, esquecidos, sucata,
velharias à porta de uma taberna,
Estou
só, estou só enquanto escrevo, não sei se existes…, mas…, mas não quero a tua
presença enquanto escrevo,
Lamento-me,
Lamento-me
dos confins da lixeira dos sonhos, invento amores de papel com lábios de
algodão, sinto-o, sinto-o
Sinto-o
na minha mão como um fidalgo desempregado, triste e vaiado numa noite junto ao
mar, amanhã, talvez,
Talvez
existas nos meus aposentos de criança, amanhã, talvez existas nas pedras
circulares dos Oceanos abandonados,
Desisto?
Desisto.
Esqueço-me
de ti,
Recordo
a liberdade de viver sobre este cansaço de aço,
Recordo
a ardósia onde escrevia poemas só para ti, mas tu, tu não existes,
Pareces
a morte,
O
silêncio disfarçado de morte,
E
depois
E
depois deixei de contemplar o teu perfume.
Francisco
Luís Fontinha
terça-feira,
12 de Abril de 2016